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Edoardo Ghirotto
Antes de estrear na Libertadores, o jovem cobra apoio da torcida para o time “fazer história” no continente pela 4ª vez
Tricolor desde criança, Rodrigo Caio tinha 11 anos quando viu o São Paulo conquistar a Libertadores pela última vez, em 2005. Hoje, ele é o zagueiro mais regular à disposição do técnico Edgardo Bauza. O ídolo Diego Lugano não tem data para estrear e seu futebol é uma incógnita. Breno é o atual titular, mas suas condições físicas não passam confiança. Lyanco ainda é uma promessa das categorias de base, enquanto Lucão sofre com críticas da torcida. Diante da escassez de opções no setor defensivo, o jogador deixou a juventude de lado para despontar como um dos líderes do elenco.
“Eu tenho esse perfil desde que atuava na base. Sou um cara que não gosta de perder nem no par ou ímpar”, diz o zagueiro, ao ser questionado sobre as cobranças que faz a atletas do calibre de Michel Bastos e Ganso. Da torcida, no entanto, ele exige paciência. Sem entender os motivos por trás da perseguição a Lucão – um amigo que divide com ele as convocações à Seleção olímpica -, Rodrigo Caio alerta para as dificuldades que o São Paulo enfrentará até assimilar a filosofia de trabalho de Bauza. “Podem ter certeza que até o Lugano, com 35 anos, também vai falhar”.
Antes de viajar para a cidade peruana de Trujillo, onde o Tricolor enfrenta o César Vallejo, Rodrigo Caio conversou com a Gazeta Esportiva sobre as chances do São Paulo na primeira fase da Libertadores, os métodos empregados pelo argentino Bauza, a convivência com o ídolo Lugano e as lições aprendidas após a goleada por 6 a 1 para os reservas do Corinthians.
Gazeta Esportiva – É um início de ano diferente para o São Paulo, sem Rogério Ceni e Luis Fabiano e com um treinador argentino no banco. O time está preparado para disputar a Libertadores?
Rodrigo Caio – Claro que não é fácil. Perdemos jogadores de qualidade e que representavam muito para a equipe e para o clube. Mas o time tem feito uma reestruturação muito boa. Entraremos numa competição importante e espero ver a equipe crescer cada vez mais. Este será o nosso primeiro jogo e terá uma importância muito grande para o São Paulo ganhar ritmo de jogo e confiança. Mas precisamos de um tempo até formarmos um time forte.
Gazeta Esportiva – O São Paulo sentiu bastante a parte física no empate por 1 a 1 com o Red Bull, na estreia do Paulistão. É um obstáculo a mais para a equipe no jogo contra o César Vallejo?
Rodrigo Caio – As partes física e técnica ainda não estão 100%. É o começo do ano, tivemos o nosso primeiro jogo oficial e precisamos evoluir muito. Contra o César Vallejo será importante ter mais controle sobre o jogo. Nós perdemos muitas bolas contra o Red Bull e demos muito espaço para o contra-ataque. Lá eles virão com tudo para cima de nós, então precisamos evitar esses erros. Tentaremos aproveitar os espaços para fazer até dois gols, porque isso facilitará nossa vida dentro de casa.
Gazeta Esportiva – Você tinha 11 anos quando o São Paulo venceu a Libertadores pela última vez, contra o Atlético-PR. Quais lembranças você tem daquele título?
Rodrigo Caio – Foi uma conquista emocionante, um jogo em que eu torci bastante com o meu pai, que é são-paulino roxo. Lembro como se fosse hoje das defesas do Rogério na competição. Foi uma partida que ficou na história pela excelente equipe que o São Paulo enfrentou. O Lugano esteve naquela decisão e hoje está aqui no grupo. Espero que ele passe um pouco dessa experiência e que possa conquistar a Libertadores e o Mundial conosco.
Gazeta Esportiva – Quando você estava nas categorias de base, o São Paulo vivia uma época vencedora e dava mostras de que dominaria o futebol nacional. Hoje o clube vive uma situação mais delicada e luta para retomar aquele protagonismo. Você esperava subir para o profissional em uma fase tão delicada?
