GazetaEsportiva.net
José Victor Ligero e Marcelo Baseggio
Dentre os clubes mais ricos do Brasil, o São Paulo é aquele mais próximo de alcançar Flamengo e Palmeiras, que hoje ocupam o topo do ranking. A análise parte do economista Cesar Grafietti, consultor do Itaú BBA e responsável pela análise financeira das principais agremiações nacionais há oito anos.
“O São Paulo é o clube que está mais preparado para se equiparar a Flamengo e Palmeiras. Pode disputar, mesmo sem um patrocinador forte como o do Palmeiras ou a receita de TV do Flamengo, porque tem um estádio grande, torcida grande”, afirmou Grafietti, em entrevista exclusiva à Gazeta Esportiva.
Presidido por Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, o Tricolor vem equilibrando suas contas graças a uma rigorosa política econômica, aliada aos novos contratos de publicidade. Um sintoma disso é a contratação de Pablo, a mais cara da história do clube.
A meta é sanar seus débitos com instituições financeiras até o fim de 2019 e se tornar independente da venda de atletas no ano seguinte. “Em 2018, não ouvi falar em atraso de salários e problemas relacionados à falta de caixa. Isso significa que esse processo que o São Paulo começou recentemente vem surtindo efeito”, atestou.
A reestruturação do São Paulo, ainda segundo o consultor, passa diretamente pelo executivo de futebol Raí. De acordo com Cesar Grafiette, o ex-jogador, com diploma da Uefa, aprimorou a gestão de recursos financeiros no departamento de futebol. “Até então, tinha muito diretor que fazia o papel de diretor e que não conseguia fazer da melhor maneira possível”, frisou.
FAMA DE EXPORTADOR
Num clube de futebol, uma parte importante da venda de atletas é para
cobrir um buraco importante no fluxo de caixa. O primeiro grande
problema é vender para fechar as contas. O orçamento que o clube
divulgava de R$ 70 milhões em venda de atletas era única e
exclusivamente para manter as contas em dia, e isso é muito ruim.
CICLO VICIOSO
É natural que o clube venda atletas dado que ele é um formador.
Tem a questão do futebol europeu que atrai o atleta mais jovem, mas ele
acaba vendendo mais do que deve justamente porque precisa fechar suas
contas. Tem que repor com outro que às vezes é mais caro e nem sempre é
uma garantia que ele irá desempenhar o mesmo futebol do atleta que foi
vendido. O grande problema é vender para fechar conta.
MUDANÇA DE PATAMAR
Há três ou quatro anos, o São Paulo estava em uma situação extremamente
complicada, muitas dívidas, custos altos, tendo que vender atletas para
fechar as contas. O ano de 2017 foi o último que isso aconteceu, tanto é
que em 2018 não ouvi falar em atraso de salários e problemas
relacionados à falta de caixa.
AMORTIZAÇÃO DE DÍVIDAS
Isso significa que esse processo que o São Paulo começou recentemente
vem surtindo efeito. Como transformar uma estrutura mais organizada de
custos mais competitiva? Tendo dentro da estrutura esportiva do clube
alguém capacitado para fazer isso. É preciso montar elencos bem
equilibrados com atletas baratos para poder fazer esses clubes irem bem
dentro de campo.
IMPORTÂNCIA DE RAÍ
O São Paulo passou dessa fase com a chegada do Raí. Até então, tinha
muito diretor que fazia o papel de diretor de futebol e que não
conseguia fazer da melhor maneira possível. O Raí é alguém do ramo, com
conhecimento, e se não trouxe resultados ainda neste ano, teve um
desempenho bastante equilibrado e coerente. Parte dessa venda de atletas
serviu justamente para reciclar o elenco, abrir mão de alguns atletas,
trazendo outros que se encaixavam no perfil do treinador. Alguém do ramo
é o que faz a diferença para clubes com menos dinheiro fazer a
diferença dentro de campo.
