De Pablo Escobar à receita recorde: o ressurgimento do Atlético Nacional

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GloboEsporte.com – Andrei Kampff e Mauricio Oliveira

Juan Carlos de la Cuesta, presidente do Atlético Nacional, da Colômbia (Foto: Mauricio Oliveira)Juan Carlos de la Cuesta, presidente do Atlético Nacional, da Colômbia (Foto: Mauricio Oliveira)

Presidente mais jovem da história do Atlético Nacional de Medellín, Juan Carlos de la Cuesta assumiu o posto em março de 2010 com apenas 36 anos, depois de um longo período como gerente financeiro e administrativo do clube.

Hoje, seis anos depois, está perto de conquistar o segundo título da Libertadores da história do Verdolaga (foi campeão em 1989), mas desta vez sem a suspeita de financiamento do narcotraficante Pablo Escobar, morto em 1993. Para isso, precisará passar pelo São Paulo na semifinal e, depois, por Boca Juniors (ARG) ou Independiente del Valle (EQU) na final.

Para o bem e para o mal, Cuesta talvez seja o melhor símbolo da gestão empresarial estabelecida no Nacional a partir de 1996, quando o clube foi vendido à Organización Ardila Lülle (OAL), do bilionário Carlos Ardila Lülle.

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Nos últimos seis anos, Atlético Nacional conquistou nove títulos

Cuesta afirma que cumpre leis nacionais e internacionais com “gestão sólida e estratégica”, admite que detém a maior receita entre os clubes do país e, principalmente, conta com a força de um conglomerado que inclui veículos de mídia (RCN Television, Radio, Cine e Novelas, entre outras), fabricantes de bebidas, empresas de agroindústria e automóveis, além de esportes (como o próprio Nacional) e grandes parceiras multinacionais.

Com essa força financeira e Cuesta na presidência nos últimos seis anos, o Nacional conquistou nove títulos (sendo cinco Ligas Nacionais, duas Copas da Colômbia e duas Superligas), finalizou e inaugurou um CT de US$ 3 milhões (cerca de R$ 10 milhões) e viu saltar a receita anual de US$ 8 milhões para US$ 25 milhões. Pode-se dizer que o Verdolaga, time de maior torcida da Colômbia, é a “empresa” mais popular do grupo. É nesta empresa que Cuesta está inserido.

Ele recebeu a equipe do Globo Esporte em sua sala na sede administrativa do Nacional, em Itagüi, cidade da região metropolitana de Medellín.

GloboEsporte.com: Qual foi a grande qualidade deste Nacional na formação do time que é apontado, agora, como candidato ao título?
Juan Carlos de la Cuesta:
É bom saber que estamos sendo reconhecidos, é gratificante para o nosso plantel. Ter o Atlético Nacional nesta fase da Libertadores e entre os favoritos é uma honra para os jogadores e para o corpo técnico. Creio que o segredo foi ter feito um direcionamento, uma planificação estratégica que serviu para orientar todo o trabalho. Procuramos ter o máximo de transparência possível para atrair a torcida e construirmos o melhor do futebol com uma seleção de bons jogadores e com um corpo técnico competente. Essa metodologia de trabalho é a base de tudo.

 Estamos trabalhando há mais ou menos dois anos com este objetivo (conquistar a Libertadores).
Juan Carlos de la Cuesta,
presidente do Atlético Nacional

O técnico Reinaldo Rueda diz que desde o início do ano a prioridade estabelecida foi a Libertadores.
Sim, estamos trabalhando há mais ou menos dois anos com este objetivo porque conquistamos este título há muito tempo (em 1989) e creio que é o que querem todos os torcedores do clube. E acreditamos que podemos atingir agora, apesar de sabermos bem que vamos enfrentar um grande São Paulo de um treinador vitorioso, que sabe jogar este tipo de competição.

Nestes seis anos em que você está na presidência, a receita do Nacional saltou de US$ 8 milhões para US$ 25 milhões. O que tem feito para alcançar esses números?
O mesmo que foi feito para montar as equipes no departamento de futebol. Ter um direcionamento estratégico claro, definir quais são os horizontes e as metas que podemos alcançar a curto, médio e longo prazo. Dar à torcida tudo o que queremos para nossa equipe, que é um produto de qualidade com sustentabilidade. Vemos que muitos clubes no mundo e na Colômbia sobem e descem rapidamente a cada temporada, não queremos isso. Queremos manter o clube sólido, sempre acima, com uma boa equipe, atraindo os torcedores, fazendo com que eles invistam no clube e o clube tenha mais poder de investir e manter uma boa equipe a cada ano. Se estabelecermos este círculo virtuoso vamos ter melhores audiências, venderemos mais ingressos, teremos mais dinheiro de patrocinadores e parceiros e tudo isso será investido novamente no clube.

A receita de US$ 25 milhões é a maior da Colômbia, não? Além disso o clube pertence a um grupo que detém outras grandes empresas de vários ramos.
Bem, primeiramente, sim, creio que é a maior receita entre todos os clubes da Colômbia. Mas é importante dizer que ainda estamos igualando receita e despesas e não pedimos dinheiro ao grupo (OAL) desde 2011, como acontecia antigamente. E temos reinvestido esta receita no Atlético Nacional de maneira sustentável. Isso é fundamental para uma gestão saudável.

