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Alexandre Lozetti
Catarse tricolor coletiva, da presidência à torcida, faz equipe dar volta por cima e chegar à semifinal da Libertadores. Na tática, na técnica, mas com muito coração
Há 78 dias, o cenário do São Paulo mereceu essa análise dura). No dia da publicação deste texto, dirigentes e gente da comissão técnica do clube mandaram mensagens. Foram surpreendentes elogios às críticas, o que provocou uma constatação simples: havia, internamente, noção do que precisava ser feito. Restava saber se havia competência para fazer.
Não falamos aqui só de futebol. Não adiantaria nada o currículo de Edgardo Bauza, bicampeão da Libertadores, sem uma diretoria firme em atitudes e compromissos, sem jogadores solidários.
Dois meses e meio depois, o São Paulo está na semifinal da Libertadores. Ainda sem a regularidade que se espera de um grande time, ainda com um projeto de futebol em formação, mas com uma catarse coletiva que envolveu a torcida e superou aspectos técnicos – o que, convenhamos, é bastante plausível num futebol irregular como o que é jogado no continente.
O São Paulo se reinventou. Poderíamos passar linhas e mais linhas falando sobre como as linhas de marcação recuaram excessivamente na “vitória-derrota” por 2 a 1 para o Atlético-MG (veja acima), no Independência, ou frisar a evolução de Marcos Rocha sem o acompanhamento de Michel Bastos no primeiro gol do Galo (veja abaixo)… Não se trata (apenas) disso.
O São Paulo está na semifinal porque aprendeu a sofrer, treinou para ser melhor na bola parada, pagou salários… Porque, jogando no lixo o texto que apontava o egoísmo, descobriu o que é olhar para o lado e sentir vontade de ajudar o sujeito que veste a mesma camisa.
Calma! Não pensem que a equipe não jogou futebol e se colocou entre os quatro da América unicamente graças à alma. O Patón aproveitou-se muito bem da eliminação no Paulista e das semanas que ganhou para trabalhar. Construiu um time que reage às maiores dificuldades, como dois gols da avalanche do “Eu acredito” em apenas 11 minutos. Que não perde o controle diante do medo da derrota. Que consegue ser quente e frio ao mesmo tempo.
Que se baseia em compactação, movimentos defensivos sincronizados e uma convicção muito forte no próprio jogo, a ponto de tirar Ganso para se classificar na altitude ou colocar um garoto de 21 anos, como Matheus Reis, para suportar a pressão do Atlético – e que valor teve esse menino, assustadoramente maduro e bem colocado para tirar bolas e mais bolas de sua área.
Maicon, o zagueiro que o departamento de futebol buscou da noite para o dia em Portugal, paralisou o que se desenhava um massacre. E daí por diante, o domínio atleticano foi enganoso. Acertou uma bola na trave, mas também levou outra. Buscou espaço e, principalmente no segundo tempo, não encontrou. Clayton teve chance, Calleri e Wesley também tiveram. O São Paulo soube jogar o jogo que se apresentou, o que não acontecia há até pouco tempo atrás.
Uma análise racional diz que o fim do jogo, exceto a maluca falta de Bruno nos segundos finais, foi mais brando do que se esperava. O Atlético não tinha mais gás para marcar, e o Tricolor pareceu até surpreso diante de tamanha liberdade.
Comentários mal-humorados dizem que o primeiro jogo foi ruim e que a atuação do São Paulo em Belo Horizonte foi digna de críticas. Discordo. Tanto no Morumbi quanto no Horto, os times competiram com suas armas, fizeram tudo pela vaga, num tipo de duelo que o São Paulo, invariavelmente, seria derrotado antes mesmo de começar, num simples olhar do adversário.
Não é mais assim. Era um time delicioso de enfrentar e duríssimo de torcer. Agora, é gostoso torcer pelo São Paulo. É difícil enfrentar o São Paulo. É a maior conquista do ano. Por enquanto.