Se a Libertadores virou obsessão para os brasileiros, a “culpa” é de Telê

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globoesporte.com

Leandro Canônico

Sonho de consumo das principais equipes do país, torneio ganhou outra importância após títulos do São Paulo. Técnico nos deixou há dez anos, mas seu legado é eterno

telê santana são paulo libertadores faixa (Foto: Agência Estado)

Telê com a faixa de campeão da Libertadores
(Foto: Agência Estado)

Telê Santana ainda estava vivo no dia 14 de julho de 2005. Que bom! Assim ele pode ver, ouvir ou pelo menos saber que naquela noite mais de 70 mil vozes gritaram seu nome em coro após o terceiro título do São Paulo na Libertadores da América. Homenagem mais do que justa. Arrisco dizer até que era obrigação. Afinal, se a competição virou uma obsessão para os brasileiros, a “culpa” é dele, campeão pelo Tricolor em 1992 e 1993.

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Ninguém ganha o apelido de Mestre à toa. A fama de pé-frio, acredito, só serviu para dar dimensão ainda maior aos seus feitos. Veja, Telê Santana é reverenciado até hoje por uma derrota histórica. Puro palpite: se a seleção brasileira tivesse conquistado a Copa do Mundo de 1982, talvez o nome do técnico não tivesse presença no topo dos trending topics mundial (vamos fingir que aquela era uma época de rede social, tá?)

Há dez anos, no dia 21 de abril de 2006, Telê Santana nos deixou. Por uma década, o Fio de Esperança lutou contra as complicações de uma isquemia cerebral. Uma pena que a doença tenha forçado sua aposentadoria precoce. Mas a história está aí para nos lembrar que o legado deixado por Telê Santana mudou o futebol brasileiro. Fez os principais clubes do país terem outras ambições, outras prioridades. A Taça Libertadores da América virou obsessão.

“Ah, mas a Libertadores sempre foi importante, o principal torneio sul-americano”. Claro! Mas preste atenção a esses números: o Brasil tem 17 títulos da competição. Só cinco foram conquistados antes da Era Telê. E 12 (!), incluindo os dele, depois que o técnico fez brilhar aquele São Paulo de 92 e 93. Com futebol bonito e moderno, o Mestre alterou o planejamento dos clubes brasileiros.

Telê Santana Morumbi (Foto: Maurilo Clareto/Estadão Conteúdo)Telê Santana no Morumbi, um dos principais palcos de sua carreira (Foto: Maurilo Clareto/Estadão Conteúdo)

Vamos pensar nos fatos dos anos 90 pra cá. Os dois títulos do São Paulo colocaram o clube do Morumbi em outro patamar. Grêmio, em 95, e Cruzeiro, em 97, praticamente salvaram a década com a conquista da Libertadores. E o Vasco, que levantou a taça no ano do seu centenário? E o que dizer do Palmeiras, campeão com direito a eliminar seu principal rival? O próprio São Paulo renasceu com o título de 2005. Assim como o Inter, campeão em 2006 e 2010, o Santos, que sob o comando de Neymar reviveu seus dias de glória em 2011, e o “libertado” Corinthians, melhor em 2012. E teve ainda o Atlético-MG de 2013, aquele do “Eu acredito”.

Pois bem, os dados estão aí. Mas talvez o próprio Telê Santana não tivesse noção do tamanho do seu feito em relação à Libertadores. O torneio também era colocado de lado pelo treinador. Foi assim na primeira partida do São Paulo em 1992. Por priorizar o Paulistão, ele mandou um time praticamente reserva para enfrentar o Criciúma. Resultado: derrota por 3 a 0. Foi o único tropeço do Tricolor na fase de grupos daquela edição.

Sócrates, Telê e Zico Seleção Brasileira (Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo)Sócrates, Telê e Zico durante treino da seleção brasileira (Foto: Arquivo/Estadão Conteúdo)

Depois, em especial na Libertadores, o São Paulo jogou o mais belo futebol dos anos 90. Virou exemplo de gestão fora de campo e de organização dentro dele. Ninguém ousava contrariar o Seu Telê, que deu chute de trivela, com classe, naquela fama de pé-frio. Com um sorriso de orelha a orelha, à beira do campo, ele ainda viu o Tricolor do Morumbi desbancar os temidos Barcelona e Milan, nos Mundiais de 92 e 93, com categoria e uma pitada de sorte.

Mas a sorte, meus caros, acompanha os competentes. E competência Telê Santana tinha para dar e vender. Quem teve a chance de aprender com ele, se deu bem, como Muricy Ramalho, também ídolo do São Paulo, com os títulos brasileiros de 2006, 2007 e 2008. É a alma dessas duas épocas, dos anos 90 e dos anos 2000, que o Tricolor tenta reencontrar nos últimos anos.

Esta noite, aliás, os são-paulinos adorariam ter Telê à beira do gramado na altitude de La Paz. Ele certamente teria uma solução para voltar ao Brasil com um empate ou uma vitória sobre o The Strongest e a classificação às oitavas de final da Libertadores. Já está na hora de a torcida do São Paulo ter a chance de poder reverenciar novamente o seu Mestre.

“Olê, olê, olê, olê, Telê, Telê”…

muricy ramalho 1995 tele santana (Foto: Agência Estado)Telê Santana e Muricy Ramalho, na época em que trabalharam juntos no São Paulo (Foto: Agência Estado)