“Quero ficar no São Paulo por ser um grande clube, quero fazer história aqui”, disse o jogador à Gazeta Esportiva. Vindo de um período com poucas oportunidades com a camisa do Palmeiras, com a qual marcou apenas um gol em 23 jogos, o atleta condiciona sua evolução dentro de campo aos conselhos do técnico argentino Edgardo Bauza.
O jogador de 23 anos ouviu bem os conselhos do técnico Edgardo Bauza (Foto: Djalma Vassão/Gazeta Press)
“Ele é um treinador que não enrola jogador, ele fala as verdades, fala o que está acontecendo e pronto”, disse Kelvin, titular na equipe do Morumbi desde o dia 5 de abril, quando anotou um dos seis gols na acachapante vitória são-paulina por 6 a 0 sobre o Trujillanos, da Venezuela, pela Copa Libertadores da América.
No entanto, o atleta, hoje com 23 anos, precisou passar por uma fase de amadurecimento em Portugal, onde foi flagrado dirigindo sem carteira de motorista em 2013, na mesma semana em que chutou as garrafinhas de água do técnico do time B do Porto após ser substituído.
“Eu me sentia livre, era um momento em que eu não estava jogando lá, estava meio doido da cabeça”, lembrou Kelvin, amigo do ainda mais jovem Gabriel Jesus, a quem cobra uma dívida pelo triunfo sobre o ex-clube no Choque-Rei do último dia 29, pelo Campeonato Brasileiro.
Gazeta Esportiva – No Palmeiras, você chegou a ter momentos importantes sob o comando do Oswaldo de Oliveira, mas não teve tantas oportunidades com o Marcelo na sequência. Por que isso aconteceu?
Kelvin – Eu cheguei, me lesionei e fiquei três meses parado. Quando voltei, tive minhas oportunidades com o Oswaldo, que era um treinador que tinha muita confiança em mim, conversou comigo quando machuquei, falou que era pra eu ficar tranquilo que eu ia jogar. Fui titular com ele e a partir do momento que ele saiu do comando, eu também saí junto, saí do time titular. Aí o treinador novo chegou, começou a optar por outros jogadores e foi isso o que aconteceu.
Gazeta Esportiva – Houve algum problema de relacionamento com o Marcelo Oliveira? Como era a relação entre vocês dois?
Kelvin – Não teve nada demais, nunca briguei com o técnico, nunca discuti, até conversei com ele, perguntei o que eu precisava fazer, ele falava que eram as opções dele e eu sempre respeitei com trabalho. O elenco tinha grandes jogadores, tinha o Gabriel Jesus, o Dudu…é difícil, né. Era uma briga boa ali, o Rafael Marques também estava em uma boa fase, fazendo gols, o Cristaldo que entrava e fazia gols, então foi aí que o treinador viu que ele tinha que optar por esses jogadores.
Gazeta Esportiva – No Palmeiras a concorrência era maior?
Kelvin – A concorrência aqui também é grande, tem Centurión, Rogério, mas lá a concorrência era maior, eram mais jogadores e todo mundo tinha que jogar. Era um rodízio que faziam lá, e não tinham um cuidado especial com um jogador só pra falar ‘você precisa fazer isso, aquilo, porque você vai jogar e tal’. Não tinha isso. Se você tivesse bem, ia jogar, se não tivesse, ia ter que esperar. Aqui é diferente, o elenco é mais curto, então você precisa dos jogadores, daqueles que estão jogando e dos que estão no banco, uma hora eles vão ter que entrar.
Gazeta Esportiva – Você tem amigos no Palmeiras? Mantém contato com os jogadores da sua época?
Kelvin – Tenho, falo direto com o Gabriel Jesus, o próprio Zé Roberto, sempre converso com eles, o Rafael Marques, fiz amigos lá.
Gazeta Esportiva – Tirou um sarro deles depois do clássico – São Paulo venceu por 1 a 0 no último dia 29, pelo Campeonato Brasileiro – ?
Kelvin – Sim, fiz uma aposta com o Gabriel, ele vai ter que pagar um almoço, tá me devendo ainda (risos).
Gazeta Esportiva – Já no São Paulo você foi entrando aos poucos e agora é um dos principais jogadores do time. A que se deve essa evolução e qual o papel do Bauza nela?
Kelvin – Ele é um treinador que não enrola jogador, ele fala as verdades, fala o que está acontecendo e pronto. É isso, e você tem que aceitar e lutar pelo seu espaço. Foi isso o que aconteceu no início: eu cheguei achando que já tinha que ir pros jogos, ter meus minutos, e foi aí que ele me segurou um mês, um mês e meio, até joguei contra o Corinthians, mas ele viu que eu não estava bem, viu que eu não estava em forma e foi aí que ele foi me segurando, foi tendo calma comigo e eu não entendia isso. Hoje eu já entendo de outra forma, que foi ele que deu essa segurada, conversava comigo. Falei com ele umas duas, três vezes, perguntava o que eu precisava fazer e ele falava: ‘Oh, você não está bem nos treinos, não está bem fisicamente, precisa correr mais, precisa fazer isso e aquilo’. Foi aí que eu busquei evoluir.
Gazeta Esportiva – Em 2013, você foi detido em Portugal por dirigir um carro sem a carteira de habilitação. Como foi isso? Você se vê mais maduro agora?
Kelvin – Isso aí foi uma fase em que eu nunca tinha morado sozinho, fui com 18 anos pra Portugal. Aprendi muito também morando sozinho, mas eu me sentia livre, era um momento em que eu não estava jogando lá, estava meio doido da cabeça, querendo fazer tudo ao mesmo tempo, mas acho que a vida me ensinou, isso foi um aprendizado pra mim, tiveram as consequências depois disso, acho que aprendi muito e já sou um cara mais evoluído.
