Gazeta Esportiva
Autor de gol decisivo e de improvisação histórica como goleiro, Maicon completa nesta sexta-feira um ano de sua estreia pelo São Paulo. Um dos jogadores mais queridos pela torcida, que o apelidou de God of Zaga, o defensor, contudo, se vê distante de seu grande objetivo com a camisa tricolor.
“Não existe ídolo sem títulos”, explica o jogador, que manteve seu aspecto sisudo durante entrevista à Gazeta Esportiva. No dia 24 de fevereiro de 2016, Maicon jogou para 3.333 pagantes na vitória por 2 a 0 sobre o Novorizontino, no Pacaembu, onde o baixo público pôde acompanhar o retorno do zagueiro ao futebol brasileiro após oito anos atuando em Portugal.
Neste sábado, 366 dias depois de sua estreia, Maicon reencontrará o Novorizontino em seu caminho. Agora sob o comando de Rogério Ceni – “mais moderno” do que Edgardo Bauza, técnico da equipe um ano atrás -, o Tricolor busca se firmar como um dos favoritos ao título do Campeonato Paulista 2017.
Passadas cinco rodadas, o São Paulo lidera o Grupo B, com 10 pontos. Mas o que se sobressalta são os 15 gols marcados e 11 sofridos, fazendo do time do Morumbi o dono do melhor ataque e da segunda pior defesa do torneio. Zagueiro, Maicon se incomoda com a situação, mas a minimiza: “Não estamos defendendo tão bem, mas os resultados estão vindo e o futebol é feito de resultados”.
Na entrevista, o jogador de 28 anos ainda faz um balanço dos primeiros meses de Rogério Ceni à frente do elenco tricolor e fala sobre o seu sonho de um dia chegar à Seleção Brasileira. Também comenta momentos difíceis, como o de sua expulsão na primeira partida das semifinais da Copa Libertadores 2016, motivada pelo atacante Miguel Borja, hoje jogador do Palmeiras e de quem não guarda rancor.
Gazeta Esportiva – Depois de um ano de São Paulo, você se considera um ídolo da torcida?
Maicon – Não, porque não existe um ídolo sem títulos. Para você virar ídolo de uma grande equipe como o São Paulo, você tem que conquistar títulos e levar o time ao mais alto nível e não foi isso o que aconteceu neste um ano. Acredito que eu esteja fazendo um bom papel, tenho me firmado cada vez mais na equipe. Para ídolo ainda estou longe, tenho que levantar alguns canecos. Se Deus quiser, este ano a gente possa fazer isso.
Gazeta Esportiva – Na Libertadores de 2016, você jogou como goleiro contra o The Strongest em La Paz e segurou as pontas para que o São Paulo avançasse ao mata-mata. Depois, marcou o gol da classificação às semifinais em cima do Atlético-MG em pleno Independência. Aí você ganhou o apelido de God of Zaga. Como foi receber esse carinho da torcida?
Maicon – Foi legal. Eu entrei para a história do clube também atuando no gol. Para mim foi bem legal, queria ajudar minha equipe e consegui graças a Deus. Ter feito o gol contra o Galo também foi um momento mágico para mim. Foi o meu auge no começo aqui no São Paulo. Foram duas situações diferentes, mas que me deixaram muito feliz com o meu trabalho.
Gazeta Esportiva – Logo após a sua contratação em definitivo em junho do ano passado junto ao Porto-POR, você foi expulso na primeira semifinal da Libertadores, contra o Atlético Nacional, no Morumbi. Com um a menos, o São Paulo acabou perdendo o jogo por 2 a 0 e depois foi eliminado com mais uma derrota na Colômbia. Como você lidou com as críticas de torcida e imprensa naquele momento?
Maicon – Para mim não tem problema nenhum a crítica. Tenho a consciência tranquila, dei o meu melhor, poderia ter evitado a expulsão, mas em momento algum eu quis prejudicar a equipe. Estou tranquilo com isso, já passou, não tem problema nenhum.
Gazeta Esportiva – Foi um lance questionável, mas ao mesmo tempo alguns são-paulinos ficaram bravos com você. Em algum momento, você se sentiu injustiçado?
Maicon – Eu não me preocupo muito com críticas. Lógico que, a partir do momento que seja uma crítica construtiva, que me faça melhorar a cada dia mais, eu a recebo da melhor maneira possível. Agora, críticas que vêm de fora não me abalam, tenho que dar o meu melhor dentro do clube. Eu achei que minha expulsão foi injusta, mas também poderia ter evitado. Tem que ter a cabeça focada, porque se você se abalar com a crítica, você não tem condições de jogar no São Paulo”.
Gazeta Esportiva – Aquela expulsão foi provocada pelo Miguel Borja, que depois acabou marcando os dois gols na vitória por 2 a 0 no Morumbi e outros dois no triunfo do Nacional na Colômbia. Hoje ele está no Palmeiras e vocês certamente se enfrentarão. Você pensa em uma oportunidade de revanche?
