Dorival Júnior, exclusivo: “Aqui se olha o futebol sem enxergá-lo”

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UOL

André Rocha

Foto: Érico Leonan/saopaulofc.net

Um misto de alívio, esperança e preocupação norteou o papo com o treinador Dorival Júnior sobre o momento do São Paulo: time fora da zona de rebaixamento, mas sem o direito de perder a concentração na pausa de dez dias para a data FIFA. Margem de erro pequena, mas otimismo quanto à evolução da equipe, além do incômodo com o imediatismo e a cobrança excessiva por resultados.

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BLOG – O São Paulo vem jogando uma vez por semana há algum tempo e agora tem pausa de dez dias – dois dias de folga e sete sessões de treinamentos. O time saiu da zona de rebaixamento depois de 13 rodadas. Qual o risco de um relaxamento ou desmobilização?

DORIVAL JÚNIOR – O cuidado maior deve ser na dosagem dos treinamentos. Se aumentar o volume de trabalho pode ser prejudicial, mas também não pode tirar o pé do acelerador. Equilibrar as informações diárias sobre a condição dos atletas com o feeling de tantas experiências parecidas. O importante é que não percamos competitividade nesta pausa.

BLOG – Sua equipe, até por necessidade, vai tentar propor o jogo no dia 11, em Belo Horizonte contra o Atlético Mineiro?

DORIVAL JÚNIOR – Nossa situação não permite celebrar esse alívio na tabela. Temos que respeitar as nossas características, mas também as particularidades do adversário. Não podemos nos comportar como ”sparring”, precisamos pontuar. Será jogo de superação. Com segurança, mas sem deixar de ser agressivo.

BLOG – Como você avalia a evolução do São Paulo nos últimos jogos com uma formação sem um volante na proteção, com Petros à frente da defesa?

DORIVAL JÚNIOR – A aproximação dos setores está deixando os atletas mais confortáveis e já é possível arriscar movimentos diferentes, como dois dos atacantes voltando e os outros dois infiltrando na última linha do adversário. Estamos conseguindo confundir mais a marcação com a mobilidade de Lucas Fernandes, Marcos Guilherme, Cueva e Pratto. Tivemos alguma dificuldade na criação das jogadas contra o Sport, mas faz parte do processo.

Sem a bola, me agrada muito notar que eles estão mais interessados e preocupados com o trabalho defensivo. A colaboração de todos na compactação vem corrigindo um erro grave nos gols tomados, que era a equipe muito espaçada. Agora a última linha está mais protegida e também bem posicionada.

BLOG – Você é um treinador que preza muito a posse de bola e o estilo mais ofensivo. Como está vendo o Brasileiro com predomínio do jogo mais reativo? Mudou algo nas suas convicções?

DORIVAL JÚNIOR – É preocupante. Mas o que noto é que muitos dos que reclamam do futebol jogado no Brasil são os mesmos que cobram resultados imediatos.  É um assunto muito debatido, mas sem dados concretos. É algo que está incomodando, mas pode tirar da zona de conforto. Eu tenho conceitos e uma visão de futebol. Já venci e perdi propondo jogo ou reagindo à iniciativa do adversário. Não vou mudar. Para mim o futebol, na fase ofensiva, é posse de bola, deslocamentos, velocidade e infiltração.

BLOG – Mas você concorda que o dito ”futebol moderno” chegou aqui primeiro pela dinâmica defensiva e ainda estamos atrasados na evolução da construção do jogo?

DORIVAL JÚNIOR – Concordo, mas esse desequilíbrio existe praticamente no mundo todo. O trabalho defensivo evoluiu demais. Antes era privilégio de Itália, Alemanha, Inglaterra…Na Alemanha houve primeiro uma mudança de mentalidade e depois a chegada do Guardiola. É uma nova escola de futebol.

Mas no mundo todo houve um acréscimo no jogo coletivo sem a bola, por pragmatismo, que não foi acompanhado pelo trabalho ofensivo. A única evolução foi a busca maior da amplitude no ataque com os pontas. É provável que as defesas prevaleçam sobre os ataques durante algum tempo. Cabe a nós, treinadores, complementarmos nosso trabalho e dar mais qualidade às ações de ataque.

BLOG – Então o futebol hoje está mais para Mourinho que Guardiola?

DORIVAL JÚNIOR – Foi uma transformação rápida, uma mudança por necessidade. Aproxima as linhas, marca por zona. Agora usando até cinco homens, exatamente para negar espaços no fundo do campo. Fecha o centro, induz o rival a abrir a jogada para interceptar o cruzamento. Houve mais inovações neste aspecto e mais times jogando desta maneira.

BLOG – Qual a dificuldade de trabalhar conceitos de jogo em um elenco que mal se conhece, mexido, desentrosado e sofrendo enorme pressão para vencer e subir na classificação?

DORIVAL JÚNIOR – No Santos eu tive dois anos e pude trabalhar uma filosofia e ir encaixando algumas situações ao longo do tempo. Aqui eu preciso adaptar, dentro das minhas convicções. Não posso me dar ao luxo de arriscar muito, por tudo que você expôs na pergunta. Primeiro proteger, depois fazer os jogadores acreditarem na proposta.

BLOG – Você falou em ”proteção”. E os muitos gols sofridos, especialmente no início do trabalho, que geraram muitas críticas?

DORIVAL JUNIOR – É questão de tempo de trabalho. Tem jogador que mal se conhece. Em outubro, quase no fim da temporada, muitos não completaram sequer uma dúzia de partidas pelo clube. É o Militão adaptado à lateral direita, vários problemas. Mas querem soluções rápidas. Aqui se olha o futebol sem enxergá-lo. São cobranças descabidas e uma visão deturpada em todos os segmentos.

BLOG – Ainda dentro deste tema, como é possível orientar o Pratto com essa ansiedade de dez rodadas sem marcar gols?

DORIVAL JÚNIOR – Internamente ele sabe da sua importância. É um cara coletivo, mas com ambições. O grupo vem administrando isso muito bem. Todos têm noção da sua contribuição na abertura de espaços, nos deslocamentos. Sua movimentação compensa a falta de gols. Como gestor procuro tranquilizá-lo, por mais que ele seja experiente. Mostrar que está no caminho correto e que as coisas vão acontecer naturalmente. E sua importância não é só dentro de campo, tem a liderança que contribui demais.

BLOG – O fato de termos o oitavo colocado separado do 18º por apenas quatro pontos ajuda por motivar a conseguir uma sequência de bons resultados e respirar aliviado ou é preocupante porque os jogos serão mais duros e qualquer vacilo significa a volta ao incômodo Z-4?

DORIVAL JÚNIOR – Em todas as edições do Brasileiro da Série A que disputei o returno foi bem mais disputado que o turno. É uma constante e este ano parece ainda mais dura a concorrência. Os jogos serão mais parelhos e essa distância mínima deixa tudo ainda mais complicado. Sem dúvida é a edição mais difícil que já disputei e será assim até a última rodada.