Não é só o futebol inglês que, nos últimos anos, perdeu aquele rótulo do jogo feio baseado em cruzamentos para grandalhões. Os ingleses também estão mais dóceis e flexíveis. Basta ler o que pensa Michael Beale sobre futebol. Estudioso a ponto de ter publicado nove livros sobre métodos de treinamentos, o auxiliar de Rogério Ceni no São Paulo investe no lado humano.
Há quase dois meses no Brasil, Beale é o braço-direito do ídolo tricolor, que assume sem qualquer pudor tê-lo convidado para suprir sua inexperiência no primeiro emprego como técnico. Eles montam os treinos, o sistema de jogo e suas variações, mas também se preocupam em criar um laço mais íntimo com cada jogador. É nesse relacionamento que Beale acredita poder melhorar o Tricolor.
– Eu acho que vemos os melhores técnicos nas conversas individuais, não no campo. O relacionamento individual é a coisa mais importante no futebol – disse o britânico.
Beale, de 36 anos, também é gentil com os jornalistas. Desculpou-se por ainda não conseguir dar entrevista em português. Ele garante que o linguajar do campo é o menor dos problemas, mas ainda não se sente à vontade para falar publicamente no idioma. Tudo bem. Em seu carismático português, mandou uma mensagem à torcida do São Paulo. E em bom inglês, com forte sotaque britânico, ele deu o recado que os tricolores queriam ouvir:
– Temos grandes ambições. Podemos ir muito longe.
Conheça melhor o auxiliar de Rogério Ceni:
GloboEsporte.com: Por que você trocou um trabalho de prestígio com os jovens do Liverpool por essa aventura no futebol brasileiro e no São Paulo?
Michael Beale: Aquele trabalho já havia me desafiado o suficiente. Eu queria aprender um segundo idioma. Meus pais vivem na Espanha e falam espanhol perfeitamente, minha irmã também. O Brasil e a América do Sul produzem os melhores jogadores. Nos principais times das principais ligas, os destaques são sul-americanos. Trabalhar com jovens brasileiros, numa liga diferente, num time principal, uma série de desafios que me faz acordar toda manhã e sair da cama. Eu não viria para qualquer clube no Brasil, vim para o São Paulo, que é similar em tamanho e estrutura ao Chelsea e ao Liverpool.
E qual foi a influência do Rogério Ceni na sua decisão?
Rogério e eu nos tornamos grandes amigos, temos a mesma energia de futebol. Ele estava muito animado por ter minha ajuda, e eu com o projeto. Tenho uma família jovem, dois filhos de três e cinco anos. Eu procurava uma oportunidade para sair da Inglaterra. Há cinco ou seis anos, conheci o Alexandre Pássaro (advogado do São Paulo). No ano passado, ele me disse que o Rogério estava indo para a Inglaterra e perguntou se ele poderia ver treinos. Passamos três horas falando de futebol, temos um senso de humor parecido. Não somos pessoas sérias, gostamos de relaxar. Nós trabalhamos duro, mas fora de campo gostamos de aproveitar a vida.
Essa não é a imagem que a maioria das pessoas tem do Rogério…
Ele é muito parecido com o Mourinho. As pessoas acham que é um cara muito sério, mas fora das câmeras é completamente diferente. O Kenny Dalglish (escocês, ídolo do Liverpool como jogador e técnico) é igual: um ídolo, ícone do futebol, mas uma personalidade maravilhosa. Quando visitei o São Paulo em novembro, fomos ao casamento do Pássaro e voltamos cantando no carro, Rogério e eu. É que o gosto musical dele é diferente do meu. Ele ouve Elvis, AC/DC…
No futebol, os gostos são mais parecidos?
