Discordância com reforços, base e barreira com Bauza: a saída do diretor do São Paulo

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ESPN.com.br
Rafael Valente

Luiz Cunha ao lado do presidente Leco
Luiz Cunha ao lado do presidente Leco 

O pedido de demissão de Luiz Cunha do cargo de diretor de futebol São Paulo após três meses no cargo causou bastante surpresa nesta terça-feira. Em contato com a ESPN, ele disse que a decisão foi tomada por entender que haviam barreiras que o impediam de implantar uma gestão profissional e integrada com outras áreas do clube no departamento de futebol. Havia também discordância em relação aos reforças e à integração com a base.

O dirigente havia colocado como prioridade a contratação definitiva do zagueiro Maicon, emprestado até o final deste mês pelo Porto-POR, antes do acerto com qualquer outro reforço. A vinda do meia-atacante peruano Cueva com custo de cerca de 2 milhões de dólares o contrariou e acabou por levá-lo ao pedido de demissão.

“Se você tem um orçamento limitado e vai ao supermercado, qual é a sua prioridade? É comprar primeiramente alimentos se não você vai morrer de fome. Não é comprar um tênis moderno. Essa é a minha filosofia”, disse Cunha à reportagem.

O São Paulo informou à reportagem que não vai responder as declarações de Cunha. O único comunicado será via nota oficial já publicada.

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Confira abaixo a entrevista com ele:

ESPN – O motivo da sua saída foi uma divergência com o diretor executivo Gustavo Vieira de Oliveira pela contratação do Cuevas?
Luiz Cunha Gostaria de retificar o seguinte: a discordância não é pessoal. Tire o nome das pessoas. A discordância é conceitual. O meu entendimento é diferente do que estava ocorrendo no departamento de futebol. Eu queria mexer na estrutura do futebol do São Paulo de forma geral. A contratação e a integração da base são pontos, mas há outros. O que eu desejava não ocorreu. Eu estava me sentindo mal, amargurado e pedi demissão.

ESPN – Pode citar quais foram os pontos?
Luiz Cunha –
 Uma integração maior dentro do clube. O futebol do São Paulo é muito fechado. É preciso trazer para dentro dessa estrutura o departamento financeiro. Como você discute uma contratação sem consultar as finanças do clube? Se você tem um orçamento limitado e vai ao supermercado, qual é a sua prioridade? É comprar primeiramente alimentos se não você vai morrer de fome. Não é comprar um tênis moderno. Essa é a minha filosofia. Você precisa ter prioridades, traçar rumos de médio e longo prazo. Implementar uma gestão moderna. Eu tenho conceitos de gestão porque fui industrial. Trabalho com orçamento, com planejamento.

ESPN – O presidente Leco tentou evitar a demissão?
Luiz Cunha –
 O tempo todo ele tentou me demover dessa ideia. Ele me disse que via muito de mim nessa retomada do São Paulo na temporada, mas eu não posso trabalhar infeliz. Disse: ‘Você não está me deixando tomar as atitudes que devem ser tomadas’.

ESPN – O senhor não tinha autonomia?
Luiz Cunha –
Autonomia não é a palavra. Você pode falar em autoridade. É mais adequado.

ESPN – O senhor não tinha autoridade que o cargo exigia? Por exemplo, ao sugerir que a contratação de Maicon fosse priorizada neste momento?
Luiz Cunha –
 Disse que todos os esforços possíveis deveriam ser usados para o São Paulo trazer o Maicon de forma definitiva. Essa era nossa prioridade. Mas sempre há uma comodidade com o continuísmo. As pessoas já estão acostumadas a fazer a coisa de uma forma, não se sentem afetadas. É preciso sair de dentro da estrutura [do futebol] para ter uma visão macro, para entender o que você precisa, como pode se mexer e quebrar as barreiras. Eu defendia essa gestão integrada com outras áreas do clube.

ESPN – Teve interferência no trabalho do senhor?
Luiz Cunha –
Não. De jeito algum. Foi uma questão conceitual que levou a minha saída.

ESPN – O técnico Edgardo Bauza tinha alguma resistência ao trabalho do senhor, como por exemplo integrar jogadores da base ao elenco profissional?
Luiz Cunha –
 O Bauza faz um bom trabalho. Nem cheguei nele. As barreiras eram colocadas antes de chegar a ele. Vou citar um exemplo. Eu queria fazer uma reunião entre as comissões técnicas. Queria colocar na mesa o treinador da base e o treinador do profissional para que os dois conversassem. Assim, quando um menino fosse promovido ele já teria noção do que seria exigido dele, estaria a acostumado a jogar da forma como o técnico quer. Essa reunião não ocorreu.

ESPN – Foi vetada, desconsiderada?
Luiz Cunha –
Simplesmente não aconteceu apesar dos meus esforços.

ESPN – O presidente tinha resistência as suas ideias?
Luiz Cunha –
A posição dele era diferente da minha neste momento. Ele não discordava do que eu dizia, mas queria tempo, tempo para colocar em prática. Eu disse a ele que não tinha esse tempo. Sou um homem de ação. O presidente estava em nível maior, não fez vetos específicos ao que eu sugeri e tentei fazer.

ESPN – Como deixa o São Paulo?
Luiz Cunha – Com a sensação de trabalho bem feito. De missão em parte cumprida. De ter ajudado o São Paulo a se recuperar e sem qualquer mágoa ou bronca pessoal. Repito: foi uma divergência conceitual e por isso sai. Como dizem: a martirização é ocorte na própria carne para ver se a estrutura sente.