A saga da construção do Morumbi

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Há exatos 57 anos, no dia 2 de outubro de 1960, o são-paulino realizava um grande sonho ao inaugurar o estádio próprio. O gol de Peixinho e a vitória contra o Sporting de Lisboa coroaram anos de luta e muito trabalho – que, mal sabiam todos, naquela altura, ainda estava longe de acabar. Pelo aniversário da casa tricolor, o Site Oficial publica este especial sobre os 18 anos de construção do Morumbi.

O Estádio Cícero Pompeu de Toledo se encontra hoje em bairro nobre da capital paulista, mas nem sempre foi assim. A região foi desenvolvida pelo próprio estádio que, enquanto era construído, encontrava-se em meio ao nada. O terreno sobre o qual se ergue o gigante Morumbi foi, até meados dos anos 50, uma área alagadiça e de mata fechada, do “outro lado” do rio Pinheiros e fora do núcleo urbano paulistano – em suma, longe de tudo e de todos.

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Vista área da região do Morumbi pré-urbanização / Arquivo Histórico do São Paulo FC

O São Paulo sofreu e teve que procurar muito antes de encontrar o local ideal para construir um estádio. Não era possível para o clube erguê-lo no Canindé, onde possuía, à época, sede social e de treinamento. A área, de 70 mil metros quadrados, não suportava um grande empreendimento e, devido ao projeto municipal de retificação do rio Tietê, o espaço foi reduzido ainda mais.

O Tricolor até cogitou trocá-lo pelo Ibirapuera (100 mil metros quadrados), mas a Câmara Municipal da Cidade foi contra a ideia. Pouco tempo depois, em 1954, a Prefeitura inaugurou o Parque no terreno maior, ao lado do prometido, pelos festejos do quarto centenário do município. Só restou ao São Paulo seguir em frente: vender o que restou do Canindé e procurar outros terrenos.

Poderia ter existido: O São Paulo do Ibirapuera / A Gazeta Esportiva de 8 de abril de 1948

Os dirigentes são-paulinos voltaram a atenção, então, para terrenos da Light, a companhia energética, às margens do Rio Pinheiros, mas a aquisição também não se mostrou possível, pois, ao todo, a área só possuía 45 mil metros quadrados. Enquanto isso, a condessa Mariangela Matarazzo e outros proprietários se desfizeram de um grande lote de terras na região do Morumbi. A Imobiliária e Construtora Aricanduva adquiriu a área em 7 de fevereiro de 1951 e, de pronto, planejou o loteamento comercial.

“… aquisição feita a Condessa Mariângela Matarazzo e outros, conforme escritura lavrada nas notas do 11º Tabelionato da Capital, livro 1.255, fls 1, em 29 de dezembro de 1950, e registrada no Registro de Imóveis da 11a. Circunscrição, sob nº 6.930, livro 4-D, folhas 217, em 7 de fevereiro de 1951, se tornou legitimamente senhora e possuidora de um terreno com a área de dois milhões, duzentos e quarenta e seis mil, duzentos e vinte metros e sessenta e três decímetros quadrados (2.246.220,63ms2.), ora denominado “Jardim Leonor”, situado no bairro do Morumbi, 30º Subdistrito, subdistrito de Santo Amaro, município e Comarca da Capital” (Tabelião Firmo, Livro de Notas 644, pg 50).

Vocabulário Tupi-Guarani/Português, de Silveira Bueno & Dicionário de Topônimos Brasileiros, de Luiz Caldas Tibiriçá

Ano de 1813. Em uma região à sudoeste de São Paulo (na verdade, na então cidade de Santo Amaro), do outro lado do Rio Jurubatuba – antigo nome do Rio Pinheiros -, era ‘inaugurada’ uma extensa fazenda de chá, com mais de 700 alqueires. Propriedade designada a John Rudge, inglês que desembarcara no Brasil junto de D. João VI, em 1808. Rudge batizou seu lote com o nome indígena Morumby. Há controvérsias sobre o significado do termo. Para uns ‘Monte Verde’, para outros ‘Monte Alto’, ou ainda ‘Mosca Verde’.

Após a ativação da Comissão Pró-Estádio – criada em 15 de maio de 1952 e constituída por Cícero Pompeu de Toledo (presidente), Luiz Cássio dos Santos Werneck (secretário), Amador Aguiar (tesoureiro), Piragibe Nogueira, Manoel Raymundo Paes de Almeida, Altino de Castro Lima e Luiz Campos Aranha (membros), Carlos Alberto Gomes Cardim Filho, Pedro França Pinto, Roberto de Barros Lima e Oswaldo Athur Bratke (conselho técnico) –, o São Paulo adquiriu junto a Imobiliária Aricanduva um terreno de 99.873m² na região do Morumbi, em 4 de agosto de 1952 – o primeiro dos três lotes com ela negociados e que compõem a propriedade do Tricolor.

Escritura de doação de terreno no Morumbi / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Neste terreno estava previsto, de acordo com o projeto de loteamento original, uma praça pública. A lei nacional nº 58 de 1937, que regulamentava loteamentos, afirmava que cabia a Prefeitura tão somente a aprovação dos lotes, conforme planejamento do detentor do terreno. A Aricanduva buscava divulgar sua propriedade para o público, afinal se situava em local desconhecido, distante e carente de todas as melhorias da cidade. Por isso, melhor propaganda que um estádio não havia. Assim, a empresa alterou o projeto de loteamento original, transformando o espaço destinado à uma praça na área cedida para a construção do Morumbi, com anuência da prefeitura.

Cabe dizer que, até o Decreto-Lei 271 de 1967 e o Artigo 22 da Lei 6.766 de 1979, nenhum terreno destinado a vias ou praças públicas era de propriedade do Munícipio, nem com loteamento aprovado (somente com essas leis a situação mudou, antes eram do loteador, simplesmente). Ou seja, a área do Morumbi, com escritura de 1952, nunca foi um terreno público.

O pavilhão tricolor junto a pedra fundamental / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Em menos de duas semanas, ainda sem projeto de construção ou de viabilização financeira, o Tricolor lançou a pedra fundamental do estádio, no dia 15 de agosto, e também convidou o cardeal são-paulino, Monsenhor Francisco Bastos, para abençoar aquelas terras. Enfim, chegara o momento de correr atrás de recursos e levantar o estádio.