Temos uma boa amizade e um grande respeito mútuo. Mas, se eu sentisse que ele não estava pronto, eu não teria vindo. Eu não vim aqui só por causa do idioma, mas sim para me colocar numa posição de desafio verdadeiro. Acho que o mais bonito e especial que uma pessoa pode ter é falar idiomas diferentes. Tive sorte de ter, no Chelsea, muitos bons técnicos: Hiddink, Ancelotti, Scolari, Mourinho, Villas Boas e Di Matteo. No Liverpool, o melhor foi Jürgen Klopp, assim como Brendan Rodgers. Todos esses caras falam um segundo idioma. OK, se eu ficasse na Inglaterra poderia ser um bom técnico numa liga menor, mas sou jovem, tinha que sair.
Qual sua visão do São Paulo?
O centro de treinamento é adorável, muito calmo. Cotia é um lugar incrível para desenvolver jogadores. Uma das paixões minha e do Rogério é essa ponte para trazer mais jogadores e ter a certeza de que possam fazer uma grande história no São Paulo antes de serem vendidos. A pré-temporada nos Estados Unidos foi importante. Primeiro porque eu pude falar inglês (risos), e pelas três semanas com jogadores e comissão técnica fora da cidade. Pude conhecê-los, mostrar meu trabalho. Temos um grupo jovem e faminto, uma comissão técnica faminta também, é uma boa mistura. Crescemos todos os dias. Precisávamos de uma ou duas contratações, e a diretoria e o presidente foram fantásticos trazendo Lucas Pratto e Jucilei. Não competimos financeiramente com outros clubes, mas eles nos deram boas chances.
Como está o São Paulo neste momento, em relação ao que você considera ideal?
Nós criamos um estilo, queremos ser mais ofensivos e deixar as pessoas animadas em virem nos ver jogar. Queremos pressionar. O calendário no Brasil é muito difícil, tivemos quatro jogos em 10 dias. Ganhamos três, empatamos um, e vejo a mídia comentar que sofremos muitos gols. Mas também marcamos, e isso anima as pessoas a nos verem jogar. Temos só quatro semanas e estamos num caminho diferente dos últimos técnicos.
O avião está subindo, estamos tentando colocar tudo no lugar, muito satisfeitos com essa primeira parte, e trabalhando duro para melhorar. Tentamos usar todo o grupo porque nosso estilo de jogo de pressão é muito físico, enérgico, queremos que a torcida se sinta assim ao nos assistir. É o primeiro trabalho do Rogério, a minha primeira vez no Brasil. Estou muito satisfeito neste momento, mas temos grandes ambições.
Quão longe esse avião pode voar?
Acredito que o grupo da morte no Paulista seja Santos, Ponte Preta, Mirassol e Audax. Nós jogamos contra esse grupo. No fim de três rodadas, todos eles tinham pontos. O Santos não terá que jogar contra esses times, nós tivemos, acho que o Santos tem muita sorte por isso. Temos um novo técnico, uma nova comissão, ainda esperamos o Jucilei, o Pratto acabou de chegar, o Wellington Nem, que é protagonista, não pôde ser usado além de alguns minutos contra o Audax. Se não tivermos lesões, podemos ir muito longe. Sem grandes previsões porque temos de ser humildes, mas temos grandes ambições.
Você tem nove livros publicados sobre treinos, exercícios, métodos. Não poder aplicar tudo isso em razão do calendário apertado que os obriga a restringir os treinos para preservar os jogadores é frustrante?
Um pouco. A pré-temporada foi importante para implantar o estilo de jogo. Sem imprensa, sem pessoas assistindo. Tivemos grandes testes contra River Plate e Corinthians. Vamos ser mais fortes na defesa, mas criamos muitas oportunidades. Fizemos 15 gols, mas poderíamos ter feito 40. Agora temos de ser muito cuidadosos nos treinos, com um ou dois dias entre cada jogo. Ficamos um pouco frustrados, é claro, mas acredito que estamos num bom caminho. Todos tentamos criar um ambiente para que as pessoas sejam felizes, se divirtam no trabalho.
Quanto tempo do dia você passa com o Rogério? Ele deixa você em paz?
