Dorival revela como recuperou a confiança no São Paulo: “Teve jogador que queria sair”

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Em entrevista ao ge, técnico exalta momento, vê time com ambição de conquistar títulos e defende trabalho dos treinadores brasileiros: “As soluções estão aqui dentro”

O São Paulo de Dorival Júnior é uma equipe mais confiante. Não à toa, o Tricolor está na quarta posição do Campeonato Brasileiro, na semifinal da Copa do Brasil e nas oitavas de final da Copa Sul-Americana.

O treinador resgatou o espírito de um elenco que estava desacreditado no começo da temporada e tem conseguido bons resultados, fazendo a torcida crer que o fim do jejum de títulos expressivos está próximo.

– Teve jogador que me falou que em determinado momento queria deixar o clube por não estar confortável e confiante aqui dentro, e de repente se reencontram e querem… Não foi só com um que aconteceu isso. É um testemunho interessante, importante e que fortalece ainda mais esse ambiente que está sendo o carro-chefe desse trabalho.

– É normal você se preocupar com o lado tático, do técnico, físico, temos que abastecer nosso elenco em todos os aspectos, mas o principal é o lado humano, e esse lado humano tem que ser valorizado sempre – afirmou Dorival em entrevista exclusiva ao ge.

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Dorival Júnior, do São Paulo, em entrevista ao ge — Foto: José Renato Ambrosio

Depois de eliminar o Palmeiras nas quartas de final da Copa do Brasil, o São Paulo passou a acreditar ainda mais na possibilidade de conquistar o torneio pela primeira vez em sua história. De acordo com o treinador, o elenco está com uma grande ambição na temporada.

Na semifinal, o adversário será o Corinthians. O jogo de ida será disputado na próxima terça-feira, às 21h30, na Neo Química Arena.

Abaixo, o ge destaca alguns trechos da entrevista com Dorival Júnior. A íntegra vai ao ar no próximo domingo, no Esporte Espetacular.

ge.globo – Você fala que voltou ao São Paulo para terminar um trabalho iniciado em 2017. O que seria esse término?
Dorival Júnior: 
– Eu acho que isso é um sentimento que todo profissional tem, e o término de um trabalho não quer dizer especificamente uma conquista. É você consolidar, solidificar. Porque pode ser um trabalho preparatório, a gente nunca sabe. No futebol são etapas, você não queima etapas. Dificilmente uma equipe que queime uma etapa terá condições de chegar de uma maneira sólida. O que eu quero é que quando eu sair do São Paulo, o clube esteja ainda melhor do que quando eu entrei. Por isso que quando apareceu a oportunidade de retornar ao São Paulo, eu fiquei muito feliz.

Você volta ao São Paulo em um momento complicado, em que as análises eram de que o time brigaria para não cair. Hoje você está no G-4, na semifinal da Copa do Brasil e com a melhor campanha da Sul-Americana. Como se recupera um time em pouco tempo?
– Quando falo de uma equipe de trabalho, estão todos ali na sala reunidos avaliando os treinamentos, tentando entender o nosso próximo adversário e principalmente buscando soluções para que a gente possa apresentar amanhã no último dia antes da partida. Nós procuramos atacar todas as situações possíveis. O importante é o treinador tentar aproveitar o máximo possível daquilo que a comissão técnica anterior lhe deixou e tentar inserir o mais rápido também aquilo que talvez você possa fazer dentro daquilo que você pensa.

Qual foi o diagnóstico que você fez ao chegar? Quais foram os problemas que você encontrou e quais foram essas soluções?
– Eu busco valorizar muito pouco os problemas, eu tento buscar soluções, apresentar soluções para jogadores. Eu não valorizo muito aquilo que estava acontecendo, aquilo que passou. Para mim o que conta é dali para frente, e o que eu quero é tentar extrair o máximo possível de quem esteja ali dentro, por isso que eu sempre provoco no jogador essa condição, a possibilidade de ele encontrar soluções. No sentido de ocupar um espaço que de repente ele não esteja ocupando e ele perceba que ele briga em igualdade de condições com o companheiro com muita lealdade.

E acredita que já há mudanças?
– Acho que está se criando uma ambição comedida e abrindo-se mão daquela condição individual de cada um. É um grupo que está entendendo tudo isso, que está procurando cada um compor de uma maneira, de jogar de alguma forma. Temos 32 jogadores nos treinamentos, e esclareci a cada um deles, que tenham paciência. Todos estão sendo aproveitados, usados, dando suas respostas quando são chamados. E esse é um ponto muito importante a se destacar, porque é muito complicado conviver com um elenco tão grande. E o São Paulo precisou fazer isso pelas lesões.

– Quando cheguei aqui tinham 12 jogadores no DM e ainda temos uma série. Jogadores importantes que agora começam a retornar e todos eles estão entendendo. Atuando ou não eles estão dentro do processo. Acredito que isso que tem nos movido, nos levado e feito com que esse entendimento seja transferido para do treinamento para os jogos e todos participem daquela forma, quando sai um gol todos saem pra se abraçar e comemorar. É o mesmo ambiente das últimas equipes que passei.