Rodrigo Caio – Não esperava. O clube está acostumado a vencer e sempre foi protagonista. Infelizmente, nos últimos três ou quatro anos passamos por momentos difíceis e só conquistamos a Copa Sul-Americana [em 2012]. Mas eu espero colocar o São Paulo nos trilhos novamente. Estamos em uma equipe que precisa sempre estar entre as melhores dos campeonatos que disputa. E vamos em busca disso. Acredito que temos um elenco muito qualificado e que cada jogador que entrar em campo com a camisa do São Paulo pensará em fazer história. Eu penso dessa forma. Vou tentar fazer história aqui em 2016, conquistar os títulos e colocar o São Paulo no lugar em que ele merece estar.
Gazeta Esportiva – Em algum momento os jogadores chegaram a comentar sobre o que poderia acontecer ao São Paulo caso o César Vallejo se transformasse em um novo Tolima? [Em 2011, o Corinthians foi eliminado na pré-Libertadores pelo modesto time da Colômbia].
Rodrigo Caio – Cada jogo tem uma história diferente. E nós precisamos jogar. Se dermos mole nós sabemos que não vamos ganhar. Se o César Vallejo está nessa situação, jogando contra nós, é porque tem condições. O time deve entrar em campo focado e confiante na vitória, mas jogando bola. Nós colocaremos a bola no chão e faremos nosso futebol. Sabemos que a situação é favorável para nós. A única coisa que esperamos é fazer um bom jogo, segurar o time deles e fazer os gols.
Gazeta Esportiva- Você tem só 22 anos e já desponta como um dos líderes do elenco, principalmente por conta das saídas do Ceni e do Luis Fabiano. Como alguém tão novo exerce esse papel nos vestiários, ainda mais tendo nomes como Michel Bastos e Ganso no time?
Rodrigo Caio – Sempre cobrei bastante dos jogadores. Eu tenho esse perfil desde que atuava na base Sou um cara que não gosta de perder nem no par ou ímpar, é uma qualidade minha. Eu procuro cobrar, orientar, e gosto muito de ser cobrado, porque isso faz com que você cresça e evolua. Temos jogadores experientes, com os quais eu procuro aprender também. Juntos temos o mesmo pensamento, o mesmo empenho de vencer os jogos e fazer com que o grupo se fortaleça cada vez mais. A vinda do Lugano será muito importante para nós nesse sentido. Ele nos ensinará bastante e espero que todos os líderes consigam ajudar o São Paulo dentro de campo.
Gazeta Esportva – Era comum ver o Osorio conversando reservadamente com você após os treinos. Isso te trouxe mais confiança ou ajudou a melhorar teu desempenho no São Paulo?
Rodrigo Caio – Foi muito importante. É um treinador que desde que chegou aqui confiou em mim, veio conversar diretamente comigo sobre onde eu jogava e como eu gostava de jogar. Vinha de uma lesão de joelho, não estava atuando com muita frequência, e ele me deu a sequência de jogos que permitiu que o meu segundo semestre fosse tão bom. É um treinador que ficará marcado positivamente e desejo todo o sucesso do mundo na decisão que ele tomou de sair do São Paulo para chegar a uma seleção [México].
Gazeta Esportiva – Por outro lado, o Bauza não manteve conversas particulares com os jogadores – com exceção do Centurión, que é argentino. Hoje existe um respeito excessivo, um distanciamento do elenco com o treinador?
Rodrigo Caio – É uma questão de personalidade. O Bauza é um cara mais reservado, mas dentro de campo ele fala bastante e orienta mais nos treinamentos. Já o Osorio gostava de conversar mais nos bastidores. Apesar de cobrar muito, o Bauza também dá muita abertura para os jogadores falarem. Procuro me expressar quando tenho dúvidas, assim posso corrigi-las para não cometer falhas dentro de campo. Isso é o mais importante, pensar igual durante os jogos e executar o que ele pede para nós.
Gazeta Esportiva – O Bauza tem apostado no Centurión em vez do Rogério, colocou o Mena no lugar do Carlinhos, trouxe o Calleri e pediu a contratação do Buffarini. Essa “invasão estrangeira” é benéfica para um time como o São Paulo ou causa desconforto nos jogadores brasileiros que perdem espaço?
Rodrigo Caio – Em nenhum momento os jogadores ficam desconfortáveis. Se ele colocou alguém para jogar, isso significa que aquele atleta tem condição de jogar. É o começo de ano e o Bauza está nos conhecendo. Ele não conhecia muitos jogadores, mas já trabalhou com alguns e viu outros jogarem. É normal ele colocar em campo os que ele acha que vão render mais. Mas não é porque o jogador está no time que ele seguirá o ano inteiro. Isso ele deixa muito claro. Só vai jogar quem está rendendo, mostrando trabalho e quem está evoluindo. Muitos começam a temporada e não terminam. O mais importante é trabalhar forte. Temos um elenco muito qualificado, com jogadores que estão no banco e brigando pela posição. Se os titulares derem mole, ficarão sem um lugar na equipe. Essa briga é sadia e faz o time crescer como um todo.