No dia 2 de setembro, a primeira reunião da Comissão Pró-Estádio traçou como plano de aporte inicial a venda de três mil futuras cadeiras cativas, com título de uso válido por 20 anos e com a operação a cargo da empresa Cooperária Construções S/A.

A terraplanagem do Morumbi / Acervo Agnelo Di Lorenzo e Arquivo Histórico do São Paulo FC

Um ano antes, em agosto de 1951, o São Paulo havia conseguido o aval para um empréstimo de cinco milhões de cruzeiros junto à Caixa Econômica Estadual, depois de muito solicitar, visto que Corinthians e Palmeiras já o haviam recebido. Era o momento de usá-lo. Com o montante inicial o São Paulo abriu concorrência de projetos arquitetônicos e começou o processo de limpeza e terraplanagem do terreno.

Três escritórios de arquitetura famosos apresentaram projetos para o Estádio do Morumbi, em 24 de novembro de 1952, ao custo de Cr$ 40 mil cada: A empresa soviética Antonov & Zolnerkevic, a firma de Gilberto Junqueira Caldas e o escritório de Vilanova Artigas, Gastão Rachou Jr, José Carlos Pinto, Carlos Cascaldi e David Ottoni.

O “Morumbisov” / Acervo Folha Press

O projeto russo era o mais apelativo. Complexo e futurista, com capacidade de público de 60 mil pessoas e cobertura retrátil de vidro, mais parecia uma nave espacial (por causa disso, muita gente acreditava que o Morumbi seria coberto, ainda em 1970). Entretanto a vencedora foi a concepção de Vilanova Artigas. O principal ponto forte desta foi a capacidade de público: 120 mil pessoas, originalmente. Artigas era adepto do brutalismo, vanguarda artística que valorizava o concreto exposto – outro fator preponderante na escolha: menor custo de manutenção.

O engenheiro e arquiteto João Batista Vilanova Artigas foi um gênio de sua época. Brutalista, seu estilo peculiar deu origem ao gênero conhecido como “Escola Paulista”. Entre suas principais obras, além do Morumbi, se encontram o edifício da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, o prédio Louveira, em Higienópolis, o Parque CECAP, em Guarulhos e o Hospital São Lucas, em Curitiba.

A maquete e conceito original de Artigas para o Morumbi / O Cruzeiro de 10 de abril de 1954

Em 10 de março de 1953 o São Paulo apresentou ao público presente na sede da Avenida Ipiranga a maquete (confeccionada pela Maquette Zanini Ltda) da futura praça esportiva. O projeto original contava com estádio de futebol (110.000 m²), ginásio poliesportivo ao estilo “Morumbizinho” com capacidade para 20 mil pessoas (17.000 m²), praça de atletismo e parque aquático com três piscinas (uma olímpica), ambos com arquibancadas para 5 mil pessoas (12.000 m²), além de diversas quadras poliesportivas (1.300 m²) e sede social (7.500 m²).

A construção foi orçada, inicialmente, em Cr$ 100 milhões. Preparativos finalizados, era chegada a hora de arregaçar as mangas e começar a erguer o colosso de concreto, o maior estádio particular do mundo.

OS PRIMEIROS ALICERCES

A área do estádio e o curso do córrego Antonico / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

As obras que ergueram o Estádio do Morumbi foram iniciadas em 1º de julho de 1953, com o começo da terraplanagem do terreno. Apesar das lei municipais referentes às bacias hidrográficas, rios e córregos, o São Paulo arcou com todo o custo da “canalização” do riacho Antonico, que ainda hoje corre sob a casa tricolor. A Prefeitura em nada se predispôs a ajudar ou ao fazer o que era cabido a ela por regulamentação.

Até então, a fonte de recursos majoritária era o empréstimo de Cr$ 5.000.000,00 junto à Caixa Econômica Estadual. Pouco depois, Amador Aguiar, dono do Banco Bradesco, intermediou em favor do São Paulo um contrato de direitos exclusivos para a venda de produtos dentro do futuro estádio com a Companhia Antárctica Paulista. A cervejaria concederia Cr$ 5.000.000,00 ao Tricolor por 10 anos de exploração comercial no Morumbi (com opção de prorrogação por mais cinco).

Visão dos túbulos para colunas e gigantes / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Com fundo em caixa, o São Paulo garantiu os primeiros estágios de seu grande projeto. Em dezembro de 1953, a terraplanagem foi finalizada, ao custo total de Cr$ 3.270.396,00 pagos à Cavalcanti Junqueira S/A, com 1.399.428 m³ de terra transportados. Em 1954, deu-se o estaqueamento e a construção das fundações do Estádio, com 144 túbulos pneumáticos de suporte de carga para 700 toneladas cada e 3.000 metros de estacas pré-moldadas de concreto armado que sustentam de 20 a 30 toneladas por unidade. Isso sob o montante de Cr$ 12 milhões destinados à Engenharia de Fundações S/A e a Fundações Benachio Ltda.

Ao mesmo tempo foi assinado o contrato de construção da galeria de águas pluviais, no valor de Cr$ 2.410.279,00 (com a Civilsan – Engenharia Civil e Sanitária S/A para canalizar o córrego Antonico). Além desses serviços, outros foram solicitados com o decorrer das obras. O clube gastou Cr$ 11.180,90 em madeira e tábuas (Irmãos Pereira Carneiro & Cia. Ltda.), Cr$ 1.040.643,00 em ferro da Matarazzo S. A. Indústria e Comércio e Cr$ 956.601,00 pelo mesmo minério com a Evans Importadores S.A. Além de Cr$ 15.200,00 em cimento e Cr$ 9.904,00 em pregos e arames.

Exemplo de ação promocional / spfcpedia.com.br

Para ajudar a custear a aquisição destes materiais, o São Paulo promoveu campanhas de vendas de souvenires (como o famoso LP Bola no Barbante, em que Hebe Camargo é um dos destaques) e de doação de cimento – esta famosa, chegando a mobilizar cidades do interior do Estado. A exploração de propaganda no canteiro de obras foi outra medida utilizada.