(em português) Na semana passada, foram 12 horas todos os dias. Mas minha família chegou, então agora são no máximo seis horas (risos). (novamente em inglês) Nós trabalhamos muito duro e dividimos o trabalho entre toda a comissão técnica. Não há um super-homem aqui. O Rogério é o técnico, eu e o Pintado somos os assistentes, mas tudo é dividido, assim como nos treinamentos. Colocar o Luiz Araújo no banco para entrar no intervalo contra o Santos foi uma boa decisão, que só foi tomada porque não estávamos cansados, vivemos aquele momento com clareza. Mas passamos muito tempo juntos. Nos Estados Unidos, cada um dormia quatro horas. Um bom exemplo é a fé que mostramos no Junior Tavares. Quando o levamos para a viagem, ele fez uma boa pré-temporada, mas não o suficiente para começar o ano como titular. Mas voltamos, demos oportunidade, e agora ele merece elogios.
A performance dele é surpreendente?
Não, porque em novembro, quando o vi jogar no time sub-20, Rogério e eu decidimos que ele jogaria conosco. Precisamos de tempo para integrá-lo ao time principal porque, no sub-20, ele é um dos mais velhos, mas a pressão de jogar no Morumbi com 50 mil pessoas é diferente. A pressão da imprensa é intensa. É similar à Inglaterra, mas aqui dá entrevista no intervalo, no fim do jogo. Lá nós protegemos os mais novos. O Junior outro dia estava no sub-20 e agora está assinando camisas dos torcedores.
É preciso ter uma personalidade muito forte, não?
Esse é o momento em que temos de trabalhar com ele e com todos os jovens. O Luiz Araújo fez dois gols e um grande trabalho contra o Santos, agora é a hora de trabalhar. Temos que lembrar constantemente aos jovens que nossas ambições são muito grandes. É lindo ganhar do Santos fora de casa. Para mim, um inglês, a primeira vitória do Rogério num clássico, a primeira do São Paulo lá depois de sete anos. Fantástico! Mas não é tudo, é só uma pequena conquista dentro de um plano maior.
O São Paulo muda sua formação durante os jogos. É importante ter essa variação?
Temos mais de um plano de ataque e mais de um plano de defesa. Sem contar o segredo, porque é o que nos permite ser o que somos (risos), nós temos uma estrutura muito sólida que nos permite mudar uma ou duas coisas que mudam tudo. Gostamos de ver o jogo em duelos de 1×1, 2×2, 3×3, e as decisões que tomam. Porque o 11×11 é um monte de pequenos jogos. São 2×2 ali, 3×3 aqui. Trabalhamos esses momentos. Mas é verdade, mudamos bastante. Queremos ser muito flexíveis, mas permitir que no próximo jogo saibamos exatamente o que devemos fazer. Rogério e eu passamos horas falando sobre isso, somos apaixonados, embora os jogadores ainda não saibam de tudo porque temos só seis semanas de trabalho.
É nessas conversas que surgem os treinos diferentes?
Estaremos sempre inovando e criando para os jogadores. Todo dia os treinos e exercícios são diferentes, mas a comunicação é muito similar. Acho que esse é o futuro do futebol, ser muito flexível, talvez jogando de uma forma no ataque e de outra na defesa. Para mim, o futebol é eu contra você. Se cada jogador pensar em vencer seu oponente direto, sete vencem, 11 vencem, então vencemos o jogo na maioria das vezes.
Como vocês conseguiram mudar a maneira do São Paulo jogar em pouco tempo?
Rogério e eu temos paciência, mas não temos paciência, me entende? Temos paciência para desenvolver um jovem porque sabemos que isso leva tempo, mas queremos ganhar cada jogo. Entramos no jogo com um ponto, então esse é o mínimo que temos de levar. Para nós, era importante mostrar no primeiro jogo, mas não funcionou (derrota por 4 a 2 para o Audax). Contra Ponte Preta e Santos, nós fizemos, queremos mostrar a todos as mudanças. A primeira parte era criar mais, fazer mais gols, criar mais energia, ter a bola.