Gazeta Esportiva – Faltou orientação das pessoas ao seu redor?
Kelvin – Você sabe, quando a gente está sozinho achamos que podemos fazer tudo e quando as coisas acabam não dando certo você não ter uma pessoa por perto acaba achando que pode fazer as coisas, mas não é bem assim, então foi um momento de descuido que eu tive.
Gazeta Esportiva – No começo do ano, o São Paulo não era um dos cotados para estar entre os quatro melhores da Copa Libertadores da América. Inclusive, Palmeiras e Corinthians eram mais estimados. A vaga nas semifinais surpreendeu o elenco?
Kelvin – Desde o primeiro jogo da pré-Libertadores, contra o César Vallejo, acabamos empatando (1 a 1), foi aí que começou um pouquinho de desconfiança, mas acho que todo mundo sabia que o São Paulo tinha capacidade de mudar essa história, todo mundo se juntou e mudou essa história.
Gazeta Esportiva – Como foi o processo da evolução do São Paulo na temporada? É nítido que o elenco hoje é mais unido do que no começo do ano ou em 2015. Houve alguma partida em especial? Um pacto?
Kelvin – Cara, acho que foi mais o clima do Morumbi, começou naquele jogo do Trujillanos-VEN (6 a 0), tivemos uma boa atuação e sentimos o clima do estádio. Isso fez com que a equipe toda começasse a tirar um pouquinho mais de si pra seguir nessa pegada, então ali foi o início da reação.
Gazeta Esportiva – Por que o São Paulo se sente tão à vontade no Morumbi?
Kelvin – O Morumbi é um estádio histórico, né. O adversário que vem jogar no Morumbi já vem com o pé atrás, não tem como ser diferente. Por exemplo: eu estava no Palmeiras ano passado, nunca tinha jogado no Morumbi e você já vem com aquele frio na barriga e fala: ‘Pô, não vamos chegar lá e botar a moral’. É uma coisa diferente, para os adversários é difícil, pra nós é uma razão a mais de motivação. Saber que estamos representando um grande clube que é o São Paulo, sabendo que temos que representá-lo bem dentro de nossa casa.
Gazeta Esportiva – Continuar morando perto do CT ajudou a pular o muro?
Kelvin – Foi bom (risos). Não precisei fazer mudança, só mudei de portão. Estou bem adaptado na cidade, então está tudo certo.
Gazeta Esportiva – Eu imagino que a ansiedade está grande para a disputa das semifinais da Libertadores. Como vocês estão lidando com isso? O que a comissão técnica passa para o elenco?
Kelvin – Acho que agora já passou um pouco essa ansiedade pela Libertadores. A gente estava num espírito muito grande – até no jogo contra o Internacional, a gente estava com a cabeça meio longe -, mas agora estamos totalmente focados no Brasileiro, porque vai demorar ainda pra voltar a Libertadores, tem mais alguns dias. Acho que a gente tem que pensar só mais pra frente porque senão as coisas não dão certo. Queremos fazer uma boa campanha no Brasileiro e o São Paulo é grande pra isso, então podemos fazer boas atuações nos dois campeonatos.
Gazeta Esportiva – Prefere algum adversário em uma eventual final de Libertadores? Ou seria mais interessante conquistar o título em cima do Boca, em Bombonera?
Kelvin – Não, agora não tem preferência. Chegamos em um momento em que todos os times são bons e se passarmos agora o outro vai ser mais difícil ainda, independente de quem seja. O Boca é muito forte, mas o outro time chegou onde chegou não por sorte e sim por mérito dele, então sabemos que eles são fortes também. Nosso rival também é muito forte, todo mundo sabe disso e o São Paulo chegou aqui com muita força. A partir desse momento não tenho preferência por ninguém.
Gazeta Esportiva – Você está acompanhando o Atlético Nacional? O que você pode falar desse time?
Kelvin – O último jogo que eu acompanhei foi aquele contra o Rosario (vitória do Atlético Nacional por 3 a 1, pelas quartas de final), depois eu não vi mais nenhum outro, mas a equipe deles tem jogadores fortes fisicamente, dentro de casa tem uma força extraordinária. Só que nosso time dentro de casa também é muito forte, batemos clubes grandes dentro do Morumbi. Vão ser dois grandes jogos, não dá pra falar se o time deles vai jogar bem ou mal e é só lá que decide, a gente tem que estar bem tranquilo pra esse confronto.
Gazeta Esportiva – Deseja permanecer no São Paulo? A diretoria já te procurou pra renovar contrato ou até mesmo te adquirir em definitivo?
Kelvin – Não teve nada ainda, não teve conversa nenhuma, quero ficar no São Paulo por ser um grande clube, quero fazer história aqui, começando já neste ano, independente se eu volte pro Porto ou não. Estou feliz, me sinto bem, me sinto em casa, fui bem recebido por todo mundo, quero continuar aqui, sim, mas isso não depende só de mim, não depende só do São Paulo e não depende só do Porto. Quero seguir com minhas boas atuações, ajudando o São Paulo e se possível ganhando campeonatos importantes.
Gazeta Esportiva – Você e o Maicon falam na possibilidade de jogarem juntos no Porto, também?
Kelvin – A gente conversa normal, pergunta: ‘E aí, como é que está? ’ Ele fala que está em negociação ainda, que ninguém sabe o que vai acontecer. Só que de voltar pra lá eu não sei, a gente não pode criar expectativa de jogar junto lá. O Maicon é um grande jogador, todo mundo quer jogar com ele, é um jogador que passa confiança pra você, é um jogador que você sabe que tem sua técnica e que na hora de chegar firme ele também vai chegar. Então, se for pra jogar com ele aqui, ou se for pra jogar lá, vou ficar muito feliz.