“Acabo de encerrar minha carreira de técnico.” A frase carregada de amargura traduzia o sentimento de Telê Santana há exatos 30 anos, logo após a derrota da seleção brasileira para a França nos pênaltis nas quartas de final da Copa do Mundo 1986, no México, em 21 de junho daquele ano.
Telê, bicampeão mundial com o São Paulo dali a pouco mais de sete anos, falava sério. Para demovê-lo da ideia de ficar distante dos gramados, pessoas próximas ao treinador fizeram uma força-tarefa. Um convite do Atlético-MG, em agosto de 1987, reverteu a situação.
“A dor foi tão grande que ele reagiu dessa maneira. Ele estava disposto a parar depois de perder duas Copas. Ele pensou: ‘já deu para mim’. Seria uma pena se ele, com uma carreira tão brilhante, com o futuro todo pela frente, parrasse naquele momento. Foi uma reação um pouco revoltada. Ele estava contestando a própria profissão”, disse Renê Santana, filho de Telê, que presenciou a primeira reação do treinador.
De volta ao comando da seleção em 1985, a um ano da Copa do México, Telê tentou apagar a decepção do Mundial de 1982, na Espanha. Na segunda chance, viu o Brasil jogar melhor que o adversário mais uma vez e perder nos pênaltis após um empate por 1 a 1 — Zico ainda desperdiçou uma cobrança no segundo tempo. Até a partida diante dos franceses, a equipe brasileira ainda não havia sofrido gols.
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“Antes de embarcar para o Brasil, o primeiro estímulo foram alguns comentários de que a seleção tinha sido uma das melhores da Copa. Isso foi um alento para ele. Não houve reação negativa”, afirmou Renê.
Retiro, descanso e negócios
Durante 14 meses, Telê se manteve firme à ideia de parar de trabalhar no futebol. O técnico, aos 55 anos, aproveitou para descansar e ficar mais perto da família. Para isso, passou um tempo em uma fazenda em Petrópolis-RJ. “Ele não conseguiu ficar longe do futebol. Assistia sempre lá, ia também a estádios, sem traumas”, relembrou Renê.
Sobrou tempo até para Telê se aventurar em negócios fora do futebol. Durante o período, ele abriu uma empresa ligada ao ramo imobiliário, com sede em Belo Horizonte. Os planos, no entanto, deram errado e a família teve prejuízo. No escritório, o destino de Telê foi selado.
Nelson Campos, então presidente do Atlético-MG, foi ao local por quatro dias seguidos, a fim de convencer Telê a voltar atrás. Além dele, os sócios do treinador também ajudaram no processo. “Ele cedeu. Por ele, teria parado. Cedeu ao pedido de um amigo (o dirigente estava à frente do clube mineiro em 1971, ano do título brasileiro, a primeira taça de Telê como técnico)”, frisou Renê.
Sucesso, mais uma vez
No Atlético-MG, Telê encontrou afago e sucesso. Logo nos primeiros meses, o técnico levou o time alvinegro à semifinal da Copa União. No semestre seguinte, conquistou o título estadual sobre o Cruzeiro. No fim, torcedores se renderam ao comandante ao gritar o nome de Telê.
Segundo Renê, o fato ajudou o pai a se sentir querido novamente após uma fase de solidão. Fortalecido, Telê passou por Flamengo, Fluminense e Palmeiras até chegar ao São Paulo, em outubro de 1990.
Na ocasião, Telê aceitou um pedido pessoal do amigo Carlos Caboclo, então diretor de futebol do São Paulo. O treinador iniciou o trabalho sem ao menos discutir o contrato e optou por morar no CCT da Barra Funda nos primeiros meses.
No clube paulista, Telê conquistou Libertadores, Mundial, Brasileiro e Paulista, entre outros. De acordo com Renê, o treinador nunca enxergou os títulos como uma resposta às derrotas com a seleção brasileira. “Não teve revanchismo. Aquilo passou, foi uma dor que não tinha mais conserto. Cicatrizou. No São Paulo, ele considerou o trabalho bem feito, coroado com títulos. Na seleção, um bom trabalho sem títulos”, finalizou Renê.