Antes do texto, uma premissa: Ricardo Gomes está engrenando agora, apesar de haver cometido erros. Se o São Paulo o mantiver no comando, estará apostando no desenvolvimento de um trabalho. Não vejo como um erro.
Eu defendi aqui que Rogério Ceni não deveria começar sua carreira de treinador na base do São Paulo. No momento, graças à excelência do trabalho realizado por André Jardine, seria sua definição como substituto do atual comandante (Jardine é mais que um treinador) seria bom apenas para Ceni. Não para o São Paulo. Também é difícil que seja auxiliar de Ricardo Gomes. Seu nome seria gritado nas arquibancadas ao primeiro mau resultado. Fora, Ricardo, Viva Ceni. Puta que pariu, é o melhor técnico do Brasil. Uma situação horrível para Gomes e para Ceni.
Incoerência, então, dizer que ele tem condições para assumir o time profissional. Incoerência, sim. Evidente incoerência, mas há argumentos que possam justificá-la.
1) O mau momento do time – Na verdade, falar em momento é uma fidalguia. Omomento do São Paulo se inicia em 2009. Está mais próximo de uma década do que de um lustro. E vai piorando. Em 2010, Ricardo Gomes foi demitido porque o time caiu na Libertadores contra o Inter, na semifinal, por conta do valor diferenciado do gol fora de casa. O que foi causa de demissão, hoje seria caso de estátua. Ou de orgulho. Desde então, em 2013 e 2016, o clube namorou com o rebaixamento. Houve trocas incessantes de treinadores. Não é chegada a hora de um fato novo? E qual fato novo mais impactante do que Ceni?
2) Final de ano – Se assumisse o São Paulo, Ceni encontraria um time que teve um ano horrível, tanto com Bauza como Ricardo Gomes. O argentino levou o time à semi da Libertadores, mas futebol que é bom, eu não vi. No frigir dos ovos, o rendimento anual beira 50%, o que é ridículo para o São Paulo. Então, a cobrança sobre Ceni seria apenas – e é gigantesca – aquela relacionada com a história do gigante. Não com o momento. Início de ano, time ruim, vindo de um ano péssimo. Hora de reconstrução. Ninguém poderá cobrar de Ceni um futebol que não se vê há tempos. Haveria, pelo menos, um semestre de boa vontade com o grande ídolo.
3) Dívida com Ceni – Um clube é maior do que seus ídolos. De todos os seus ídolos reunidos. A entidade é a depositária do amor e não o jogador. Mesmo assim, sendo tão maior do que Ceni, o São Paulo deve a ele. Por tudo o que ele fez, por tudo o que ele representa, o São Paulo deve a ele a oportunidade de uma nova carreira dentro do clube. Como treinador, como administrador, de alguma forma. Ceni não poderá nunca dirigir Palmeiras ou Corinthians, onde é odiado com a mesma intensidade com que é amado pela grande maioria da torcida tricolor. O desejo de Ceni não é uma ordem, mas é um desejo de Ceni, o maior jogador da história do clube. Embora, a meu ver, nem seja o maior goleiro da história do clube.
4) Ausência de opções – Um novo treinador estrangeiro? Jovens ascendentes como Guto Ferreira, Milton Mendes ou Eduardo Batista? Veteranos como Abel Braga ou Luxemburgo? Respeito a todos, mas não vejo nenhum como um nome natural, como alguém que não traga dúvidas, uma certeza de resultado imediato.
5) Capacidade de Ceni – O passado de Ceni o condena a ser um ótimo treinador. Sempre foi um jogador obcecado pelo sucesso. Ao contrário dos gênios, não deve o sucesso a um dom. O trabalho vem antes. Sempre foi um capitão presente, sempre participou de decisões. Mas não vive do potencial. Tem estudado para ser treinador. Foi à Europa fazer cursos. Não será um treinador ”boleirão”. Mesmo porque não foi um jogador ”boleirão”. Está pronto como técnico? Lógico que não. Ninguém está, muito menos ele ainda que nem estreou na profissão. Mas está pronto para começar a carreira. E, sendo quem é, por que não pensar que será uma carreira de sucesso? Será uma aposta sem riscos para o São Paulo.