Só há uma bola em campo e queremos que ela seja nossa. Um jogo muito coletivo. São 11 jogadores, 11 mentes, mas um só coração, juntos, defendendo e atacando, com espírito. Queremos laterais que ataquem, meio-campistas que ataquem. E ao mesmo tempo temos jogadores como João Schmidt, Cícero e Cueva, que são importantes porque nos fazem ter posse de bola.
Logo depois de cada jogo, o Rogério cita o percentual de posse de bola. Isso é muito importante para vocês?
Sim. Nós dominamos a posse em todos os jogos, menos contra o Santos porque vencíamos por 3 a 1 a 20 minutos do fim. Não precisávamos, o Santos tinha a bola. Decidimos esperar e o Gilberto quase fez 4 a 1. Talvez, eles só tenham tido mais posse de bola na parte final. A cada jogo controlamos a posse, tentamos correr mais, pressionar. Futebol é sobre fazer mais gols, não podemos nos esquecer que o futebol brasileiro é criar, atacar e fazer gols. Hoje temos Cueva, Pratto e Gilberto com três gols, Luiz Araújo e Chavez com dois. Isso é bom.
Mas imagino que melhorar a defesa, sofrer menos gols, seja uma preocupação de vocês.
Os gols têm sido em erros individuais. Contra o Audax, o segundo da Ponte Preta, os do Mirassol, São Bento. Isso não é tático. Sofremos um gol num escanteio (contra o São Bento), então nisso podemos melhorar a organização. O erro individual pode ser cansaço ou por pedirmos aos jogadores que sejam muito agressivos. É difícil ser e ter controle ao mesmo tempo. A primeira coisa é que sejam agressivos, joguem com paixão e energia. Agora temos que melhorar um pouco a tomada de decisões. O David Luiz defende com essa energia. Quando a decisão tomada é boa, ele é o melhor defensor da Inglaterra. Quando é ruim, a mídia diz que ele é o pior. Nem uma coisa nem outra. Todo o time defende, não só os zagueiros e o goleiro. Todo o time precisa melhorar.
Num texto, você se referiu ao Cueva como “pequeno mágico”. Ele o impressiona?
Ele me impressiona muito. Esse cara tem três gols e três assistências em seis jogos, mas sem jogar todo o tempo. O número de gols e assistências por minuto é muito alto. E a razão dele não ter jogado todos os minutos é porque queremos preservá-lo para mais jogos. É similar ao Cícero, um jogador importante porque consegue controlar o jogo em diferentes caminhos. Os dois são mágicos para mim. Um controla na construção e outro na criação. Temos bons jogadores aqui, para quem posso usar outras palavras. O João Schmidt é um controlador. Ele controla o espaço, tem a bola, liga o time, é como uma aranha na teia. O Thiago Mendes é o mais enérgico, assim como é inacreditável a energia do Luiz Araújo ou do Wellington Nem, por exemplo. Balanceamos a aranha na teia, o enérgico e o mágico. Temos dois mágicos.
A função de primeiro volante é a melhor para o João Schmidt exercer?
O João é um jogador muito flexível. Pode jogar à esquerda com três ou dois homens em linha no meio, ou como volante. Ele tem concorrência chegando com o Jucilei. E, para mim, o Rodrigo Caio poderia ser o melhor volante do Brasil. Mas ele também é um zagueiro muito, muito bom.
Em toda sua carreira você trabalhou com jovens. É algo que fascina no São Paulo, a possibilidade de desenvolver muitos jogadores novos?
Eu acho que vemos os melhores técnicos nas conversas individuais, não no campo. No primeiro dia aqui o Rogério disse que nosso passo inicial seria entender os jogadores, e então eles nos entenderem. Eu quero saber por que o Rodrigo Caio joga futebol. O que faz ele levantar de manhã? Qual sua ambição? O que o guia? E aí temos condições de desenvolvê-lo. E o mesmo com Cueva, Chavez, Pratto, com os jovens, Araruna, Junior.