Maicon – Não, porque não vamos jogar Maicon e Borja. Vamos jogar São Paulo contra Palmeiras. Em momento algum tenho pensado em rivalidade. A rivalidade é entre os clubes. Eu vou defender as minhas cores e ele vai defender as dele.
Gazeta Esportiva – No São Paulo, você foi treinado por três técnicos diferentes – o Edgardo Bauza, o Ricardo Gomes e agora o Rogério Ceni. Quais as diferenças entre eles em termos táticos e no trato com o elenco?
Maicon – São um pouco diferentes. O Bauza é aquele treinador que gosta mais de pegada, gosta mais do jogo direto, ligação…Ricardo Gomes e Rogério têm quase o mesmo sistema de jogo. O Rogério é um pouco mais moderno do que eles, estudou mais nesse final de ano na Europa, tem auxiliares europeus que o ajudam bastante. Cada um tem sua maneira de trabalhar. A maneira com que o nosso novo treinador trabalha me agrada bastante e tem agradado todo mundo. O São Paulo precisava de resultados e eles estão vindo.
Gazeta Esportiva – Mas esse sistema de jogo do Rogério tem deixado o time mais exposto, como você mesmo já falou. Está mais difícil para os zagueiros?
Maicon – É claro que quando você toma gols, você não se sente confortável. Não tem como a gente falar que a gente se sente confortável que é mentira. Não queremos sofrer gols. Dos 11 que sofremos (no Paulista), acho que sete ou oito podem ser por falhas individuais. São coisas que devemos corrigir. No ano passado, defendíamos muito bem e os resultados não vinham. Neste ano, não estamos defendendo tão bem, mas os resultados estão vindo e o futebol é feito de resultados.
Gazeta Esportiva – Em um jogo no Morumbi, no ano passado, o Botafogo fez um gol aos 48 minutos do segundo tempo e venceu depois de o São Paulo ter dominado a posse de bola. Depois da partida, você falou que preferia não jogar tão bem e ganhar do que jogar bem e perder. Hoje em dia, o São Paulo está fazendo boas apresentações, mas também está sofrendo atrás e levando muitos gols. Segue a mesma linha de raciocínio?
Maicon – Segue a mesma linha. No ano passado tiveram vários jogos em que a gente tinha dominado o adversário, mas no final perdíamos os jogos. Temos que corrigir os erros, ninguém quer tomar gol, mas o São Paulo tem que ter resultados nesse ano. Tem que buscar títulos, então passa por isso. Se levarmos quatro e fizermos cinco, ganhamos o jogo. O importante é o coletivo sair com a vitória. Claro que a zaga vai ficar mais chateada por ter levado tantos gols, como tomamos quatro contra o Audax, dois do Mirassol, mas o resultado está vindo. É melhor você corrigir as falhas com vitórias do que com resultado negativo.
Gazeta Esportiva – Mas essa postura ofensiva não te preocupa no mata-mata? Nesse tipo de competição, esses gols pesam mais, sobretudo quando há o critério do gol qualificado.
Maicon – Cada jogo é uma história diferente. A partir do momento que for mata-mata, a nossa cabeça tem que mudar um pouco. Por exemplo, se você analisar, a nossa defesa ficou dois ou três gols atrás da melhor defesa do Campeonato Brasileiro do ano passado. E terminamos lá embaixo, em 11º lugar. Então não é por aí. A partir do momento que for mata-mata, a nossa mentalidade vai ser outra. O nosso estilo de jogo pode ser diferente para não levar tantos gols.
Nota da redação: O São Paulo terminou o Campeonato Brasileiro 2016 em 10º lugar, tendo a quinta melhor defesa, com 36 gols sofridos, quatro a mais que Palmeiras e Atlético-PR, os times menos vazados do torneio.
Gazeta Esportiva – No ano passado, o São Paulo dificilmente reagia dentro de uma partida se levasse o primeiro gol. Em 2017, o time tem conseguido buscar o resultado com praticamente o mesmo elenco. Foi assim em quatro partidas. O que mudou para a equipe se tornar mais forte mentalmente?
Maicon – A diferença foi que passamos a confiar mais no nosso potencial coletivo. No ano passado, quando a gente sofria um gol, um ou outro jogador queria resolver as situações no individualismo. Já nesse ano o Rogério conseguiu juntar o coletivo para si mesmo…Tomando um ou dois gols, ele mostrou que temos uma equipe forte que consegue emocionalmente ficar tranquila no jogo. Então, quando levamos gols, não nos abalamos mais. Essa é a grande diferença, o nosso coletivo está muito forte e o psicológico bem centrado. Temos um elenco mais experiente, com Pratto, Rodrigo Caio, o próprio Sidão, que é mais velho e veio para nos ajudar.
Gazeta Esportiva – O Rogério Ceni tem promovido um rodízio entre os atletas, o que é muito comum na Europa e não aqui. E ele está conseguindo implantar esse rodízio sem a resistência dos jogadores. Isso acontece por que vocês acreditam que esse é o melhor caminho ou passa um pouco por ser uma medida imposta pelo maior ídolo do clube?