Ainda em 1954, o clube alterou o modelo original de Vilanova Artigas, após transferência dos direitos de propriedade sobre o projeto. As medidas tomadas trouxeram um ganho 30% de capacidade de público, passando a comportar, assim, 156 mil pessoas. O maior estádio particular do mundo, com sobras. O engenheiro Roberto de Barros Lima passou a chefiar o projeto.

Alguns satirizavam o esforço do São Paulo / Álbum da Inauguração do Estádio do Morumbi

Contudo, a descrença da população mediante ao fato de se “construir um estádio no meio do mato”, aliado à contra campanha de torcedores rivais e setores da imprensa, forçou o Tricolor a vender 12 mil cadeiras, e torná-las patrimônio definitivo, além de romper com Cooperária Construções S/A, em 1954, para assinar um novo acordo com a Rádio Bandeirantes e Oswaldo Molles. Produtor de Rádio e TV, Oswaldo desenvolveu o personagem S.O. (sigla para Sócio-Olímpico, ou seja, sócio dono de cadeira cativa) que se tornou um sucesso, aumentando consideravelmente as vendas.

Nesta campanha, as cativas foram vendidas, em média, a Cr$ 20.000,00 cada (prestações de mil cruzeiros ou 19 mil à vista, ou ainda 22 mil em 44 prestações de 500 cruzeiros). Até sua inauguração, em 1970, o clube vendeu 12.000 cadeiras, representando uma receita aproximada de Cr$ 240.000.000,00, desconsiderando correções monetárias e a inflação. Somente o ídolo Poy, verdadeiro garoto propaganda, vendeu pessoalmente oito mil dessas cadeiras.

Criado por Mollles para ativar a venda de cativas / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Jose Poy, argentino de Rosario (14/04/1926), fez de tudo no Tricolor. Enquanto ainda jogador profissional, ídolo e goleiro do time, vendia pessoalmente as futuras cadeiras cativas do Estádio, de porta em porta. Como jogador, Poy foi Campeão Paulista de 48, 49, 53 e 57 e esteve presente na inauguração do Morumbi. Disputou 525 jogos – o quinto jogador que mais defendeu o clube. Em 1964, Poy assume o posto de treinador. Ao todo, foram sete passagens, um título (Paulista 75), o recorde de invencibilidade do clube em toda a história (47 jogos) e 422 partidas sob seu comando.

Grande chamariz, as cativas foram cruciais não somente para a construção do Templo, mas também para o modo como fora construído. Preferiu-se erguer o Morumbi por seções, que compreendiam três níveis de arquibancadas, ao invés do tradicional “primeiro a camada inferior, depois a superior”. Afinal, quando uma seção fosse finalizada, poderia ser capitalizada em ações de publicidade e suas cativas entregues a seus donos.

A drenagem foi a melhor do Brasil por décadas / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Antes das obras pesadas, de elevação das arquibancadas, as últimas construções de base foram realizadas. Em 20 de abril de 1955, o sistema de 24.000 m² de drenagem, concebida cientificamente pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas) foi entregue ao preço de Cr$ 4.382.437,00. No decorrer do ano ainda foram construídos os túneis, o fosso, a rede de irrigação e a da arquibancada térrea ao custo de Cr$ 6.010.400,00 (Ambas obras a cargo da Civilsan).

Muitas solenidades marcaram o ano de 1956. Em 24 de janeiro, o Conselho Deliberativo batizou oficialmente o Morumbi: Estádio Cícero Pompeu de Toledo, em homenagem ao grande idealizador. No dia seguinte, aniversário do clube, celebrou-se a Festa do Jequitibá. Nessa cerimônia foi plantada uma árvore em terra provinda de todos os municípios do Estado, representando assim a união do povo paulista pelo estádio.

O jequitibá plantado sobre a terra de todos os municípios do Estado / Acervo Agnelo Di Lorenzo e Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Eterno Presidente do São Paulo, Cícero Pompeu de Toledo foi o responsável pelo início da construção do Estádio do Morumbi. Presidente do clube de 1947 à 1958 (eleito por seis vezes), somente se afastou da função por motivos de saúde, vindo a falecer em 1959 – não chegou, assim, a ver o sonho concluído. Por todo o empenho, o Estádio foi batizado com o nome dele em 1956. Um busto em honra ao dirigente é exposto no Salão Nobre do Clube.

Tudo era motivo de festejo e, claro, de publicidade. Então, em 25 de agosto, o São Paulo inaugurou o gramado (do tipo Batatais, elaborado pelo engenheiro Hermes Moreira de Souza, do Instituto Agronômico de Campinas), com festa e churrasco oferecidos à imprensa. Nessa estreia surgiram as primeiras traves redondas do Brasil. Foi nessa época que o Tricolor adquiriu o primeiro trator particular para cuidar da grama. Na verdade, trocaram a máquina pelo passe de um jogador…

As traves sem quina – alívio para os jogadores / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Curiosamente, a primeira peleja sobre o gramado do Morumbi aconteceu dias depois, quando o time dos funcionários do clube, a ABF SPFC (Associação Beneficente dos Funcionários do São Paulo Futebol Clube) enfrentou o time da firma Domingos Raele & Cia. Por causa disso os funcionários tomaram boas reprimendas de Paulo Planet Buarque, ex-diretor de propaganda.

Já na comemoração do 27º aniversário são-paulino, em 25 de janeiro de 1957, aconteceram as primeiras atividades esportivas oficiais do Morumbi, com destaque ao atletismo. Das 9h às 15h, foram realizadas inúmeras provas de corrida, na pista ainda não finalizada do estádio. Vale destacar a participação do recordista Adhemar Ferreira da Silva, naquela altura atleta do Vasco da Gama, que vestiu mais uma vez a camisa são-paulina como parte das festividades (saltou 15,20 m e venceu!).

