O São Paulo e a Cartilha do Rebaixamento

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GloboEsporte.com

Meia Encarnada-Douglas Ceconello

No Morumbi, como diria o filósofo, “bateu a miudinha”

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Ninguém é testado o suficiente até o momento em que precisa lutar pela sobreviviência, e por isso a zona da degola, sabemos, é onde reside a real emoção do campeonato brasileiro de pontos corridos. E tanto mais intenso é o drama quando estão envolvidos clubes de massa, que invariavelmente contam com o resto do país torcendo pela sua desgraça, por algum sádico mecanismo moral que algum filósofo alemão certamente já explicou. Se o São Paulo vai cair de fato, apenas a inapelável chegada de dezembro poderá responder, mas no andar da carruagem, ladeira abaixo e com as melancias tricolores espocando pelas paredes, já é possível dizer que o time do Morumbi vem seguindo com disiciplina toda a Cartilha do Rebaixamento, ensinamento por ensinamento, como o aluno mais empenhado da turma.

“Não tem elenco para cair”

É difícil apontar, entre os grandes clubes já rebaixados, algum que realmente tivesse um grupo de jogadores fadado a cair de divisão. Porque, por questões financeiras, geralmente os maiores times apresentam equipes mais potentes que seus concorrentes. E esta é a primeira ARAPUCA que atinge os futuramente rebaixados, ainda nas primeiras rodadas, quando o inverno parece passageiro. Esta desculpa para um otimismo insistente sempre acaba desmontada por outro fator, insondável: a gravidade funciona diferente dependendo do tamanho do clube. Quando um grande está na zona de rebaixamento, todas as forças do universo, físicas ou anímicas, conspiram para que continue afundando, porque a camisa pesa também para baixo e cada jogador parece entrar em campo com uma bigorna amarrada no tornozelo.

A fritura de ídolos

Sempre há uma data que marca a queda, mas o rebaixamento é construído com afinco durante anos, por meio de uma sequência de desmandos e incompetência que culmina com o rodapé da tabela. No meio deste processo, algumas saídas mágicas despontam no horizonte, e uma das mais frequentes é apelar para a mítica figura dos ídolos, como o Internacional fez com Paulo Roberto Falcão em 2016. No começo deste ano, o São Paulo acreditou que Rogério Ceni seria o Alex Ferguson do Morumbi, tomando como parâmetro exclusivamente sua trajetória com a camisa tricolor, já que nunca havia treinado sequer um time de botão. Lugano também acabou permanecendo para servir de escudo, assim como hoje Raí e Muricy são cogitados para funções de coordenação: o clube tenta buscar um último socorro em sua própria história.  É apenas o primeiro tropicão de um tombo que leva a uma queda agoniante e prolongada.

Os pontos que escorrem entre os dedos

Na trajetória dos grandes rebaixados, invariavelmente há aquelas quase vitórias que viraram poeira quando pareciam tão próximas e poderiam ter mudado o rumo em algum momento da campanha, jogos que serão lembrados para todo o sempre pelos torcedores. Estes pontos perdidos são a prova de como um time é inconstante a ponto de sequer conseguir segurar uma vitória em seus domínios, exatamente como o São Paulo fez diante da Ponte Preta. Ou do Coritiba. Ou do Atlético-GO. Também contribui para o tormento o fato de um time grande, por pressão, precisar sempre buscar a vitória, o que, em momentos de turbulência, gera um efeito reverso. O São Paulo hoje tem a segunda pior defesa do campeonato: 35 gols sofridos contra 36 do Atlético-GO, com o agravante, no caso são-paulino, de que a defesa PIOROU com a chegada de Dorival Jr. Aliás, após o empate de sábado, o São Paulo bateu seu recorde de presença na zona de rebaixamento: são 11 rodadas seguidas de aflição.

O império da treta

Um clube da envergadura do São Paulo chegar a uma situação de calamidade como esta requer empenho. E na maioria das vezes é um processo gradual que começa no topo da pirâmide: há anos a direção tricolor é um exemplo de descaminhos que, mais cedo ou mais tarde, desembocariam no vestiário e no próprio desempenho do time em campo. Esta falta de comando provoca situações como a rusga entre Rodrigo Caio e Cueva, que em cenários mais austeros seria resolvida na MACIOTA. Um cenário assim, de pré-ruína, pode ser amenizado apenas com a presença de um treinador de perfil de maior autoridade, como Abel Braga ou Tite, que atuam como técnico, gerente e vice de futebol quando necessário, característica que definitivamente não pertence a Dorival Jr.

“Time grande não cai”

Entre os torcedores que nunca foram rebaixados, existe uma certa crença íntima de que estão protegidos pela aura do ineditismo. Uma confiança lunática de que, por mais que tropecem, jamais vão despencar a ponto de perderem sua dignidade. Esta é a armadilha fatal rumo ao cadafalso. E lamento confessar que recentemente adquiri certa autoridade para falar sobre o assunto. Espelhando a sabedoria popular católica de que quanto mais se invoca o nome do diabo, mais perto ele chega, o rebaixamento se aproxima de forma mais ameaçadora e irreversível conforme o torcedor repete o mantra de que “time grande não cai”. É apenas uma questão de tempo: todos os clubes, pequenos, médios e grandes, serão rebaixados, nos próximos quatro ou trezentos anos.

Um olhar enviesado, às vezes meio desfocado, quem sabe até lógico, sobre o futebol – suas circunstâncias, sua cultura, e também o jogo.

3 COMENTÁRIOS

  1. O são Paulo esta nesta situação não apenas por hoje, mas por anos anteriores também, pois não soube manter em alto nível , tente lembrar a quanto tempo não podemos dizer que o time jogou bem? Tem de começar a pensar no novo ano desde ja, independente se cair ou não. Mas nunca esteve tão fácil de sair desta situação, a distancia entre o primeiro da zona de rebaixados no momento e do ultimo time classificado hoje para a libertadores é pequena, precisa de uma serie de 3 vitórias seguidas e a tranquilidade volta.

  2. Eu ainda não dou como certo o nosso rebaixamento, porque está bastante embolado o campeonato na parte de baixo.
    No mínimo 10 times ainda tem chance de cair, o problema é que nós estamos entre eles e somos o que mais está desperdiçando as chances de sair.
    Nossos concorrentes estão começando a respirar vide Avaí e nós estagnados, pra mim todos tem culpa.
    Não eximo nem o D.Jr, se cair vai ser merecido, se não vai ser milagre ou por pura incompetência dos adversários e pouco mérito nosso.