Fuga de avô da Iugoslávia e “não” a rival: assim beque parou no São Paulo

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GloboEsporte.com

Tossiro Neto

Lyanco Vojnovic nasceu no Brasil porque sua família fugiu da Segunda Guerra. Sonho do garoto é conhecer o avô, de quem herdou o sobrenome de difícil pronúncia.

lyanco são paulo famiília (Foto: Reprodução)
Lyanco com os pais e a irmã (à esquerda) (Foto: Reprodução)

O nome e os traços europeus causam falsa impressão. Apesar de não parecer, Lyanco Vojnovic, novo zagueiro titular do São Paulo, é brasileiro. Capixaba. Foi Vitória, no Espírito Santo, o local de nascimento do seu pai, muito tempo depois de o avô (que ele ainda não conhece) ter deixado a antiga Iugoslávia, há sete décadas. E é graças à fuga da família da Segunda Guerra Mundial que o garoto de 18 anos fala português e joga futebol.

– Meu pai tinha sete anos quando veio para o Brasil, acompanhado da mãe. O navio teve de passar por quatro países. Nesses quatro países, ele aprendeu a língua local para não ser preso. Quando chegou, tirou cidadania brasileira. Meus dois irmãos, minha irmã e eu nascemos aqui – conta o pai do zagueiro, Marcelo Vojnovic, que mora no Rio de Janeiro, cidade da qual o jogador se mudou no início do ano para jogar no Tricolor.

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Em janeiro, através de uma ação judicial, Lyanco conseguiu se desligar do Botafogo por não receber salários. Não faltaram clubes interessados no beque de 1,87m. Uma proposta por escrito do Milan balançou. Às vésperas do fechamento da janela de transferências – e também devido à falta de passaporte europeu na época –, porém, prevaleceu uma vontade de infância, que o levou a recusar também o Palmeiras.

Bate aquela ansiedade de jogar em casa, ainda mais contra um time forte como o Inter. Mas não é um bicho de sete cabeças”
Lyanco

– Eu estava para ir para o Fluminense, e apareceu ainda o Cruzeiro. Mas, no final, escolhi vir para o São Paulo. Teve um campeonato que disputei, ainda guri, e alguns torcedores estavam vendo o jogo. Eu disse ao meu pai que queria jogar no São Paulo. Quando soube do interesse, quis vir para cá – disse Lyanco, no CT da Barra Funda (onde tem dormido), na quinta-feira, um dia depois de estrear como titular no empate por 0 a 0 contra o Joinville devido a desfalques no setor.

O comportamento seguro em Santa Catarina, somado às boas atuações também contra Atlético-PR e Ponte Preta (quando entrou no decorrer do jogo, improvisado como volante), firmou definitivamente a promessa no elenco profissional. Inicialmente, a ideia da diretoria ao contratá-lo no começo da temporada era dar a ele um pouco mais de experiência nas divisões de base, em Cotia, antes de uma promoção em 2016. Só que a saída de atletas apressou o técnico Juan Carlos Osorio.

– O Osorio se encantou por ele. É técnico que faz tudo na hora certa, escolhe as palavras certas, sabe dizer quando é e quando não é a hora de determinadas coisas. Ele está ajudando muito o Lyanco, que é um menino muito tranquilo, um grande camarada – comenta o pai, orgulhoso do filho, com quem mantém contato diariamente por telefone.

Antes da Europa, o interior de São Paulo

lyanco são paulo avô (Foto: Reprodução)
Jovan Vojnovic, o avô que Lyanco ainda não conhece, mora em Franca, no interior de São Paulo (Foto: Reprodução)

Embora o destaque do sobrenome “Evangelista Silveira Neves Vojnovic” fique para a parte paterna, é o lado materno da família de Lyanco que poderá facilitar uma eventual transferência para o exterior. Em breve, ele terá cidadania portuguesa. Mas nem o passaporte europeu lhe desperta interesse pela região onde nasceu seu avô – que, depois da desintegração da Iugoslávia, pertenceria atualmente à Sérvia, de acordo com pesquisas da família.

– Para falar a verdade, não tenho vontade. O que tenho curiosidade é de conhecer meu avô. Até hoje, eu não o conheci, mas meu pai diz que vai me levar – disse.

Jovan Vojnovic, o avô, tem quase 80 anos. Lyanco já mandou mensagem a ele por meio do Facebook de um parente. Depois de fugir da guerra na qual seu país lutava contra as potências do Eixo (Alemanha, Itália e Japão), ele estudou no Brasil e se tornou químico reconhecido. O último prêmio, há dez anos, foi uma viagem de volta a sua terra. Atualmente, reside em Franca, no interior de São Paulo, a aproximadamente 400 quilômetros da capital, e se recupera de um problema de saúde recente.

Se o encontro ainda não tem data, o próximo compromisso da promessa com a camisa tricolor é neste sábado, diante do Internacional. Será a estreia como titular no Morumbi.

– Bate aquela ansiedade de jogar em casa, ainda mais contra um time forte como o Inter. Mas eu amo jogar futebol, sempre joguei. Não é um bicho de sete cabeças – diz o beque, prestes a realizar o sonho de infância de ter seu nome gritado pela torcida. O sobrenome ainda é difícil.