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Bruno Grossi
- Marcio Komesu/UOL EsporteAos 36 anos, Nenê curte fase de “xodó” da torcida do Tricolor Paulista
O São Paulo surpreendeu ao apostar em Nenê como reforço para esta temporada. Depois de chegar em alta no Vasco da Gama em 2015, o meia-atacante já não vivia a melhor fase no Rio de Janeiro quando foi anunciado pelo Tricolor. Houve quem questionasse o risco de contratá-lo pelos 36 anos de idade ou quem argumentasse que o time já contava com Christian Cueva, que o negócio não era necessário.
Em quatro meses, no entanto, o veterano se consolidou como o grande nome da equipe na temporada, ganhou o carinho da torcida e é o pilar da campanha invicta no Campeonato Brasileiro. Neste sábado, Nenê terá a chance de intensificar esse bom e surpreendente momento da carreira. Pela nona rodada da Série A, o São Paulo tentará vencer o rival Palmeiras pela primeira vez desde que o Allianz Parque foi inaugurado.
O meia tem chamado a responsabilidade nos jogos grandes de 2018, como foi nos clássicos contra Corinthians, no Campeonato Paulista, e Santos, no Brasileirão. E triunfar sobre os alviverdes seria essencial para o sonho individual e coletivo, de torcedores a dirigentes, de conquistar um título para o Tricolor.
“Não estamos prontos, mas estamos no caminho certo para conseguir esse objetivo. E espero que seja ainda neste ano. Realmente é o que mais esse clube precisa e a gente pode oferecer. Temos um elenco que pode, uma estrutura maravilhosa, não temos problema nenhum. A torcida, claro, pressiona por resultados, mas está sempre com a gente, nos apoia. Temos tudo para quebrar esse tabu. Essa é a minha maior motivação. E o carinho que estou recebendo de todos, jogadores, comissão, diretoria e torcida, também me deixa ainda mais motivado”, ressaltou.
Nenê recebeu o UOL Esporte no CT da Barra Funda para conversa de quase 40 minutos, em que falou ainda sobre a amizade com Neymar e como isso ajudou o Paris Saint-Germain a contratá-lo no ano passado. O meia também disse que merecia chances na seleção brasileira enquanto defendia o clube francês e lamentou o patrulhamento sobre o que figuras públicas falam, fazem ou pensam.
Amizade com Neymar e ‘forcinha’ para o PSG
Nós ficamos amigos quando ele já estava no Barcelona. Já o conhecia antes, mas não de amizade. Quando eu estava no Santos, ele já era da base. Nem sabia disso, ele que acabou me contando. Fiquei muito feliz com isso, até disse que gostava do meu futebol. Aí fizemos um jogo beneficente na minha cidade, em Jundiaí, e a partir daí começou a amizade. Acho que há cinco ou seis anos já. Começamos a ficar muito próximos.
É uma pessoa maravilhosa fora do futebol, tem um coração enorme. Continua o mesmo que era antes. Admiro bastante e me identifico com isso. A gente conversou antes dele ir para lá. Dei minha opinião e acabou acontecendo o que tínhamos falado. Eu falo para ele: “poxa, eu tenho minha opinião pensando sempre o melhor para você, pensando no que você pode conquistar”. Foi antes dele se decidir. Fiquei feliz com a decisão dele. Sabia que ele realmente poderia fazer história lá, um clube maravilhoso. Acredito que será o melhor do mundo jogando lá.
Seleção brasileira deixou lacuna na carreira
Acho que pesou ter saído muito rápido do Santos, do Brasil (em 2003). E acabei indo para um time mediano, que era o Mallorca. Tive que trabalhar muito para continuar crescendo. Fui para o Celta, para o Monaco, já um time melhor, até chegar ao Paris. Foram alguns momentos em que acreditava que poderia ter sido convocado e ter uma sequência na seleção. Acabou não acontecendo. Alguns treinadores chegaram a falar e quase fui convocado quando estava no Paris Saint-Germain. E até acho que deveria ter sido. Era o Mano (Menezes, hoje no Cruzeiro), eu acho. Às vezes você pensa mais no lado financeiro, na família, não no âmbito esportivo… Mas fico tranquilo, não tenho nenhum problema quanto a isso.
Arrependimento por deixar o Brasil cedo
Antes de jogar bola, o sonho é ser profissional. Depois é jogar num clube grande, depois na Europa. Aí você pensa que aparece uma chance e você tem que ir na hora. Só que às vezes não é bem assim. Eu mesmo acredito que fui muito cedo. Saí com 20, 21 anos e estava muito bem na época no Santos, cotado para ir para a seleção. Não sei se faria a mesma coisa hoje, com a cabeça que tenho. Mas, claro, a gente tem que ter a experiência por si próprio, quebrando a cabeça ou realizando sonhos de infância. Às vezes você ouve pessoas do seu entorno que, não por mal, mas acaba dando uma opinião que não seria a ideal para você. Talvez em termos imediatos, pareça ideal, mas não em longo prazo.
