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O São Paulo é o novo “time do povo” da capital paulista? Na visão do diretor executivo de marketing do Tricolor desde maio, Marcio Aith, o clube caminha para isso.
O apelido tradicionalmente é dado ao rival Corinthians. No início de outubro, uma pesquisa mostrou um perfil mais elitizado do torcedor que frequenta o estádio em Itaquera.
Até antes de transferir os jogos do Morumbi para o Pacaembu, em função de shows realizados na casa tricolor, o clube liderava a média de público entre as Séries A, B e C.
Agora, perde justamente para o rival por pouco: são 33.022 são-paulinos contra 33.367 corintianos por partida. O ticket médio do Corinthians é de R$ 53, e o do Tricolor R$ 26.
Na segunda parte da entrevista exclusiva concedida ao GloboEsporte.com, o diretor de marketing fala sobre o apoio da torcida, atualiza as negociações com um novo fornecedor e diz o que pensa sobre os atuais e possíveis novos patrocinadores.
Hoje o Tricolor tem seis marcas estampadas no uniforme. Somados, os valores dos contratos acertados com essas empresas renderão R$ 55 milhões, se forem cumpridos até o fim. Isso não inclui o montante da Under Armour, que poderá sair do uniforme, e de acordos com a Copa Airlines e Gatorade. Veja até quando vão os acordos:
1. Banco Inter – maio 2020
2. Corr Plastik – março 2018
3. MRV Engenharia – maio 2020
4. Urbano – dezembro 2017
5. Joli – dezembro 2018
6. Poty – dezembro 2018
Leia abaixo a entrevista
GloboEsporte.com: Qual cenário você encontrou em maio, no início da gestão?
Marcio Aith: Muito melhor do que o encontrado pelo Leco quando assumiu a presidência pela primeira vez (outubro de 2015), porém, com desafios brutais. Entre eles, encontrar um patrocinador máster, resolver um problema da SPR, empresa que tem o direito de negociar as nossas lojas, e a renegociação da Under Armour, que não estava pagando. Eram desafios grandes.
O que a SPR faz exatamente?
Existem duas grandes empresas que administram lojas de time, como a “SPmania” e as do Palmeiras, que são fontes importantes de receitas para os times de futebol. No nosso caso, tinha contrato com uma empresa que, embora tivesse feito contrato de franquia com várias lojas, não tinha repassado o recurso ao São Paulo. O montante da dívida até hoje é entre R$ 3 milhões e R$ 4 milhões.
Qual é o cenário hoje?
Há maneiras de reconstruir a credibilidade institucional. Com o time ganhando, botar as contas em ordem, chamar patrocinador e expurgar pessoas que não fazem bem ao clube. Com ou sem apoio da torcida. Com o time perdendo, o natural seria sofrer uma oposição da torcida do São Paulo. O que aconteceu foi uma grande surpresa, e nunca será pouco louvar a torcida. Ela abraçou o time no período de dificuldade.
Isso nos permitiu fazer o que chamo de travessia do deserto. É muito difícil e ainda não acabou. O apoio da torcida foi fundamental. Imagina ter de tomar decisões difíceis, perdendo, com um clima bélico. Foi muito bonito ter quase 20 mil pessoas em um treino. É o carinho na dificuldade. Essencial. Só estamos atravessando o deserto, com retomada da credibilidade, com o apoio da torcida.
Há quem conteste se os atuais patrocinadores do São Paulo agregam valor para a marca do clube, com exceção do máster…
São contratos assinados. Não quebro contrato. Nenhum deles foi assinado durante a minha gestão. Mas preciso dizer: foram patrocinadores leais enquanto estive aqui. Pergunto: por que não seriam patrocinadores à altura do São Paulo? Por que é arroz? Por que é bebida? Não consigo entender por que não. É pelo valor? Não sei. Não sei o que uma marca de energético seria melhor do que um refrigerante. É muito fácil dizer que sujeito não é bom patrocinador agora que está dentro. Mas quando não tinha nada na camisa, pergunto: melhor ter ou não ter?
Desmerecer um patrocinador vem da cabeça de quem ou está com a opinião torta ou agindo de má fé. Quem somos nós para dizer que Urbano ou Joli não dá? Veja caso a caso. O que quero fazer, embora não tenha assinado esses contratos: trazer o maior numero de interessados, cotar as propostas e ver o melhor para o São Paulo. Não quero ser engenheiro de obra feita. Avaliar um contrato hoje, se você tem de avaliar à luz de quando não tinha ninguém na camisa.
Você pretende renovar os contratos?
