Meia do São Paulo nunca viu o Peru jogar um Mundial, mas vibrou com Ronaldo e Ronaldinho em 2002, e agora fala em unir o país no retorno após 26 anos
Christian Cueva nasceu no dia 23 de novembro de 1991. A última partida do Peru numa Copa do Mundo foi no dia 22 de junho de 1982. Quando o meio-campista do São Paulo vir pela primeira vez a sua seleção disputar o torneio mais importante do planeta, estará num lugar privilegiado: dentro de campo, na estreia contra a Dinamarca, no dia 16 de junho, na cidade de Saransk.
Sua relação com a Copa está nas lembranças de garotinho, quando comprava pipocas para assistir ao Brasil dos ídolos Ronaldo e Ronaldinho ser pentacampeão, em 2002.
Neste “Papo de Copa”, Cueva falou ao GloboEsporte.com sobre a adoração pela seleção brasileira, a torcida por Neymar contra o “seu” Real Madrid, a importância do técnico argentino Ricardo Gareca para o retorno do Peru ao Mundial e até mesmo sobre a polêmica participação do país na Copa de 1978, quando a equipe foi goleada por 6 a 0 pela Argentina, que precisava desse placar para ir à final, em casa. Desde então há suspeitas e denúncias de que o resultado foi vendido.
Cueva também falou sobre um assunto mais terno: a primeira herança que deixará ao filho Luis Crissiano, que estará para nascer nas próximas semanas: a sua figurinha no álbum da Copa.
– Não troco por nenhuma. Deixa minha figurinha, minha esposa está grávida de um menino. Que Deus permita que ele nasça bem, tranquilo, e eu possa deixar as figurinhas do pai para ele.
Veja a íntegra da entrevista:
GloboEsporte.com: Você nasceu noveanos depois da última participação do Peru numa Copa do Mundo. Como é a relação de um jogador que nunca viu sua seleção disputar o torneio?
Cueva: Para mim sempre foi lindo ver minha seleção jogar e ter essa ilusão de criança de ela pudesse disputar uma Copa do Mundo. Lógico que quando menino você tem aspirações de jogar por sua seleção. Seria bom ter visto o Peru num Mundial, mas agora tenho a oportunidade de batalhar por um lugar no grupo, na equipe, e será muito importante para mim, meus companheiros e o país. Vamos sentir o que se perdeu há muitos anos. O Brasil sempre esteve e facilita muito para a criançada ver futebol com seu país disputando. Nosso objetivo é participar, competir e chegar o mais longe possível, e que nosso país cresça com isso.
Mas você assistia à Copa do Mundo mesmo sem o Peru participando?
Lógico, todo mundo parava para assistir. Eu sou um admirador da seleção brasileira, meus ídolos são Ronaldo e Ronaldinho. Eu tinha muitas ilusões de ver meu país numa Copa do Mundo. Estivemos perto em muitas eliminatórias, com jogadores extraordinários. Eu sentia que tínhamos potencial, e aconteceu comigo, conosco, com Paolo (Guerrero) e Farfán, que estiveram por tanto tempo na Europa e mereciam jogar um Mundial.
Na Copa de 1998 você tinha 6 anos, lembra-se de alguma coisa ou suas memórias começam em 2002?
Eu me lembro da França campeã em 1998, mas as recordações são de 2002. Eu me lembro muito da volta do Fenômeno, eu somente comprava pipoca para assistir ao Brasil com Roberto Carlos, Rivaldo, aquela variedade de jogadores. Era muito lindo ver. Não é porque jogo no Brasil, as pessoas podem realmente pensar isso, mas Ronaldo e Ronaldinho são meus ídolos máximos mesmo, apesar de Messi ser um monstro. Ronaldinho jogava com tanta alegria, fazia coisas que muitos não conseguem nem brincando num treino. Era uma coisa de outro mundo.
“Ronaldinho jogava com tanta alegria, fazia coisas que muitos não conseguem nem brincando num treino. Era uma coisa de outro mundo.”
Então seus maiores ídolos são Ronaldo, Ronaldinho Gaúcho e Messi?
Exato. E Cristiano. E não quero me esquecer deste fenômeno que é o Neymar. Sou torcedor do Real Madrid desde a época dos galácticos, mas, sinceramente, torci pelo PSG na Liga dos Campeões. Eu me inclinei pelo Neymar porque ele poderia ter a oportunidade de passar a uma fase seguinte e, pensando numa final, ser o melhor do mundo. Eu gostaria de ver isso.
Por suas preferências, nota-se o gosto por um futebol mais lúdico, mais mágico, é uma tendência dos sul-americanos?
Sim, o talento que temos é para jogar futebol dessa maneira, com habilidade. Essa classificação do Peru para a Copa do Mundo vai mudar muitas coisas no país, tenho certeza de que vamos crescer. Há algum tempo o Peru já era a seleção que jogava mais bonito depois do Brasil no continente, com jogadores extraordinários, como Sotil, Cubillas, Cueto, mas os resultados não vinham
E o que mudou para que os resultados agora viessem e o Peru se classificasse?