Gazeta Esportiva – A estreia do Lugano é a que mais causa expectativa entre os estrangeiros. O Breno deu uma entrevista recentemente e disse que tem a intenção de jogar como zagueiro nesse ano. Você acha que será improvisado como volante para o Lugano poder atuar?
Rodrigo Caio – Venho fazendo meu trabalho, dando meu melhor e tentando melhorar minha parte física e técnica para conseguir pegar o ritmo de jogo, já que no começo do ano é complicado. Temos jogadores de muita qualidade na zaga, são quatro atletas que podem jogar a qualquer momento. Será uma briga boa, porque eu deixei claro que gosto de jogar como zagueiro. É onde eu me sinto bem e onde venho atuando há mais tempo. Prefiro jogar como zagueiro e vou brigar por essa posição. Se o treinador precisar de mim como volante, eu posso atuar. Em algumas situações não vou render tanto quanto eu rendo na zaga, mas o mais importante é estar jogando e estar dentro de campo para ajudar a equipe.
Gazeta Esportiva – Com relação à zaga, as críticas da torcida ficaram muito fortes depois do 6 a 1 para o Corinthians. O que aquele dia significou para você?
Rodrigo Caio – É muito difícil falar de um dia como esse. Para mim foi um dia atípico e que dificilmente acontecerá de novo. Claro que ficamos marcados negativamente por tomar seis gols de um rival, mas isso faz parte do passado. Precisamos levantar a cabeça e saber que cada jogo é um jogo. Cada um teve sua própria reflexão, porque foi um dia que não conseguimos jogar. Nós tomamos três gols rapidamente e o time perdeu a confiança, abaixou a cabeça e aconteceu o que aconteceu. Temos que esquecer isso. O ano já começou e precisamos mostrar o nosso valor e provar que temos condições de vencer os nossos rivais.
Gazeta Esportiva – O presidente Leco disse no dia seguinte à goleada por 6 a 1 que estava incomodado com a falta de comprometimento de alguns jogadores. Esse diagnóstico também passou pelos vestiários?
Rodrigo Caio – Cada um tem sua própria reflexão e sabe se deu o melhor dentro de campo. Isso é o mais importante. Quando coloco minha cabeça no travesseiro, tenho a certeza de que corri e me dediquei. Cada um sabe o que pode melhorar e se está correndo. Claro que em certos momentos é preciso cobrar. Fui na imprensa e cobrei cada um. Dentro de campo eu cobro cada um. Quando o time perde, todo mundo perde. Se na técnica não dá para vencer, então tem que ser na vontade ou de alguma outra forma. No ano passado perdemos jogos que não gostaríamos. Nos momentos difíceis não conseguimos superar as dificuldades e ficamos tristes por isso. Espero que 2016 seja diferente. E para isso precisamos pensar e agir diferente.
Gazeta Esportiva – Você é muito amigo do Lucão. Houve alguma conversa entre vocês após ele deixar o Morumbi chorando com as críticas na vitória por 3 a 2 sobre o Figueirense, no ano passado?
Rodrigo Caio – O Lucão é um moleque muito tranquilo e conversamos bastante. Naquela ocasião não foi diferente. Naquele momento ele chorou mais pela situação que estávamos passando dentro de campo, que foi a virada no final do jogo. O choro foi por isso, e não pelas vaias. É um moleque que tem uma cabeça muito boa e nós ficamos tristes pelo que ele passou. Ele é trabalhador e não merece isso. E não só ele. Nenhum jogador merece passar por isso. Quando estamos dentro de campo não queremos errar, queremos vencer sempre, mas somos seres humanos e nossa profissão faz com que as falhas sejam normais. Tenho certeza que ele superou isso e dará muitas alegrias para a torcida do São Paulo.
Gazeta Esportiva – No sábado, o Lucão entrou no segundo tempo e errou ao cometer um pênalti contra o Red Bull. Você sente que ele está pronto para enfrentar a pressão e jogar pelo São Paulo em um ano de Libertadores?