O relacionamento individual é a coisa mais importante no futebol. Descobrir o por quê esse garoto quer jogar futebol. É nisso que você quer se transformar? OK, então vamos planejar cada dia para você. Qual sua identidade? Para mim, Thiago Mendes é jogador de meio-campo mais enérgico que atua no Brasil. Ele corre, pressiona, entra na área, recompõe. Então em todo jogo ele deve mostrar essa identidade porque isso é ele em seu melhor momento. Por isso vemos como treinar, recuperar, preparar física e mentalmente para fazê-lo atuar assim. O Cueva pode fazer gols e dar assistências em todos os jogos, então vamos criar um treino para ele.
Acredito que as pessoas não imaginam um lado tão humano e individual quando se fala num profissional europeu, que remete a algo mais frio e pragmático.
Temos que incluir os jogadores. Para alguns deles, dinheiro no futebol tem um significado feio. Mas para outros não. Se você sai da cama de manhã para ganhar dinheiro com o futebol e tirar sua família de uma região pobre, dinheiro não é feio. Não é na América do Sul, não é na África. Talvez seja na Inglaterra, onde muitos jogadores e suas famílias são ricas. Muitos jogadores almejam sucesso em seus clubes, outros disputar uma Copa do Mundo ou jogar num grande clube europeu. Eles são diferentes e isso leva tempo por causa da confiança. Eu não falo bem o português, mas acho que fazemos um bom trabalho. Os jogadores confiam em nós, nós confiamos neles, usamos diferentes atletas em cada partida e eles tentam muito fazer aquilo que nós queremos.
Você acha que nos últimos anos o futebol brasileiro ficou taticamente defasado em relação ao europeu?
Na Europa, os países são mais próximos uns dos outros, as coisas giram. No Brasil, o calendário afeta táticas, a recuperação dos jogadores, o nível de atuação vai diminuindo a cada partida. Se acho que o futebol brasileiro está atrás? Não. O Brasil tem jogadores incríveis pelo mundo. Quando chega a Copa do Mundo, todos que não são brasileiros querem assisti-la para ver o Brasil. As crianças em todos os países são fãs do Brasil. Mas não há muito giro de informações. Na Europa, os técnicos e jogadores alemães, holandeses, franceses, ingleses, trabalham fora. No São Paulo, temos uma boa troca de informações. O Rogério teve influências, sua dedicação como jogador o fez aprender com o Osorio (técnico colombiano que atualmente dirige o México). O futebol é o mesmo, acho que o nível dos jogos baixa por causa do calendário.
Você disse numa entrevista a um veículo inglês que o futebol é um jogo simples que as pessoas tornam complicado. Explique isso.
O futebol é simples. São dois times que têm de fazer gols e se defender. Alguns técnicos vão muito longe do jogo. Fique perto do jogo, é muito, muito simples. Os melhores técnicos do mundo são muito humanos: Mourinho, Ancelotti, que é meu ídolo como técnico, Sampaoli, Bielsa, Guardiola. A educação de técnicos é sobre táticas. Esqueçam as táticas e vamos pensar nas pessoas. Como fazê-los render mais? Se conseguirmos extrair 5% a mais de cada jogador, o São Paulo será muito mais forte.
Por que o Ancelotti?
Porque ele trabalhou em vários países, fala muitos idiomas e nunca mudou o estilo de um clube. Ele pode passar pelo Bayern de Munique, e quando sair o Bayern será o mesmo. Ele teve uma passagem de sucesso pelo Chelsea, que depois seguiu em frente. Ele respeita os valores e a história dos clubes, aprende a língua, e treinou grandes jogadores dos últimos 15 ou 20 anos. Primeiramente, é um grande homem e comanda grandes pessoas. Em segundo lugar, é um bom treinador. Primeiro é o homem. Não adianta o Rogério, eu e o Pintado passarmos as informações aos jogadores se eles não gostarem de você como pessoa. Eles não vão jogar por você. A primeira coisa é ter bons valores. Por isso Ancelotti é meu ídolo. Eu amo o Mourinho, acho Klopp muito bom, sou fascinado por Bielsa e Sampaoli, gosto do Guardiola.