Gareca. Sua comissão técnica e ele, em especial, foram fundamentais. O trabalho do grupo, sempre concentrado e unido, indepndentemente dos resultados porque no primeiro ano das eliminatórias somamos só quatro pontos. Todos falavam que não seria possível alcançar a classificação, mas lutamos, nos concentramos, trabalhamos. E a satisfação maior quem nos dava era Ricardo (Gareca), a todo momento nos estimulando, dizendo que tínhamos talento, trabalho, éramos boas pessoas. A mentalidade dele de ganhador nos contagiou muito. Somos ganhadores porque conseguimos estar em ligas fora do Peru ou fortes no futebol do país, somos perseverantes, mas ele nos levou a ter a cabeça mais forte. Disse que seguiríamos cometendo erros, mas nunca faríamos nada com maldade. Agora temos de manter isso, não podemos perder, e ir à Copa do Mundo realmente para competir, e não simplesmente disputar. Será uma nova experiência para nós, o primeiro passo será a Dinamarca, e um Mundial sempre será difícil.
Mas o Peru precisa fazer com que seja difícil para os adversários também, certo?
Exato, mutuamente. Será igual tanto para nós quanto para eles. Estou convencido de que temos mentalidade e qualidade humana para enfrentar esse tipo de partidas. Temos que ir com humildade e respeito, mas que nos respeitem também.
O jogo contra a França, campeã do mundo, será especial?
Lógico, mas já enfrentamos Brasil e Argentina numa competição muito dura que foram as eliminatórias. Temos essa bagagem. Enfrentar a França numa Copa do Mundo será muito lindo, mas temos que fazer com personalidade e gana de vencer. Será importante para o Peru ganhar uma partida de Copa do Mundo e avançar. É o que sonhamos.
“Será importante para o Peru ganhar uma partida de Copa do Mundo e avançar. É o que sonhamos.”
Você tem bastante contato com o Guerrero, como ele está? Louco para voltar a jogar?
Está louco, isso sim, ele quer jogar, estar no grupo normalmente, mas está se preparando como sempre fez, é um profissional. Ele esteve triste pelo que passou, mas acredito que os tempos de Deus são sempre perfeitos, e agora ele tem tempo para se preparar antes da Copa do Mundo, que era seu sonho há muito tempo, pela qual ele lutou a cada eliminatória. Mesmo com esse tempo sem jogar, a experiência e o tamanho dele farão com tudo seja mais fácil.
Nota da redação: Guerrero foi suspenso por doping dia 3 de novembro – nos primeiros 30 dias, a punição era preventiva. Ele retornou aos treinos no Flamengo no dia 20 de março – como parte do protocolo de atividades permitidas aos atletas no mês e meio final (45 dias) antes do fim da suspensão de seis meses.
A Copa do Mundo terá grandes centroavantes, como Suárez, Harry Kane e Lewandowski. Em que patamar você vê o Guerrero nessa disputa?
Paolo está no nível deles. Logico que não estar competindo há vários meses pode atrapalhar, mas a experiência o fará controlar as coisas da melhor maneira. É um jogador de altíssimo nível.
E como vê o Brasil? Você fez quatro jogos contra a Seleção nos últimos três anos. Notou em campo uma grande evolução depois que Tite assumiu?
O Brasil evoluiu muito, os resultados antes não foram favoráveis, e isso é normal no futebol. O Brasil tem potencial e jogadores suficientes para que a equipe esteja sempre bem. (Tite) É um grande treinador, mas às vezes a postura do jogador muda muito. De repente ele não está jogando, e quem chega escala, ele começa a evoluir. Com confiança e comunicação tudo pode funcionar.
Em março, José Velásquez, que disputou a Copa de 1978, disse que seis jogadores se venderam para que a Argentina goleasse e chegasse à final. Sua geração fala sobre isso? Qual é o sentimento de vocês em relação a esse fato?
Não comentamos. Eu sempre terei respeito por esses jogadores. Tenho comunicação com um deles, César Cueto, um canhoto extraordinário. Temos que representar o país e deixar uma boa imagem. É momento de todos desfrutarmos, não de brigarmos. Estamos felizes pelo Peru ir à Copa do Mundo depois de muito tempo. Cada um de nós, como jogador e pessoa, somos muito queridos no meu país. A única coisa que podemos fazer é ajudarmos uns aos outros para representarmos o país da melhor maneira. Com a experiência de uma Copa do Mundo, eles podem nos ajudar. Cada um trabalhou pelo país e cada um tem sua consciência.
E o álbum de figurinhas da Copa do Mundo? Coleciona?
Sim (risos). Sim, sim, sim, agora vou voltar aos meus tempos de criança, mas com minha seleção. E vendo se estou por aí (risos).
E quando tiver a figurinha do Cueva repetida?
Não troco. Não troco (risos). Não troco por nenhuma. Deixa minha figurinha, minha esposa está grávida de um menino. Que Deus permita que ele nasça bem, tranquilo, e eu possa deixar as figurinhas do pai para ele.