Revista Tricolor nº 51

Balanço até 31 de julho de 1956

Em documento da Comissão Pró-Estádio, datado de 23 de agosto de 1956 e assinado por Cícero Pompeu de Toledo, Amador Aguiar e Laudo Natel, é afirmado que até a data de 31 de julho de 1956, o São Paulo havia despendido Cr$ 56.054.599,90 em toda a construção, abaixo enumeradas:

Bens imóveis – Terreno: Cr$ 2.330.094,10
Drenagem, Galeria, Arquibancadas e Outros: Cr$ 24.775.633,00
Fundações, Terraplanagem e Ligações de Blocos: Cr$ 17.226.973,20
Conta do Arquiteto João Vilanova Artigas: Cr$ 1.968.809,10
Maquetes, Projetos, Cartórios, e outras despesas: Cr$ 12.083.184,60

Ao passo que arrecadara Cr$ 58.872.050,20 para a mesma, assim descritos:

Doações: Cr$ 900,00
Cadeiras Cativas: Cr$ 52.029.000,00
Concessão de exploração de bares e propaganda: Cr$ 6.700.000,00
Campanha de Fundos: Cr$ 50.020,00
Juros e Descontos: Cr$ 92.130,20

Restando em caixa e em bancos, então, a quantia de Cr$ 487.356,20.

Ou seja, em sua primeira fase das obras, a conta do Morumbi era positiva, e talvez por isso mesmo o time de futebol do São Paulo se manteve competitivo naquele período, sendo Campeão Paulista de 1953 e 1957.

Respeito ao passado ao se construir o futuro / Revista Tricolor nº 51

Mas a pelota também rolou. O primeiro jogo autorizado do Estádio – embora não tenha caráter oficial – aconteceu naquele dia 25 de janeiro entre seleções de veteranos paulistas e veteranos cariocas. Foram 30 minutos (15 x 15) disputados sobre a grama alta do Morumbi, dos quais os locais saíram vencedores, com gols de Renato (14 minutos do primeiro tempo) e Pinga II (aos três do segundo tempo). Os cariocas descontaram com Anito, dois minutos depois.

Sillio del Debbio foi o árbitro e as equipes, as seguintes: Paulistas – Narciso, Lamparina e Norival (Argemiro); Caieira, Og e Dino; Pinga II, Lorena, Renato (Badi), Paulo e Álvaro; Cariocas (ou Bangu/Madureira): Alfredo (Nahem); Domingos e Laerte; Laleco, Brito e Mineiro; Mota, Anito, Moacir Bueno, Djalma Canhoto e Pedro Nunes.

Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Foi justamente nessa época (1956-1957), com tantos eventos que chamavam a atenção do público (dos quais também vale destacar os treinamentos do time profissional), que o apelido “Estádio do Morumbi” começou a se tornar popular – afinal para este bairro os convidados tinham que se deslocar nessas ocasiões.

Antes, quando se falava do terreno, usava-se mais o termo “do Jardim Leonor”, a gleba da qual a área são-paulina foi extraída das posses da Imobiliária Aricanduva. Pelas demarcações do município, entretanto, o lote oficialmente com este nome é nas vizinhanças e o Estádio se sempre se manteve dentro dos limites do Morumbi.

Treino com muitos espectadores / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Mas até o estádio são-paulino ter um nome oficial e mesmo até o apelido ganhar renome, outros foram cogitados. Nenhum, contudo, que tenha sobrevivido em tinta e papel. Constam, por relatos de pessoas da época, como Jérson da Costa Ramos (ex-funcionário do Arquivo Histórico), que foram sugeridos nomes em honra ao povo paulista, como Estádio dos Bandeirantes e Estádio Nove de Julho. Luiz Cássio dos Santos Werneck teria sido voto vencido nessa questão (antes de ser posta em decisão do Conselho Deliberativo, vale dizer), pois defendia homenagem desse tipo.

A ideia de unir o povo paulista em torno do estádio, porém, ainda voltaria à tona, futuramente. O termo “Paulistão” para o carnê lançado em 1968 – como se verá, também um pretenso apelido para o Morumbi – não foi à toa. Muito antes, todavia, campanhas internas tentaram aproximar a população de todo o Estado. A maioria não saiu do papel e das pranchetas publicitárias.

Concepções artísticas nunca utilizadas (tudo bem que é rascunho, mas nem o escudo acertaram) / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Em 31 de outubro de 1956, a Prefeitura de São Paulo promulgou a lei nº 5.073 a qual concedia auxílio de até Cr$ 10.000.000,00 em apólices da dívida pública (com juros de 8% ao ano) às obras do Estádio do Morumbi. Os títulos foram negociados na bolsa de valores e renderam um valor líquido de Cr$ 5.473.000,00 ao clube, sendo o montante registrado em seu livro caixa diário sob o nome do Decreto nº 3.401 de 18 de dezembro de 1956 da Prefeitura de São Paulo.

Cabe ressaltar que a quantia em si é ínfima perto do despendido pelo Tricolor durante todo o processo de construção de seu estádio – como os números apresentados aqui bem revelam – e que essa ação não teve validade somente para um único clube, como a lei de 5.066 de 22 de outubro do mesmo ano revela, ao promulgar o mesmo auxílio ao Corinthians (sob Decreto nº 3374, de 5 de dezembro de 1956. Em verdade, todos os clubes grandes da capital foram agraciados por medidas idênticas, e o São Paulo não foi o primeiro – mas foi o único a fazer bom uso.

Medalhas de recordação do evento / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Visando manter os holofotes do povo no estádio, o São Paulo promoveu uma competição amistosa em junho de 1957, o Torneio Internacional de Futebol – Copa São Paulo. As partidas do certame se deram no Pacaembu e no Maracanã. Do estrangeiro foram convidados a participar o Dinamo Zagreb (então Iugoslávia), Belenenses (Portugal), Lazio (Itália) e Sevilla (Espanha). Flamengo, Corinthians e Vasco da Gama (reforçado com santistas) também tomaram parte, além do Tricolor.

Praticamente um campeonato mundial (como visto em 2000), as equipes foram divididas em dois grupos (Rio de Janeiro e São Paulo), os visitantes internacionais, porém, decepcionaram e não passaram da primeira fase. A fase final entre os clubes brasileiros não chegou a ser concluída, contudo, pelo pouco interesse dos mesmos em manter a competição sem os estrangeiros.

O COLOSSO SE ELEVA

Erguido a partir do atual setor vermelho / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Entre 1956 e 1957 começou, verdadeiramente, a construção do maior estádio particular do mundo. E não foi ao acaso que a fila de títulos do Tricolor começou em 1958. Os esforços financeiros do Clube passaram a ser destinados, em grande parte, à fase mais difícil da construção do Estádio. Em pouco mais de um ano, o São Paulo desembolsou quase 100 milhões de cruzeiros – nos quatro anos anteriores gastou pouco mais da metade disso.