Maicon – Não vejo por esse lado. Nós fizemos quatro jogos em nove dias, então o desgaste físico é muito grande. No ano passado, tivemos mais de 30 lesões musculares. É uma das coisas que ele viu e está tentando corrigir. A partir do momento que você tem um grupo bem qualificado, com peças de reposição – lógico que ninguém quer ser poupado -, mas o corpo da gente às vezes precisa de um pouco de descanso. Não vejo nenhum jogador chateado por isso – acho até meio estranho porque todos querem jogar, ninguém quer participar de rodízio -, mas sabemos que precisamos do corpo bem fisicamente.
Gazeta Esportiva – É bom ter um técnico que tem um respaldo grande de torcida e diretoria?
Maicon – É bom, mas se você analisar a derrota por 4 a 2 para o Audax, até eles marcarem o terceiro gol, nós tivemos três ou quatro oportunidades claríssimas de marcar. A torcida vê que a equipe está produzindo, essa é a grande diferença. Contra o Mirassol, sofremos o empate também por erros individuais, mas tivemos uma equipe que criou bastante. É diferente de você ver um time que não cria e tem resultados negativos. A torcida está vendo um São Paulo de verdade, que joga para frente, que busca, que fez 15 gols em cinco jogos e que tem o melhor ataque.
Gazeta Esportiva – O São Paulo está passando por um momento político importante. Em abril, tem eleições e o presidente Leco (Carlos Augusto de Barros e Silva) terá o posto desafiado pelo (José Eduardo Mesquita) Pimenta. A tensão dos bastidores passa para o elenco?
Maicon – Não temos que interferir nessas coisas, temos que fazer nosso papel dentro de campo, que é o mais importante. De resto, eles vão se resolver. O melhor para o clube vai acontecer sem dúvida nenhuma.
Gazeta Esportiva – O que é o melhor para o São Paulo?
Maicon – O nosso presidente, é claro. É um presidente que tem feito um grande trabalho pela maneira como ele pegou o São Paulo – meio desestruturado. Acredito que ele seja um forte candidato e vai vencer se Deus quiser.
Gazeta Esportiva – Depois de um ano de clube, como é o Maicon do dia a dia no trato com os jogadores?
Maicon – Eu sou um dos caras que mais brinca com o pessoal. Fora do campo sou uma pessoa bastante comunicativa, divertida, gosto de zoar todo mundo, mas gosto que me respeitem e também de dar o respeito. Treino sempre sério, não tem brincadeira comigo nos treinos, dou carrinho, não tem corpo mole. Esse respeito eu adquiri com muito esforço e trabalho, e não posso perdê-lo, porque senão não tem como você exercer uma função de capitão do time. Gosto de trabalhar e busco estar sempre melhorando. Mesmo quando eu ganho uma partida e faço uma jogada que eu não gosto, fico até sem dormir. Sou um cara que tenho bastante compromisso com as coisas.
Gazeta Esportiva – Como tem sido sua relação com os jogadores mais novos? Muitos subiram da base neste ano.
Maicon – A gente tenta ajudar bastante, não só eu como o Lugano, o Denis, outros jogadores mais de idade. Procuramos deixar a garotada mais tranquila, porque a base do São Paulo é muito forte e se você tiver um jogador da base retraído, tímido, não vai conseguir exercer a melhor função. Deixamos o jogador mais à vontade, não que a gente fale ‘olha, o mundo é de vocês’, tudo tem seu limite. A gente procura deixar os jovens mais tranquilos para que possam nos ajudar nos jogos, porque faz parte do elenco e o tratamento é igual para todos.
Gazeta Esportiva – Em quem você se inspira no futebol atualmente?
Maicon – Thiago Silva é um ótimo zagueiro, de altíssimo nível. O próprio Miranda, que tem feito um bom trabalho, o Marquinhos e o Rodrigo Caio, que são jogadores novos e têm feito excelentes trabalhos. Temos que sempre procurar olhar os melhores. Não preciso falar de estrangeiros, porque o Brasil está bem referenciado de zagueiros.
Gazeta Esportiva – Com 28 anos, você pensa em voltar para a Europa?
Maicon – Não. Eu tenho contrato com o São Paulo até 2020 e pretendo cumpri-lo.
Gazeta Esportiva – E Seleção Brasileira? Como você lida com a concorrência de tantos bons zagueiros à disposição de Tite?
Maicon – Todo jogador almeja chegar na Seleção Brasileira. Se eu estou em um grande clube como o São Paulo, é sinal de que eu sou um bom zagueiro. Disso eu não tenho dúvida. Tenho que dar o meu melhor para o clube primeiro para depois pensar na Seleção. É claro que ela passa pelos meus objetivos pessoais, mas primeiramente eu tenho que fazer meu trabalho no clube.