E o Conte?
Como torcedor do Chelsea, estou animado no momento, mas o Ancelotti treinou Ronaldinho, Ronaldo, Zidane, Del Piero…
Quem é o melhor jogador do mundo?
Para mim é o Iniesta. É o mais completo. Minha filosofia de futebol é eu contra você. Temos diferentes personalidades de futebol. Você talvez seja um meio-campista e eu um driblador. Você tem de jogar no mano a mano comigo. É físico, mental, técnico, tático, e o Iniesta pode driblá-lo, pode vencer com o passe, ganhar na velocidade, marcar no mano a mano. É o mais completo jogador de futebol no mundo. Os mais excitantes, nessa ordem, são Messi, Cristiano Ronaldo, Robben e Hazard. Eu amo o Robben. Ele me fazia levantar. Falei para o Luiz Araújo sobre como ele pode tomar a melhor decisão em frente ao gol, com o último passe. Mas se eu pudesse treinar um jogador, seria o Iniesta, e antes dele o Kaká, pela mesma razão.
Kaká é o melhor jogador brasileiro dos últimos anos?
Eu fui com minha namorada a Milão para vê-lo jogar. Eu o amo, mas amo Ronaldinho, Neymar agora. O melhor brasileiro depois do Pelé, com certeza, foi o Ronaldo. Ele mudou a maneira do camisa 9 jogar. Antes era apenas uma função, mas ele era como se fossem dois jogadores em campo. Mesmo depois da lesão ele fez um bom trabalho. Meu primeiro trabalho como técnico foi ensinando futebol de salão, e aí era Ronaldo, Rivaldo. Eu amo o futebol sul-americano, sou apaixonado pelo Riquelme.
Uma pergunta importante: caipirinha ou cerveja?
(pensativo) Caipirinha, com certeza. De morango (risos). O Charles (Hembert, francês, supervisor de futebol do São Paulo) morou três anos na Vila Madalena no passado, e me levou a três restaurantes terríveis. Eu fiquei bravo e disse: “Charles, você tem que me levar a um bom restaurante”, depois que ganhamos do Santos. “Eu pago!”. Fomos ao Brown Sugar, ótimo restaurante, e bebemos mais do que podíamos (risos). Naquele dia, eu me mudei, minha família chegou da Inglaterra após sete semanas longe, ganhamos do Santos num lindo jogo. Foi perfeito, então fomos celebrar.
Vocês mereciam.
É importante dizer que não somos a mesma pessoa, ele é francês e eu sou inglês, genuinamente não combinamos (risos). Eu tenho 36 anos, ele tem 26, é solteiro, jovem, aproveita São Paulo. Espero não causar problemas ao Charles (risos).
E como está sua vida na cidade?
O clima é ótimo, meus filhos nadam todo dia. Para minha esposa é difícil pelo idioma, mas é uma aventura adorável para qualquer pessoa. Nos mudamos para Alphaville, não por qualquer outra razão que não fosse manter o estilo de vida que meus filhos tinham em Liverpool. Fiquei três semanas na Vila Madalena e adorei. Eu sei que o Brasil tem muitos problemas, mas as pessoas são mais felizes do que na Inglaterra, que tem menos problemas. Eu conheci pessoas de diferentes níveis de vida, não tenho problemas com isso. Há pessoas muito pobres e muito ricas, mas sinto que todas desfrutam a vida. Há muitos bons restaurantes, e isso é um problema para mim (risos, enquanto bate na barriga). Tenho que tomar cuidado.
E futebol é futebol, eu amo futebol. Passo o dia aqui trabalhando duro, mas estou muito feliz. Agora dirijo, tenho uma casa, minha família está aqui, todo dia falo um pouco de português. No treino é muito fácil, mas fico envergonhado publicamente. Essa é a primeira entrevista, eu prometo que na próxima que fizermos vamos falar em português.