A instalações hidráulicas e elétricas (Sociedade Comercial e Instalador Scil Ltda., Cr$ 1.255.104,60) foram finalizadas em setembro de 1956. As fundações foram concluídas em setembro de 1957, por Cr$ 20.000.000,00. Seis vãos de gigantes (espaços entre as colunas de sustentação) foram terminados em seus três níveis e outros 19 vãos ao redor, até as cativas, em fevereiro de 1957. Até agosto de 1958 todos os níveis foram levantados, mas, somente em março de 1960, finalizados, com o acréscimo de outros cinco vãos. Tudo ao custo de Cr$ 78.681.571,60 (Civilsan).

Os ossos do Morumbi em 1959 / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Com essa configuração, o Morumbi teria sua inauguração parcial. Até lá, contudo, faltavam outros detalhes: a pista de atletismo, configurada por Dietrich Gerner, foi inaugurada em 9 de abril de 1960. As rampas de acesso provisórias e pisos do pavimento térreo foram entregues em 20 de julho, por módicos Cr$ 7.000.000,00 (Civilsan). Já os bancos das numeradas e cativas foram instalados por Cr$ 10.600.000,00 (Domingos Raele & Cia Ltda.). Para pregá-los, Laudo Natel teve que virar garoto propaganda de uma indústria (Parafusos Marpi S/A) e assim conseguir 400 mil unidades de graça.

Por fim, necessário para separar a torcida do canteiro de obras, o muro de entorno – com espaço para 47 painéis publicitários -, saiu por Cr$ 4.000.000,00 (Santoro & Alves). Triste foi a derrubada do velho Pinheirinho, retrato do lento avanço das obras. Reza a lenda que a esposa do presidente Laudo Natel, Maria Zilda, impediu o corte da árvore, pois nela havia um ninho de passarinho. Passaram-se quase oito anos até que, enfim, ele fosse derrubado por causa da construção do muro.

A instalação do gramado com o Pinheirinho ao fundo / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Comissão Pró-Estádio de 30 de abril de 1958: Presidente: Laudo Natel; Vices-Presidentes: Dr. Piragibe Nogueira; Monsenhor Francisco Bastos e Dr. Mário Tavares Filho; Secretário: Manoel Raymundo Paes de Almeida; Tesoureiro: Marcel Klaczko; Demais membros: Altino de Castro Lima, Amador Aguiar, Dr. Breno Caramuru Teixeira, Dr. Caetano Estelita Pernet, Dr. Carlos Alberto Gomes Cardim, Dr. Frederico Antônio Germano Menzen, General José Porphyrio da Paz, Dr. Jovelino Bahia, Júlio Brisola, Luís Campos Aranha, Dr. Manuel José de Carvalho, Dr. Paulo Machado de Carvalho, Dr. Paulo Planet Buarque, Dr. Pedro Franca Pinto, Dr. Roberto Barros Lima e outros.

O segundo lote do terreno do Morumbi (B, abaixo), de 25.936 m², foi adquirido em 13 de julho de 1959, também por doação, junto a Imobiliária Aricanduva, como o acordado nos termos de 12 de novembro de 1952 (Tabelião Firmo, Livro de Notas 644, pg 43). O terceiro e último lote (C), de 29.584 m² foi comparado pelo São Paulo junto aos mesmos proprietários pelo valor de Cr$ 8.875.200,00 em contrato firmado no dia 3 de março de 1965 (Tabelião Firmo, Livro de Notas 644, pg 40V).

Os três lotes do terreno do Morumbi / Última Hora de 5 de agosto de 1952

Longe de estar finalizado, a Comissão Pró-Estádio achou por bem inaugurar o estádio, mesmo incompleto, pois passaria a obter mais recursos provindos de bilheteria e também de ações publicitárias e promocionais, pelo destaque do Morumbi na imprensa. Além de, claro, saciar a vontade do são-paulino em ver e ocupar sua própria casa.

Inicialmente, cogitou-se chamar a equipe do Peñarol para a honra do primeiro jogo no novo estádio. A proposta teria sido levada pelo presidente da FPF, João Mendonça Filho, junto a uma oferta de 400 mil cruzeiros (e a promessa do Tricolor enfrentá-los também no Centenário, posteriormente), quando da ocasião do jogo da Seleção Brasileira contra a do Uruguai, neste país (9 de julho). Pela falta de tempo disponível para acertar os detalhes dessa partida, a princípio pensada para o dia 14 de julho, desistiu-se do evento.

Cartaz de divulgação do jogo / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Um mês depois, no dia 13 de agosto, o Sporting Club de Portugal aceitou o convite para ser o antagonista do São Paulo na inauguração do Estádio Cícero Pompeu de Toledo, no dia 2 de outubro, sem nenhum tipo de contrapartida financeira. Na mesma época, acertou-se a vinda do Nacional, do Uruguai, para um segundo jogo festivo.

Antes dos amistosos, porém, o São Paulo Futebol Clube apresentou o estádio oficialmente à imprensa. Cronistas da ACEESP foram convidados, no dia 25 de setembro, a conhecerem os setores de trabalho destes profissionais (cabines de rádio e televisão, tribuna de imprensa e tribuna oficial). Neste evento, inaugurou-se o busto de Cícero Pompeu de Toledo – hoje visto no Salão Nobre Luiz Campos Aranha.


INAUGURAÇÃO DO MAIOR ESTÁDIO PARTICULAR DO MUNDO

O Esporte, 1 de outubro de 1960

Com tudo preparado, chegou a data de inauguração: 2 de outubro de 1960. O convidado para repartir a honra desta festividade, o Sporting de Lisboa, havia chegado alguns dias antes e se preparado para o confronto hospedando-se na Ilha da Madeira, o Canindé, do clube irmão: a Portuguesa.

O evento teve início com a benção do novo estádio realizada pelo Cardeal Dom Carlos Carmelo de Vasconcelo Motta e seguiu com o hasteamento das bandeiras do Brasil e de Portugal sob os acordes dos respectivos hinos nacionais. A solenidade prosseguiu ao soarem os clarins de Banda da Força Pública que deu “toque de silêncio” em homenagem póstuma ao idealizador e grande responsável pela construção do maior estádio particular do mundo, à época, o saudoso presidente Cícero Pompeu de Toledo, que nunca chegou a ver sua maior façanha concluída, falecido antes por grave doença.