Depende das propostas que aparecerem. O futebol brasileiro passou por um processo de estatização, que passou despercebido da imprensa. Os bancos públicos dominam quase todos os másters das principais camisas da Serie A. Reclamar de um patrocinador privado, que representa a economia brasileira no que há de melhor, no empreendedorismo, para ter “Caixa”, “Banrisul”… O fato é que o São Paulo está com setor privado, não com público. Não que não mereça o publico, mas fomos buscar no privado com a economia brasileira mal. Reclamar do arroz Urbano e não do dinheiro público indo para futebol é fácil, difícil é buscar patrocínio privado.
São Paulo exibe produtos de patrocinadores em sala de imprensa do CT (Foto: Marcelo Hazan)
Aquela imagem dos produtos posicionados em cima da bancada da sala de imprensa nas entrevistas coletivas gera muitas reclamações. Isso está em contrato?
Para ser muito sincero, eu não gosto. É uma situação que encontrei quando cheguei. Está em contrato. Estou em negociação com todos os patrocinadores. Acho que há soluções possíveis de serem adotadas. De novo: não gosto de quebrar contrato nem de mudar. Uma solução criativa é mais bem-vinda. Ou se houver troca mais para frente conseguimos no próximo contrato fazer de de uma maneira mais adequada. Acho que não é exclusividade do São Paulo.
Qual será o modelo de contrato com o novo fornecedor de material esportivo?
Quero dar a opção de assumir também a exclusividade na venda do casual, sem marca (dos patrocinadores). Hoje tem dois modelos: o fornecimento oficial e os clubes que têm empresas que administram as lojas com exclusividade para venderem como quiserem a camisa mais barata (versão torcedor). No atual momento da economia, o torcedor só compra uma ou outra. Se você administra as duas pontas tem mais capacidade.
A ideia, então, é tirar a SPR?
Já estamos sem. Vamos aproveitar o fato de estar sem e oferecer. Temos quem colocar no lugar, mas dou prioridade ao fornecedor de ter a opção. Ele vai vender a camisa versão “torcedor” e a mais cara sem um terceiro.
Como ficaria a porcentagem de royalties das camisas?
Aumenta muito. Com isso alavanco royalties. Em vez de um valor “X” consigo cinco vezes, porque estou dando um canhão. Hoje tem um vendendo uma coisa e outro que teoricamente vende a mesma coisa competindo. O casual canibaliza (a versão) torcedor. No novo modelo vai poder cuidar da loja e aproximar os preços. Uma não compete com a outra.
Em royalties acredito muito no desempenho do clube. É justo ter uma grade de royaltes com desempenho de venda. Essa coisa de garantia mínima: vendendo ou não paga tanto. Ok, mas o clube tem de ser sócio do fornecedor. Se vender muito, o percentual sobre cada camisa também tem de aumentar. Imagina: se é 13% por preço da camisa que nos paguem, se vende 200 mil repassando 20%, caso venda 400 mil, poderia pular para 40%. Acredito em meritocracia do time: quero que o parceiro pague mais quanto melhor nosso desempenho estiver no campo. Isso se chama parceria.
Mas e se estiver mal como nesse ano?
Aí é um problema da vida. Esse era o problema do contrato da Under Armour. Era tão bom, com tanta paz, que não foi cumprido.
Nesse ano a torcida encheu o estádio mesmo com o time brigando para não cair…
Quem tivesse os dois lados, da versão casual e torcedor, poderia usar muito bem. A loja do Morumbi está fechada. Nunca foi aberta pela Under Armour. Imagina com esse estádio lotado, alguém com uma loja desse tamanho?
Vocês pretendem manter essa loja ou ter outras pela cidade?
Há dois modelos. Uns acreditam na multiplicidade de lojas espalhadas pela cidade e outros que acham que tem de ter uma única loja no estádio. Não tenho opinião formada. Eles (fornecedores) saberão fazer isso, porque estão interessados em vender.
Terceira camisa do São Paulo: fornecedor pode de material esportivo pode mudar (Foto: Divulgação)
Os débitos da Under Armour foram pagos?
Era uma relação muito difícil quando entrei. Débitos não pagos e pedido para reduzir o contrato. Eu insisti para conversar se pagassem. A relação começou muito tensa e hoje é profícua, tanto que querem propor um novo contrato. É uma pena que a relação tenha começado assim. (nota da redação: uma das dívidas era de R$ 6 milhões, além de débitos no fornecimento de material).
Como está a negociação com um novo fornecedor? A Under Armour pode permanecer?