USO INTELIGENTE DO DINHEIRO
Com uma figura que coordena bem a parte esportiva e pagando as dívidas, o
clube consegue ter mais eficiência no uso desses recursos. Acho que
essa ‘eurodependência’ [termo encontrado na parte do São Paulo no
relatório do Itaú BBA referente ao ano de 2017] vinha muito da
necessidade de vender porque precisava pagar conta. Agora pode usar o
valor de forma mais eficiente. Acho que faltava muito essa gestão
esportiva eficiente no São Paulo que parece começar a acontecer desde a
chegada do Raí. Há acertos, há erros. O que se espera é que ele corrija
os erros cometidos no ano de 2018 e não os repita para conseguir um
desempenho ainda melhor do que foi esse primeiro ano dele.
TERCEIRO MAIS RICO
O São Paulo é o clube que está mais preparado para se equiparar
a Flamengo e Palmeiras. Conseguiu acertar boas receitas de TV, entra em
um grupo com boas receitas de TV a partir de 2019, equilibrou a questão
de publicidade que vinha capengando nos últimos anos, conseguiu manter
uma estrutura de receitas de publicidade bastante robusta com o Banco
Inter e a MRV, conseguiu melhorar bilheteria, tem levado público para o
estádio, e a venda de atletas vai trazer esse dinheiro adicional para
pagar as dívidas e fazer a reciclagem do elenco.
À FRENTE DO CORINTHIANS
A longo prazo teremos quatro clubes com muito mais receita do
que os outros, que são Flamengo, São Paulo, Palmeiras e Corinthians. O
São Paulo está mais perto de fechar esse grupo do que o Corinthians, que
tem a dívida do estádio e do custo do clube social. Mantendo essa
estrutura que tem sido tocada nos últimos anos, o São Paulo pode
disputar, mesmo sem um patrocinador forte como o do Palmeiras ou a
receita de TV do Flamengo, porque tem um estádio grande, torcida grande.
DOIS OBSTÁCULOS
O primeiro é o estádio. Não acho que é porque ele é antigo ou
desconfortável. Essa questão é menos relevante, o acesso está melhor com
o metrô próximo. O que é mais relevante é o fato de o estádio ter 60
mil lugares. Obviamente, tirando os jogos muito importantes, você, como
torcedor, vai conseguir comprar ingresso facilmente. Não dá para o clube
cobrar um valor muito alto pelo ingresso porque não enche o estádio, e
isso está relacionado também com a qualidade do jogo. O São Paulo somou
públicos bastante relevantes neste Campeonato Brasileiro.
MORUMBI GRANDE DEMAIS
O que falta para aumentar a receita do estádio é justamente ter uma
capacidade reduzida. Se o São Paulo tivesse um estádio para 40 mil
pessoas, teria um ticket médio parecido com o do Palmeiras ou do
Corinthians. Hoje não tem porque [o Morumbi] tem capacidade para 60 mil
lugares, e é impossível que 200 mil pessoas queiram ir a um jogo toda
semana. O programa de sócio torcedor acaba não evoluindo, porque, como a
oferta é muito grande, ele também não tem interesse em ficar pagando
antes para poder conseguir o ingresso na frente. Falta equilibrar a
capacidade do estádio com o desempenho que leva o torcedor a ir ao
estádio.
SEGUNDO OBSTÁCULO
A maioria dos clubes de futebol que contam com a parte social
tem um buraco no caixa por causa da parte social. Não vi números deste
ano do Corinthians e do São Paulo, mas sei que o Corinthians tem que
tirar dinheiro do futebol para colocar no social. O risco desses clubes é
justamente isto: ter que tirar dinheiro do futebol para cobrir buraco
no social. O São Paulo tem que ter, ao mesmo tempo, uma gestão eficiente
no clube social e no estádio para poder dar esse salto, encostar nos
clubes de cima, uma vez que todas as outras receitas são mais ou menos
equilibradas.