Jogadores como Alisson, David, Caio Paulista e Gabriel Neves cresceram muito de rendimento com você. O que aconteceu para essa mudança de status deles?
– Teve jogador que me falou que em determinado momento queria deixar o clube por não estar confortável e confiante aqui dentro, e de repente se reencontram e querem… Não foi só com um que aconteceu isso. É um testemunho interessante, importante e que fortalece ainda mais esse ambiente que está sendo o carro chefe desse trabalho. É normal você se preocupar com o lado tático, do técnico, físico, temos que abastecer nosso elenco em todos os aspectos, mas o principal é o lado humano, e esse lado humano tem que ser valorizado sempre.

– Por isso que aquele que não venha atuando com tanta frequência, ele tem que ter a mesma atenção ou até maior do que aquele que vem jogando e sendo decisivo. Em algum momento ele vai ser tão importante ou mais do que aquele que esteja atuando. Por isso a atenção não pode faltar em momento nenhum. Quem comanda precisa estar atento para perceber tudo do elenco. É uma obrigação de quem comanda ter seus jogadores alinhados e no mesmo objetivo.

Em uma entrevista recente você foi até irônico numa pergunta sobre você ter sorte. Você acha que foi um pouco injustiçado na sua carreira?
– O que eu falo é que infelizmente o nosso país não respeita os nossos talentos. Eu estou falando de modo. Eu entendo que isso infelizmente faz parte da cultura, ou falta dela, no nosso país. Eu falei em outro sentido. As pessoas têm que começar a perceber que o futebol não se resume a você trocar um atleta. Eu acho que nós temos grandes profissionais e muito preparados para que possa desenvolver metodologias de trabalho. Nós temos muitos profissionais qualificados, nós temos os melhores preparadores de goleiros do mundo, nós temos na área de fisiologia e recuperação de atletas, profissionais que são exemplares e que são também muito reconhecidos fora do nosso país.

– O que eu acho é que as soluções do futebol brasileiro estão aqui dentro, entre nós mesmos. Nós não precisamos mais de pessoas que apaguem luzes, nós precisamos de pessoas que acendam luzes, que sejam construtivos em todos os sentidos, desde atletas, treinadores, executivos de futebol, a imprensa.

– Eu acho que está na hora de a gente se voltar um pouco mais para um produto que talvez seja o maior produto vendável que nós temos nas mãos, e não sabemos explorar. O futebol brasileiro faz um mal a ele próprio. Nós que estamos no futebol participamos de toda essa ciranda sem que iniciemos um processo de recuperação de um produto tão especial.

São Paulo x Santos, Dorival Júnior — Foto: Marcos Ribolli
São Paulo x Santos, Dorival Júnior — Foto: Marcos Ribolli

Você acredita nessa mudança?
– De imediato não, eu sou muito sincero, eu acho que só vai acontecer o dia que principalmente houver uma mudança comportamental em todos os segmentos que fazem o futebol. Quando houver uma responsabilização um pouco maior, quando nós nos preocuparmos, e principalmente os nossos gestores sentirem que eles têm um CNPJ nas mãos de uma grande empresa, de um grande clube, e que eles terão que se responsabilizarem com o próprio CPF, quando eles tiverem obrigações e responsabilidade, talvez nós passaremos a não tomar as atitudes pelo nosso pelo nosso improviso, pelo nosso momento. Nós passaremos a pensar um pouco mais nos nossos clubes.

– Então hoje nós não podemos entender que só uma pessoa se responsabilize por tudo que o que acontece dentro daquela entidade, até porque você não tem as chaves do clube nas mãos como treinador de futebol. Eu acho que tá na hora de nós começarmos a esclarecer um pouco mais funções e respeitarmos um pouco mais tudo que esteja acontecendo e se passando. O futebol tá sendo muito maltratado em todos os aspectos. O que a gente vê é uma perda de qualidade, uma perda e organização, que nós nunca tivemos, mas que poderíamos já estar bem adiantados, e principalmente de vendagem. Nós infelizmente combatemos aquilo que é o nosso produto.

Alguma vez a CBF te procurou para assumir a Seleção?
– Não.

O que você deseja para o São Paulo no futuro?
– Pelo merecimento dos jogadores, da torcida do São Paulo, pela maneira que estão se comportando, entendendo toda e qualquer situação, lutando e se entregando até o último momento, todos os dados anotados pela fisiologia do clube, estão crescendo e atingindo um nível altíssimo e batendo recordes dos últimos três anos de clube, eu gostaria muito que essa equipe fosse premiada com uma conquista. Não sei em que momento, mas não tenho dúvidas que estamos caminhando para ela e eu sinto que nós estamos nos aproximando e isso uma hora vai acontecer. Mas muito pela dedicação, pela entrega, comprometimento e respeito que está acontecendo internamente.

Globo Esporte