Estamos negociando com sete fornecedores, entre eles a Under Armour. Seguem interessados e estão formulando uma proposta. Não temos agonia de prazo. O destrato que fizemos nos deu tranquilidade de tempo. Temos até metade do ano que vem para usar o uniforme, caso não encontre um fornecedor. Mas queremos resolver o mais rápido possível, porque tem de desenvolver uma camisa. O ideal seria até o fim desse ano. Concorrentes entraram em contato. Acredito que teremos um bom resultado, embora o modelo de negócios do Brasil, no momento em que o contrato foi feito, seja completamente diferente.
Ou seja, o São Paulo não vai atingir o valor do contrato antigo fechado no fim de 2014, de R$ 15 milhões anuais…
Aquele contrato era tão bom, mas tão bom, que não foi cumprido. O bom contrato é aquele que é cumprido. Acho que tinha um problema, talvez no seu mérito. Era bom demais para ser verdade. Por isso vamos renegociar em termos terrenos. Há vários outros elementos a serem incluídos em um novo modelo de contrato que podem elevar a patamar parecido.
Você trabalhou na comunicação do governo Alckmin. Vai chefiar a campanha dele à presidência da república em 2018?
Ele é governador de São Paulo. Não é candidato à presidência e não me convidou. Concordo que tenho uma relação especial com ele, assim como com outras pessoas da politica, mas tenho total ciência que esse cargo exige dedicação exclusiva. Enquanto estiver aqui vou trabalhar 24 horas. A política brasileira está tão bagunçada que até haver uma definição de candidato vai demorar muito tempo. Confesso que apesar da confusão toda tenho me divertido aqui. Sou bem remunerado. Não tem prazo no meu contrato, embora fico feliz de saber que esse processo depuratório (do caso Alan – leia mais aqui) pagou os meus salários e de outros diretores que ajudaram por dois anos.
O marketing palpita nos preços dos ingressos?
O financeiro decide, e eu palpito. Diante do tamanho do Morumbi você seria louco de cobrar os preço que são cobrados nas arenas do Palmeiras e do Corinthians. Não dá, porque não enche os estádios. Ainda que enchendo o estádio com R$ 25 você tem de usar o público para ter outras receitas. Fazer parceria com empresa de transporte por aplicativo, vender camisa na loja… Há milhares de maneiras de compensar o preço do ticket. É o que estamos tentando: ocupar a loja e buscando parceiros. Se você tem um público desse tamanho… Qual outro time levou tantos torcedores para os estádios? (nota da redação: o recorde de público pagante do ano no Brasil é do São Paulo: 61.142 pessoas).
Morumbi encheu nos jogos do São Paulo em 2017 (Foto: Newton Menezes/Futura Pres)
O São Paulo é o novo “time do povo” da capital?
Está virando por muitos motivos. Exatamente por conta do Morumbi e do ticket médio. Por algum motivo lógico e de paixão o torcedor passou a ter pelo São Paulo uma dedicação que raros times teriam em um período de dificuldade como esse que tivemos. O São Paulo está se popularizando no bom sentido. Acho que sim. O estádio é um dos fatores.
A ideia é manter os preços dos ingressos para 2018?
Vamos ter de rever de acordo com a situação, mas posso assegurar que o ticket médio será compatível e democrático ao torcedor. Isso nos favorece em apoio. A principal surpresa desse ano foi o apoio da torcida. Foi fundamental. Temos muito o que agradecer ao torcedor. Temos várias ideias em andamento. Não quero adiantar para não quebrar a surpresa.
Para a conta do Morumbi fechar necessariamente precisa ter aluguel para show?
Tem de buscar períodos ociosos e uma negociação que faça sentido financeiramente. Ano que vem tem Copa do Mundo, um mês e meio parado. É uma bela chance para produzir algo. Para justificar tirar o torcedor daqui para o Pacaembu precisa valer muito a pena.
Qual o planejamento para 2018 no marketing?
Tem o de sempre: rever os contratos vencendo. E tem criatividade. Ainda não conseguimos potencializar ao máximo o fato de estarmos nos transformando em um time de massa, com estádio cheio. Isso para efeito de marketing é importantíssimo. Tem outra coisa que é a minha menina dos olhos: a TV do São Paulo. Precisa prestar atenção no próximo ciclo de negociação. A internet será o que foi da TV aberta para a paga. As TV’s de clubes terão uma importância brutal.
Temos um máster digital, um banco digital, interessado nisso. A outra leva de patrocinadores vai ser digital. O crescimento das redes sociais e da TV também depende também disso. Digitalizar o clube pode parecer incompatível com a massificação do Morumbi, mas tem uma importância brutal. É preparar o clube para o um novo ciclo tecnológico que vai acontecer. Para efeito de novas receitas: banco de dados, digitalizar e dar muita importância à internet como fonte de receita no próximo ciclo de negociação de direitos de transmissão.