O primeiro ingresso / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

A justa comoção deu lugar às salvas e hurras ao som do apito do árbitro, Sr. Olten Ayres de Abreu, que deu início a peleja internacional. São Paulo Futebol Clube contra Sporting Club de Portugal. O Tricolor, desfalcado de De Sordi e Dino Sani, contundidos, tinha na figura do capitão, o goleiro Poy, uma das principais figuras em campo. Gino e Canhoteiro também eram grandes nomes, mas o destaque e a principal honra da partida coube a outro jogador…

O primeiro gol da história do Morumbi nasceu no 12º minuto e foi assim narrado pela Gazeta Esportiva Ilustrada, daquela quinzena de outubro de 1960: “partindo a ação no flanco esquerdo, com Canhoteiro e Gino. Deste a bola rolou para Fernando Sátyro, isolado nas proximidades da área. O médio preferiu não cerrar, largando passe largo para a direita onde se achava deslocado Jonas, que executou um centro a meia altura. A bola foi encontrar Peixinho na pequena área envolvido por vários adversários. Enquanto estes ficavam na expectativa, o “filho de Peixe” testou baixo para as redes de Anibal”.

Peixinho deixando o nome na história / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

O gol foi o único da partida festiva. Como não poderia deixar de ser, o São Paulo começou a trajetória histórica no Morumbi com vitória. Peixinho, assim chamado por ser filho do antigo jogador, também artilheiro, Peixe, afirmou à mesma Gazeta Esportiva Ilustrada: “Hoje sou o mais feliz de todos os são-paulinos. Quando vi a bola “beijar” as redes, senti vontade de chorar, rir, pular feito um doido. E acho que não era para menos. De qualquer forma, meu nome vai ficar na história do nosso grande estádio. E eu, como jogador de futebol e como são-paulino, não quero mais nada na vida!”

Poucos lembram se Arnaldo Poffo Garcia ganhou ou não ganhou mais títulos por onde passou, mas todos lembram, claro, do lance que o eternizou. Do gol histórico, o primeiro gol do Morumbi. Tanto que o estilo de gol que realizou naquele dia ficou conhecido desde então, até hoje, como a jogada “peixinho” (pular “de cabeça” em direção a bola, e assim, atirá-la para o gol).

O Morumbi no dia 2 de outubro de 1960 / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Encerrada a partida, as personagens do jogo eram somente elogios ao novo estádio e ao São Paulo Futebol Clube: Gonzalez (técnico do Sporting) – “Estou satisfeito, muito satisfeito, por ter tido a felicidade de presenciar um espetáculo assim. Parabéns ao Tricolor”. Poy, feliz, disse: “Se eu parasse de jogar futebol hoje, nada teria faltado na carreira”.

Laudo Natel, o sucessor de Cícero Pompeu de Toledo, que levou a cabo a construção do Gigante do Morumbi e que costuma dizer que o Morumbi foi o fruto de fé e perseverança, completou: “O público prestigiou a nossa festa dando-nos a alegria de ver o estádio quase que totalmente lotado. Quero agradecer a são-paulinos, palmeirenses, corintianos, lusos, santistas, enfim, quero agradecer a todos que hoje aqui compareceram. Eles viveram conosco estes grandes momentos da vida do São Paulo e do desporto paulista e brasileiro”.

Ademar, Poy, Gildésio, Fernando Satyro, Riberto, Victor e Serrone (roupeiro); Peixinho, Jonas, Gino Orlando, Gonçalo e Canhoteiro / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

São Paulo Futebol Clube 1 x 0 Sporting Club de Portugal

SPFC: Poy; Ademar, Gildésio, Riberto, Fernando Sátyro, Victor, Peixinho, Jonas (Paulo Lumumba, depois Cláudio Garcia), Gino Orlando, Gonçalo e Canhoteiro (Roberto Frojuello). Técnico: Flávio Costa

SCP: Aníbal; Lino, Morato, Hilário, Mendes, Júlio, Hugo, Faustino, Figueiredo (Fernando), Diogo (Geo) e Seminário. Técnico: Alfredo Gonzalez

  • Gol: Peixinho, 12′ do 1º tempo
  • Árbitro: Olten Ayres de Abreu
  • Renda bruta: Cr$ 7.868.400,00
  • Renda líquida: Cr$ 7.779.900,00
  • Público pagante: 56.448
  • Público presente: 64.748

Logo no primeiro jogo, o Morumbi já estabeleceu um recorde: a renda obtida foi a maior na história do futebol no Brasil, até então.

Friedenreich entre os homenageados / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Os festejos de inauguração do Morumbi duraram uma semana. No domingo posterior ao debut, o São Paulo promoveu uma série de eventos em jornada de rodada dupla. Na preliminar, um time formado por veteranos do Tricolor (composto praticamente por integrantes do famoso Rolo Compressor, dos anos 40) enfrentou a Seleção Paulista.

Veteranos do São Paulo 0 x 3 Veteranos da Seleção Paulista

SPFC 1º tempo: King (Fernando); Savério e Renato (Castanheira); Herculano Squarza; Azambuja e Hélio Silveira (Hélio Leite); Mendes, Jofre (Américo), Eliseo (Antoninho Campos), Leopoldo e Vignola. 2º tempo: Gijo (Doutor); Piolim (Savério) e Virgílio (Turcão); Jacó, Rui e Noronha; Luizinho, Sastre, Ponce de León (Friaça), Remo e Teixeirinha.

Seleção 1º tempo: Lourenço, Falco, Lorico, Belacosa, Tinoco, Ceci, Levorato, Lima, Neco, Paulo e Agostinho. 2º tempo: Oberdan, Caieira, Lorico, Machado (Luizinho), Og Moreira e Ceci (Beni), Coutinho (Ministro), Lima, Araken, Paulo (Álvaro) e Hércules.

Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

150 jovens da fanfarra do Instituto de Educação Dr Washington Luis Pereira de Sousa, de Mogi das Cruzes – campeões do interior paulista desse tipo de parada musical – desfilaram na pista do Morumbi entre a partida preliminar e a principal.