Rodrigo Caio – Acredito que sim. O Lucão cresceu muito e teve suas chances em 2014 e 2015. Ele vem jogando e as falhas são normais pela idade. Eu sou novo e também falho muitas vezes. Você pode ter certeza que até o Lugano, com 35 anos, também vai falhar. O melhor zagueiro do mundo, ou o jogador mais experiente, também vai errar em algum momento. E isso acontece porque nós somos seres humanos. Mas a torcida pode acreditar que nós sempre queremos vencer quando entramos em campo.
Gazeta Esportiva – Por que a torcida do São Paulo é tão impaciente com jogadores jovens?
Rodrigo Caio – Eu não consigo entender, sinceramente. Quando eu subi para o profissional isso acontecia bastante também. A torcida me cobrava e vaiava em alguns momentos. Mas sempre tive a cabeça no lugar. Sabia que no momento certo cresceria como jogador e como pessoa e mostraria o meu potencial. O mais importante é estar com a cabeça tranquila. Vir trabalhar, dar seu melhor e se dedicar. Em alguns momentos as coisas não acontecem como você gostaria, mas o mais importante é ter o pensamento tranquilo e saber que você trabalha muito bem.
Gazeta Esportiva – Houve em janeiro uma briga entre uma torcida organizada do São Paulo e policiais em um jogo da Copinha. Dias depois, o presidente Leco disse que os jogadores tinham medo das uniformizadas. Como é a relação do elenco com as facções?
Rodrigo Caio – Acredito que não existe medo entre os jogadores. Quando entramos em campo, nós temos uma responsabilidade muito grande e somos cobrados por isso. Você é cobrado se joga bem quando sai na rua. Mas essa questão de medo eu acho que não existe, não. Nós damos nosso melhor, procuramos vencer os jogos e em muitas ocasiões o nosso melhor não é o suficiente para a vitória. Em algumas ocasiões a torcida passa dos limites, como aconteceu nesse jogo da Copinha. Foi um fato lamentável e eu espero que haja punições, porque só assim acabaremos com essas brigas no estádio. Mas medo, da nossa parte, não existe.
Gazeta Esportiva – Contar com o Lugano no elenco será importante para livrar os garotos, como você e o Lucão, dessa pressão da torcida?
Rodrigo Caio – Será um equilíbrio para nós, mas as críticas serão para todos. Quem jogar ao lado dele vai ser criticado da mesma forma se a equipe tomar um gol. Não pode criticar somente o Lugano se eu estou ao lado dele e erro. A critica é para os onze atletas que estão dentro de campo e para os três que entram no decorrer da partida. Felizmente as coisas são assim, porque isso faz com que a gente cresça.
Gazeta Esportiva – Para você, o Lugano foi uma contratação técnica, pensando no que ele pode render dentro de campo, ou é um jogador mais voltado para os vestiários e para fazer as pazes com a torcida?
Rodrigo Caio – Pela estrutura e pela grandeza da instituição, eu não acredito que o São Paulo contrataria um jogador apenas por marketing ou para dar uma resposta à torcida. Ele será cobrado pelo que fizer em campo. Temos a certeza de que ele vai nos ajudar tecnicamente, correrá com a gente e dará seu melhor. E tenho certeza que ele vem para fazer isso, não é só uma jogada de marketing. O Lugano sabe que a pressão será muito grande em cima dele, mas se ele decidiu vir para o São Paulo, sabe muito bem que tem condições de mostrar seu potencial e se tornar ainda mais ídolo.
Gazeta Esportiva – O que esse time do São Paulo aprendeu com os erros de 2015, tanto com as derrotas em campo quanto com os escândalos dos bastidores? E o que será feito de diferente em 2016?
Rodrigo Caio – A primeira coisa que acho essencial, e que mudou bastante, foi a postura do time em jogar mais junto. Falo de uma forma geral. Os onze jogadores têm o mesmo pensamento e a mesma vontade para vencer. Todos estão correndo, dificilmente você verá o time exposto nesse ano. Todos entenderam que não somos só eu e o Breno que precisamos desarmar e tirar a bola lá atrás. Agora a equipe sabe que isso começa pelo Alan Kardec, Michel Bastos, Centurión e Ganso. E começar o ano dessa forma é muito bom. Com o tempo, o time se soltará mais e a qualidade individual aparecerá. Acredito que essa equipe fará muita coisa boa nesse ano.