O zagueiro Julio Santos viveu todos os lados do futebol. Foi revelado com Kaká no São Paulo, serviu seleção brasileira de base, jogou na Europa – com futuras estrelas do futebol mundial – e até na África antes de chegar ao Novo Hamburgo-RS, que disputa a Série D do Campeonato Brasileiro.
Aos 35 anos e com vontade de garoto, ele acredita que tem muita lenha para queimar dentro dos gramados.
“Se eu continuar nesse nível por mais três anos está de bom tamanho. Depende da minha forma física e dos clubes que jogarei no futuro porque algumas lesões atrapalham minha carreira. Ao contrário do que as pessoas pensam, a Série D é um campeonato muito difícil, são as melhores equipes dos estaduais”, contou o defensor, ao ESPN.com.br.
Como sabe que a carreira de jogador é curta, ele já projeta o que irá fazer quando se aposentar.
“Eu tenho uma quadra de futebol society com meu sócio em Osasco. Eu estava cursando contabilidade e parei, mas vou começar a fazer educação física. Quero ser treinador no futuro, acho que tenho perfil legal. Quem sabe possa ajudar uma base de clube como o São Paulo.
“Aprendi muitas coisas aqui e fora do Brasil. Eu voltei faz oito anos e nada mudou. O futebol infelizmente não evoluiu aqui”, lamentou.
REVELADO COM KAKÁ
Criado em Osasco, o zagueiro passou por escolinhas da cidade e pelo Pequeninos do Jockey, antes de chegar ao São Paulo, em 93. No clube do Morumbi fez todas as categorias inferiores ao lado de Gabriel, Julio Baptista, Fábio Simplício e Kaká. Foi campeão da Copa São Paulo de futebol júnior, em 2000, e no ano seguinte subiu ao profissional.
“Foi muito marcante porque nossa geração ganhou tudo na base e pudemos jogar juntos no time de cima, algo muito difícil no futebol. Tive a chance de jogar um Mundial sub-20 pela seleção brasileira ao lado do [ex-atacante] Oliveira, foi a realização de um sonho. Lembro que chorei a primeira vez que vesti a amarelinha de tanta emoção”, comemorou.
Mesmo tendo saído do Tricolor em 2003, ele manteve vínculo com os ex-companheiros. “Esses caras são meus amigos até hoje, nos falamos sempre. Neste ano, fui treinado pelo Oliveira no Batatais na Série A2 do Paulista e joguei com o Simplício. Matamos as saudades”.
“O São Paulo me ensinou a ser um homem de verdade. Devo tudo ao clube. Além do futebol, sempre me deu auxilio fora de campo. Eu era da periferia e conheci as coisas boas da vida e isso fez muito bem para minha cabeça”.
EUROPA E MAZEMBE
Após sair do Morumbi, o zagueiro passou por Paysandu, Goiás, Vasco e Portuguesa até chegar ao Le Tours, time da segunda divisão francesa na temporada 2008/2009. Na Europa, ele atuou ao lado de jogadores que fariam sucesso no Arsenal-ING e seriam vice-campeões da Euro 2016.
“Eu joguei com Koscielny e o Giroud. Eram grandes promessas e hoje são duas realidades, fico muito feliz em ver aonde eles estão. Quando cheguei era o grande atleta para eles. Agora, é ao contrário (risos)”, comentou.
Julio lembra que o atacante foi apelidado de BMW pelos brasileiros da equipe. “Ele era o cara mais bonito do elenco, é o Beckham da França. A gente falava que ele era igual carro de luxo, aonde chegava todo mundo ficava olhando (risos)”, gargalha.
Ele também ajudou o zagueiro a deslanchar na carreira. “Os diretores me perguntaram com qual defensor do elenco eu preferia fazer dupla. Tinha ele e mais dois concorrendo, mas eu disse na hora: ‘O Koscielny é excelente. Pode colocar de titular que nós vamos nos dar muito bem e ele vai brilhar’. Acertei em cheio! Hoje vendo ele jogar a Eurocopa, dá pra ver que eu tenho um pouco de olho clínico para ser treinador (risos)”, brinca.
Após passar duas temporadas e ter uma transferência para o Auxerre-FRA desfeita por conta de uma lesão, ele retornou ao Brasil. “Eu achei que voltaria bem, mas não joguei no São Caetano. Depois disso, fiquei desempregado de 2010 até janeiro de 2011”.
Foi então que ele recebeu um inusitado convite do Mazembe, da República Democrática do Congo. A equipe havia vencido no ano anterior o Internacional na semifinal do Mundial de Clubes.
“Fui o primeiro brasileiro a jogar por lá. Pessoal ama o nosso futebol. O auxiliar técnico ganhou uma camisa do Inter e ia para o treino sempre com ela. Eles davam muito valor para essa partida”.
Com as muitas dificuldades que enfrentou no país e no clube, sua passagem durou apenas três meses.”Lá um lugar muito complicado, só quem conhece sabe como é”.
Julio ficou oito meses parado, algo que seria comum entre 2010 e 2013, quando ele só passou nove meses em algum clube. “Foi o pior momento da minha vida. Só não trabalhei fora da minha área porque soube administrar o poquinho que ganhei e segurei essa época difícil”.
Apesar das reviravoltas na carreira, o zagueiro não reclama ou demonstra mágoas. “Eu me sinto bem realizado por ter jogado em grandes clubes e nas seleções de base. Conheci o mundo pelo futebol. Talvez se tivesse jogado mais logo que voltei da Europa eu poderia hoje estar num nível maior, mas Deus sabe o que faz”, concluiu.