Pedro Vale/AGIF
Preconceito com quem passa dos 30
Isso é uma coisa que a gente está quebrando um pouco. Antes os clubes tinham medo de contratar jogador mais velho, porque não aguentaria o ritmo, porque machuca muito. Então antes de voltar ao Brasil, eu tinha essa resistência. E vi essa desconfiança quando você chega a um clube. Será que vai render como antes? Vejo como algo normal, mas também como uma motivação de mostrar que eu posso ainda jogar em alto nível por vários anos. Graças a Deus, eu sempre me cuidei muito na carreira toda e nunca tive lesão. Isso ajudou muito.
Ter estado fora do Brasil também ajudou, foram menos jogos do que seria aqui, a temperatura mais amena. Não digo que sofro com esse preconceito, porque acho normal e sempre tento levar para o lado positivo. Vamos mostrar que eles estão errados. Eu gosto muito de desafio. Sempre tive a cabeça boa para fazer disso um combustível de motivação, para me sobressair das dificuldades. Acho que sou um exemplo hoje.
Treinos ‘high tech’ são parte do segredo da longevidade
São treinos de eletroestimulação. Comecei a fazer isso ainda no Vasco, com o Alex Evangelista, que sempre trazia coisas de fora, modernas, que ajudariam na nossa recuperação, na melhora da forma física e tudo mais. É um aparelho que reestimula fibras do corpo que você vai perdendo com o tempo. Hoje, principalmente jogador de futebol, com a intensidade que tem, a gente precisa continuar na mesma velocidade de antes, se não fica para trás. Foi em acordo com o clube, com o pessoal da fisioterapia, o Altamiro (Bottino, coordenador científico) e o Marquinhos (fisiologista). São treinos rápidos, em que você não faz muito esforço. São 20 minutos, mas é como se você tivesse feito um trabalho forte de academia. É como se fosse para a academia, sem ficar se mexendo muito, e estimula essas fibras que você vai perdendo depois dos 30 anos.
Clubes brasileiros evoluíram em estrutura
No Brasil são mais jogos, é mais desgastante. E os treinos aqui são mais longos e mais moderados em termos de intensidade. Na Europa é curtinho, e muito intenso, muito forte. Eles usam muito essa parte de prevenção de lesão e isso é algo que está mudando muito aqui no Brasil. Já está ficando mais com essa noção, vendo que muitos machucavam, então é melhor prevenir. Está mudando essa mentalidade e o Brasil está muito melhor do que antes. E tem diferença de estrutura, que está mudando, os clubes estão se conscientizando e vendo que sem se prevenir, sem ter estrutura bacana no dia a dia, as coisas não acontecem.
Aguirre deu identidade que faltava ao São Paulo
Eu já o conhecia. Tivemos a oportunidade de trabalhar três meses no Qatar. Estou gostando bastante o time também, da liderança e da intensidade como ele faz as coisas. Estamos entendendo a filosofia dele, criamos uma identidade. Acho que isso estava faltando. Os treinos são bons, de uma maneira mais europeia, e como eu fiquei muito tempo lá fora, gosto bastante. Está indo bastante bem.
Marcello Zambrana/AGIF
Pressão por títulos é sombra do passado
A pressão tem o tamanho que tem por estarmos há muito tempo sem títulos. O São Paulo é um dos maiores clubes do Brasil e sempre ganhou vários títulos e títulos importantíssimos, que muitos outros do país não conquistaram. Então é normal você vê um clube que não ganha há muito tempo aumentar a pressão a cada ano. E a gente traz um pouco desses momentos de ultimamente. A pressão só aumenta, mas isso é normal para um profissional. O jogador de futebol sabe que tem de lidar com isso. Aqui está sendo um pouco mais do que o normal, mas faz parte. Que os títulos possam chegar e a gente possa voltar a dar alegria ao torcedor, que merece. É um clube que merece muito essas conquistas.
Carinho por Lugano e Raí
Eu ajudei muito o Lugano lá no Paris Saint-Germain, então por isso que ele me ajudou aqui… Brincadeira (risos). É um cara espetacular, de um exemplo tremendo pela história que teve no São Paulo. A gente já falava há um tempo atrás dessa possibilidade, que acabava não dando certo das outras vezes. E a relação é muito boa. Um cara honesto, trabalhador e vencedor. E eu me identifico com ele porque sou muito assim também. Se não ganhar, eu fico maluco. Não gosto nem de perder os joguinhos do treino. Ele é assim e eu me identifico muito.
O Raí também é um cara excepcional, um dos maiores ídolos da história do clube. E era meu ídolo quando era moleque. Eu torcia para o São Paulo e via o Raí na televisão, jogando, sendo campeão mundial. Depois fui jogar no time dele na França, com o mesmo número na camisa e agora jogar aqui… É algo que me deixa muito feliz. Está sendo especial.
Pais corintianos foram os primeiros “alvos” de uma personalidade forte
Eu não era muito fanático, mas eu vivia na rua jogando bola e era o time que enchia os olhos da criançada. Meu pai e minha mãe eram corintianos e ficavam “não, você tem que ser corintiano, e não sei o quê” (risos). E eu realmente já tinha uma personalidade forte desde criança e era decidido com as coisas. falei: “não, vou ser são-paulino”.