Davinson Sánchez Atlético Nacional (Foto: Divulgação)Davinson Sánchez foi vendido, mas jogará a semi da Libertadores pelo Atlético Nacional (Foto: Divulgação)

O São Paulo tem receita de aproximadamente quatro vezes a do Nacional. Como equilibrar as forças?
Este assunto é sempre conversado com nossos jogadores. Superamos a diferença de poderio financeiro com a vontade de ganhar, com os sonhos. Desde o início, deixamos claro que teremos a Libertadores, por exemplo, como a melhor vitrine sul-americana, competindo com equipes internacionais que darão uma projeção global, mundial. Nós acreditamos que podemos competir igualmente e ganhar algumas vezes com essa confiança e com a competência do nosso corpo técnico e dos nossos jogadores.
(Nota da Redação: a receita do São Paulo em 2015 foi de R$ 330,8 milhões, ou US$ 101 milhões pela cotação da última quarta-feira – ou seja, valor quatro vezes superior ao apresentado pelo Atlético Nacional)

O Nacional por pouco não se desmanchou nessa paralisação da Libertadores. Alguns jogadores foram vendidos, como o zagueiro Davinson Sánchez (para o Ajax-HOL), mas ficarão até o fim da participação do Nacional na Libertadores (dos titulares, só o atacante Copete saiu, já que Ibarbo havia sido barrado antes).
Para a gente foi algo muito atípico ter de suspender o torneio no meio, questionamos, queríamos que a Libertadores seguisse sem paralisação, mas esta é a nossa realidade. E o mercado internacional tinha um interesse muito grande por nossos jogadores.

Como foi a negociação para manter os jogadores já negociados? E o risco de o rendimento desses atletas despencar?
Chegaram propostas por dez jogadores da nossa equipe, mas deixei claro para os clubes e para os jogadores que teríamos de vender aos poucos porque não poderíamos desmontar o time e precisávamos dar sustentabilidade à equipe, trazendo reposições de qualidade. Então, fomos consultados e apresentamos as condições. É difícil porque sabemos que alguns jogadores ficam com a cabeça no outro clube, mas tenho certeza de que eles mantêm a sede de conquistar a Libertadores.

Atlético Nacional recebeu propostas por dez jogadores durante a Libertadores. Alguns já foram negociados, mas jogarão a semifinal

Você sente que os jogadores ficaram satisfeitos com o que foi acordado?
Sim, sentimos da mesma forma. Não é fácil, mas o panorama é este e o acordo foi uma maneira de solucionarmos isso. Creio que eles querem o título tanto quanto aqueles que não vão sair.

Alguns jornalistas de Medellín falam em valores extraordinários em algumas propostas, como 9 milhões de libras (quase R$ 40 milhões) do Manchester City (ING) por Marlos Moreno. Dizem que o Ajax pagou 5 milhões de euros (cerca de R$ 18 milhões) por Davinson Sánchez. Qual a porcentagem que cabe ao Nacional dessas negociações?
Bem, primeiro, realmente há o interesse do Manchester City, fomos procurados, mas não são essas cifras de 9 milhões de libras. Quem dera que fosse! Conversamos há um tempo e temos acordo de cooperação entre os clubes. E por Sánchez há um acordo, ele já foi apresentado no Ajax, mas também não estão certas as cifras que comentam. Sobre a parte de cada um… Os intermediários da negociação basicamente ficam com 10%, 15%, valores de mercado como comissão, que são importantes até para que eles tenham nosso clube como plataforma de carreira de seus jogadores. Os clubes que nos vendem os jogadores também ficam com algumas porcentagens porque sabem que podem lucrar no futuro, assim como alguns atletas recebem sua parte. Nós apenas respeitamos essas porcentagens de cada um.

Montagem Atlético Nacional e Pablo Escobar (Foto: Editoria de arte)Narcotraficante Pablo Escobar esteve diretamente ligado à administração do Atlético Nacional

O Nacional tem uma gestão empresarial há 20 anos, mas nem sempre foi assim. Qual foi a real relação entre Pablo Escobar e o Atlético Nacional nas décadas de 80 e 90?
É melhor perguntar para os responsáveis pelo clube nas ocasiões (risos). Não tenho como dizer qual foi a relação porque não estava aqui. Não sei qual o grau de interação que Pablo Escobar tinha com o clube e a única coisa que posso falar é que a organização do grupo econômico que comprou o Nacional em 1996 é uma empresa transparente, cumprindo e respeitando todas as leis nacionais e internacionais nesses 20 anos.

Quanto foi investido na construção do centro de treinamento de Guarne (tem quatro campos com dimensões oficiais, alojamentos, é compartilhado com as categorias de base e deve ser inaugurado em agosto o centro de alto de rendimento)?
Cerca de US$ 3 milhões, mais ou menos.

Quais são as maiores fontes de receita do Nacional?
Bem, vou falar os valores aproximados em dólar para facilitar o entendimento. No ano passado, foram US$ 25 milhões, sendo US$ 3 milhões de publicidade, US$ 5 milhões merchandising, US$ 7 milhões de bilheteria, US$ 9 milhões com venda de jogadores, infelizmente, e mais a grande parte da TV que é de… US$ 1 milhão!

US$ 1 milhão por toda a temporada?
Sim, este valor é igual para todos os clubes. Os principais clubes da Liga recebem este valor e quem sobe da divisão inferior ganha um pouco menos. É isso que precisamos ajustar, é muito pouco, quase nada. Não vejo justiça, tampouco lógica. Mas, agora isso, neste ano a expectativa é de chegarmos a US$ 33 milhões de receita total.

CT do Atlético Nacional, da Colômbia (Foto: Mauricio Oliveira)CT do Atlético Nacional em Guarne, cidade próxima a Medellín, na Colômbia (Foto: Mauricio Oliveira)