A associação Ases de Rodas, que cuidava de pessoas com necessidade de uso de cadeiras de rodas, também foi homenageada: percorreram o anel de atletismo vestidos com camisas de todos os clubes integrantes da primeira divisão da FPF.

Os três convidados / Álbum de Inauguração do Morumbi

No jogo de fundo, o Tricolor enfrentou o Nacional do Uruguai. Para esta partida foram convidados jogadores de outros times para alinharem-se com a camisa são-paulina a fim de que o Morumbi fosse apresentado aos torcedores desses clubes. Pelé foi a ausência sentida de última hora, contundido (Olavo, do Corinthians, pelo mesmo motivo também faltou).

Julinho Botelho e Djalma Santos, do Palmeiras, Almir Pernambuquinho e Ari (este, ficou somente no banco de reservas), do Corinthians, porém, vestiram o manto e ajudaram o Tricolor a golear os uruguaios por 3 a 0, gols de Canhoteiro e Gino Orlando (duas vezes).

São Paulo Futebol Clube 3 x 0 Club Nacional de Football

SPFC: José Poy; Djalma Santos, Gildésio (Gérsio) e Riberto; Fernando Sátyro e Victor; Julinho Botelho, Almir Pernambuquinho, Gino Orlando, Gonçalo e Canhoteiro.

CNF: Sosa; Troche, Di Fábio, Messias (Martinez), Ruben Gonzalez, Collazo, Hector Nuñez (Avalo), Hector Rodrigues (Aloes), Rodrigo, Leopardi e Escalada.

  • Gols: Canhoteiro, 24/1; Gino Orlando, 4/2; Gino Orlando, 44/2
  • Árbitro: Romualdo Arppi Filho
  • Renda bruta: Cr$ 3.099.000,00
  • Renda líqüida: Cr$ 3.000.010,00
  • Público pagante: 22.954

 

FÉ E PERSEVERANÇA – POR LONGOS 18 ANOS

Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Em 1961, o Morumbi se conectou ao resto do mundo. A linha de ônibus Largo de Pinheiros-Morumbi foi inaugurada em 21 de setembro. Neste ano o São Paulo ainda desembolsaria Cr$ 46.152.000,00 com a construção de duas torres de concreto e instalação de cabines e outras instalações elétricas (Civilsan). Iluminação, contudo, só veio, e de modo provisório, em 1968. Por fim, construiu mais 6 vãos de arquibancada, ao valor de Cr$ 114.736.436,00 (Cia Construtora Nacional S/A).

Com o Morumbi a meio caminho andado, a diretoria voltou a atenção para o patrimônio social. Em 26 de outubro, o Conselho Deliberativo instituiu o Título Patrimonial, ao custo de Cr$ 100.000,00 a adesão. Logo de cara, 7.500 foram vendidos. O título financiou a construção do parque aquático, dos vestiários, das instalações hidráulicas, elétricas, de manutenção e de tratamento de águas, orçada em Cr$ 55.126.486,00 (Civilsan). Quadras e outros empreendimentos arredondaram a conta para cerca de 100 milhões. O Complexo Social foi inaugurado em 30 de setembro de 1962.

Propaganda dos títulos patrimoniais / O Estado de São Paulo de 27 de outubro de 1965

Relatórios financeiros da Construção do Estádio do Morumbi até 1961.

As principais despesas da construção do Morumbi, assim descritas:
Anteprojetos de Construção: Cr$ 120.000,00
Projeto e execução de Vilanova Artigas: Cr$ 100.000,00
Terraplanagem: Cr$ 3.270.396,00
Fundações: Cr$ 20.000.000,00
Galeria de águas: Cr$ 2.410.279,00
Sistema de drenagem: Cr$ 4.382.437,00
Túneis, irrigação e outras obras: Cr$ 6.010.400,00
Gigantes 49-55, cativas inferiores 45-49 e 55-70: Cr$ 78.681.571,60
Hidráulica e Elétrica: Cr$ 1.255.104,60
Preparatórios de inauguração: Cr$ 7.000.000,00
Muro de entorno: Cr$ 4.000.000,00
Outros (material de construção, bancos, etc): Cr$ 114.239.424,60

Total: Cr$ 241.469.612,80

Enquanto que as principais fontes de receitas foram as seguintes:
Cadeiras cativas: Cr$ 250.095.750,00
Títulos Patrimoniais: Cr$ 191.438.700,00
Contrato com Companhia Antárctica Paulista: Cr$ 5.000.000,00

Total: Cr$ 446.534.450,00

Em verdade, o valor arrecadado pela Campanha de Títulos Patrimoniais foi investido, também e até 1962, na construção do Complexo Social. Sendo assim, os rendimentos obtidos pela venda de cadeiras cativas (resultado do montante lançado no passivo, no quadro abaixo, subtraída a quantia ainda por receber, no ativo) e pelo contrato de concessão de exploração de bares e lanchonetes com a Companhia Antárctica Paulista – um total de 255.095.750,00 – foram os principais fomentadores da Construção do Estádio do Morumbi, estipulado, até então, em Cr$ 241.469.612,80, conforme também consta no balanço abaixo ilustrado sob o item “Construção da Praça de Esportes”.

O primeiro “busão” que partiu para o Morumbi / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Balanço patrimonial da Comissão Pró-Estádio até 1961

Ativo

Bens Imobilizados
Bens imóveis: Cr$ 9.575.200,00
Móveis e utensílios: Cr$ 1.154.567,50
Construção da Praça de Esportes: Cr$ 241.469.612,80
Total Cr$ 252.199.380,30

Valores Disponíveis
Caixa: Cr$ 1.259.047,50
Bancos: Cr$ 7.792.988,90
Total: Cr$ 9.052.036,40

Créditos da Comissão
Contas correntes devedores: Cr$ 350.687,60
Cadeiras Cativas a Integralizar: Cr$ 28.243.350,00
Títulos Patrimoniais a Integralizar: Cr$ 356.021.300,00
Total: Cr$ 384.615.337,60

Valores em Transição
Obras Contratadas: Cr$ 133.337.300,60
Saldo de exercício: Cr$ 196.730.226,70
Total: Cr$ 330.067.527,30
Final: Cr$ 975.934.281,60