Eliminações deixaram Nenê “puto da vida”
Fiquei muito frustrado com a Copa do Brasil, porque tínhamos uma chance grande de passar. E merecíamos, pelos jogos que fizemos. Também no Paulista. Fiquei uma semaninha, vamos dizer, puto da vida. Mas a gente fez um trabalho extraordinário, por ter sido tão rápido e tantas mudanças. Em relação ao resto, estou muito bem adaptado. Estou em casa, minha família é de Jundiaí, então estou sempre com meus filhos. Essa era uma coisa que eu sentia falta. Está sendo de um jeito que eu esperava, mas posso melhorar ainda mais e continuar demonstrando meu trabalho e minha capacidade, para seguir dando a vida e conquistar títulos por esse clube.
Futebol ficou mais chato
Está bem mais chato. Um cara com mais personalidade tem mais dificuldade de se posicionar, porque hoje em dia qualquer coisa todo mundo está sabendo. Antes não tinha isso. Hoje a gente sabe de qualquer coisa que acontece do outro lado do mundo em dez minutos. Não tinha isso. Então, a exposição é muito maior. Isso acho que complica muito e tira a sua naturalidade. Há um receio de ser sincero ou natural. Sei lá, ser do jeito que você é, porque acaba passando uma imagem errada. Muita gente acaba nem falando mais por causa da exposição.
Rede social e fake news
É o tempo inteiro (cobranças via rede social), pessoas que nem sabem o que você está passando, ou o dia a dia, e acaba vendo um lance do jogo, um chute que o cara deu errado. E aí, ele escreve. Às vezes a pessoal nem viu, ela viu só um vídeo de Whatsapp ou um título de uma matéria e acaba tendo essa imagem da pessoa, do clube, ou do momento. E não é a verdade. Você tem de saber lidar com isso, também. Mas no geral gosto bastante de rede social. É uma coisa que nos aproxima muito do torcedor, de ver o nosso dia a dia, de ver como somos fora do mundo profissional.
Encarada em Carille ficou no passado
Foi algo ali de momento, não foi nada em relação ao Corinthians. Ele acabou me xingando antes e tal, mas era calor do jogo. E acabei, na hora que passei perto, olhando para ele também. Mas nós conversamos e nos desculpamos. Depois, conversamos em relação a isso depois, ele também me disse que foi algo que resolveu no dia e, como eu disse, não tinha nenhuma característica de falta de respeito. Mas aí, você acaba, como falei, passando algo que não é.
Sou o que sou e ninguém vai me mudar
Não [vou mudar o que sou], por isso que sempre falo que eu pego muito essa parte de pressão e de julgamento das coisas de fora, as críticas, ou desconfiança. Como acontece antes de a gente chegar em alguns lugares, por exemplo, eu sempre tendo pegar de uma maneira saudável e positiva. Procuro virar isso para poder demonstrar que essas pessoas estão equivocadas, quero ser sempre exemplo. Não adianta falar uma coisa e agir de outra maneira. Então, sempre tento agir da maneira que eu falo para que possam ver que eu estou sendo real, espontâneo e sincero com tudo que estou falando.
Felipe Massa incentivou acerto com o São Paulo…
Esse faz tempo que queria que eu viesse para cá. Ele é muito fera, também. Ele torceu muito para que eu viesse para cá. Nós conversamos antes, então, ele deu conselho de que eu deveria vir, que eu iria gostar muito e o clube era muito bom. Foi uma das pessoas que me deram o incentivo para que eu pudesse vir. A nossa amizade começou quando eu fui para o Monaco. Aliás, foi em um jogo beneficente. Eu disse que estava indo para lá, ele me disse que morava lá e acabamos sendo vizinhos, moramos no mesmo prédio lá.
Começamos a amizade nessa época, em 2006, faz muito tempo. Acabei acompanhando ele sempre que dava em vários circuitos. Em Mônaco, que é o sonho de qualquer um, Barcelona, Hungria, Abu Dhabi… Foram várias corridas, mesmo. Gostava muito e torcia muito por ele. Até que na despedida dele aqui no Brasil eu estava junto. Fiquei muito emocionado e triste também quando ele quase ganhou o campeonato mundial, no dia que o Hamilton passou (em 2008)… Achei que o Timo (Glock) deu uma rateada ali. Passou na última curva, foi muito frustrante também. Ele merecia muito esse título naquele ano, mas são coisas que fazem parte.
…mas isso tem uma contrapartida
A gente conversa sempre. Eu pergunto se ele está mudando de profissão, porque está treinando forte no futebol. Falo que quero fazer. Ele sempre fala dos jogos, fala que tem todos os canais e vê os jogos. Quando esteve em São Paulo estivemos juntos, quando foi aniversário dele. Falei que tenho de entrar com o Felipinho em algum jogo no dia que tiver a oportunidade. Ele já veio ver jogo aqui também para dar essa força quando cheguei. Então, estamos sempre juntos.