Passivo

Fundo de Garantia
Cadeiras Cativas: Cr$ 279.199.100,00
Títulos Patrimoniais: Cr$ 547.460.000,00
Total: Cr$ 826.659.100,00
Responsabilidades da Comissão
Conta correntes credores (curto prazo): Cr$ 6.899.984,00
Títulos a pagar (longo prazo): Cr$ 109.019.757,60
Hipotecas a pagar (longo prazo): Cr$ 26.995.000,00
Compromissos por compra de terrenos (longo prazo): Cr$ 860.440,00
Total: Cr$ 143.775.181,60

Passivo em Transição
Contas de concessões futuras: Cr$ 5.500.000,00

Final: Cr$ 975.934.281,60

Morumbi: destino final / Acervo Folha Press

O período que se seguiu foi de grande estagnação. Os recursos financeiros líquidos rapidamente foram consumidos. Os valores obtidos pelos títulos patrimoniais e cadeiras cativas eram significativos, mas obtidos a longo prazo. O reduzido capital foi investido na compra do último lote do terreno, de 29.584m², junto a Aricanduva, para expansão do Social. Cr$ 8.875.200,00 pagos em suaves parcelas.

Sem o suficiente em caixa, o Morumbi nada avançou de 1961 a 1968. No período em que o Tricolor mais se dedicava à areia, pedra e cimento, contudo, surgiu um ídolo incrível: Roberto Dias. Certa vez, o técnico são-paulino, Aimoré Moreira, ao ser questionado sobre o que ele precisaria pra transformar o time em um clube novamente campeão, respondeu: Dez Dias.

Quadros que atestam: de 1961 a 1968 só um setor construído / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Talvez, o ícone dessa década seja melhor explicado por este simples poema de Alex Popst:

Nos anos sem casa…
No tempo sem teto.

Nos anos de
cimento;
chumbo
e concreto.

Dias de paz…
Classe
E Roberto.

O primeiro sistema de refletores / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Foi justamente neste período de poucos avanços que o presidente do São Paulo, Laudo Natel, iniciou sua carreira política. Eleito Vice-Governador do Estado, por chapa independente, em 1962, assumiu o cargo majoritário por oito meses, entre 1966 e 1967. Após cumprir seu mandato, não voltou a desempenhar função pública até 1971, após a conclusão do Gigante.

Patrono do Tricolor, Laudo Natel foi o homem que tornou o sonho do Morumbi realidade. Moço do interior, cresceu na cidade grande como diretor de banco. Pelo talento administrativo, Cícero Pompeu lhe trouxe ao clube, a princípio como tesoureiro, em 1951. De cara, Natel instituiu a publicação de todos os balanços do clube – feito que ocorre desde 1952 anualmente, em veículos de grande porte. Assim, rapidamente assumiu a presidência do São Paulo, ocupando-a por sete mandatos, de 1958 à 1971. Em 1970, após 18 anos de obras e sacrifícios, Laudo entregou aos são-paulinos o maior patrimônio. Para coroar, ainda mobilhou a casa com grandes ídolos, como Gerson e Pedro Rocha, além de títulos (Paulistas de 1970 e 1971).

Na época da inauguração: ninguém nas vizinhanças / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Não contando com qualquer ajuda governamental, o Morumbi só voltou a crescer, e a passos largos, em 1968, com o advento do fantástico Carnê Paulistão. “A Grande Jogada é Construir o Paulistão” foi uma campanha idealizada por Hélio Setti e Oswaldo Molles. Na TV Excelsior, nos intervalos das novelas, sorteava-se prêmios para aqueles que estivessem em dias com as suas mensalidades.

O nome Paulistão foi uma tentativa de se apelidar o Estádio Cícero Pompeu de Toledo como simbolo de toda a população do Estado. Apesar do sucesso do produto comercial, a alcunha, em si, jamais pegou. Nesse aspecto, o estádio sempre foi o Morumbi.


Carnê da série original / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Com tiragem inicial de 100.000 unidades, o carnê foi tão bem sucedido que ganhou outras seis séries, totalizando 700.000 carnês, vendidos a NCr$ 5,00 (cada qual com 12 prestações no mesmo valor). Outros clubes, posteriormente, adotaram a mesma prática, inclusive pressionando o São Paulo a romper sua patente. Os carnês concorrentes não vingaram, e o Tricolor, então, se comprometeu a repassar-lhes uma quota de seus ganhos.

Com as finanças em dia (sobrou dinheiro até para contratações de craques como Gérson, Toninho Guerreiro, Pedro Rocha, Forlán…), o que o São Paulo não pôde realizar em oito anos, o fez em dois. Ao custo de NCr$ 6.890.000,00 (Cia Construtora Nacional S/A, Servix Engenharia S/A & Enbasa Engenharia e Comércio S/A)), o estádio enfim foi concluído no dia 20 de dezembro de 1969. Só faltava a festa para a entrega da obra concluída, que aconteceu de 25 de janeiro de 1970.

Anos 70: o bairro ainda é deserto / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

A inauguração definitiva do estádio se deu em partida contra o Porto, de Portugal. O Estádio possuía, então, capacidade para 149.408 pessoas.

SÃO PAULO Futebol Clube 1 x 1 Futebol Clube do PORTO

SPFC: Picasso; Édson Cegonha (Cláudio Deodato), Jurandir, Roberto Dias e Tenente; Lourival e Gérson; Miruca, Zé Roberto (Téia),Toninho Guerreiro (Babá) e Paraná. Técnico: Zezé Moreira

Gols: Miruca, 35’/1.

FCdP: Vaz; Acácio, Valdemar, Vieira Nunes e Sucena; Pavão e Gomes; Chico (Celinho), Pinto (Ronaldo), Rolando e Nóbrega. Técnico: Elek Schwartz.

Gol: Vieira Nunes, 32’/1.

  • Árbitro: José Favilli Neto
  • Renda: NCr$ 440.258,00
  • Público: 107.869 pagantes

Gerson contra o Porto / Arquivo Histórico do São Paulo Futebol Clube

Realmente, como diz Laudo Natel, a construção do Morumbi foi uma obra de igreja, realizada com o que se podia, aos poucos, pela venda de ideias, fazendo jus ao um belo mote: Fé e Perseverança. E já que era um sonho, que fosse grande! Sempre fazendo o possível primeiro, e o impossível depois.