De recordes aos cantinhos preferidos dos ídolos do São Paulo: Morumbi completa 60 anos

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GloboEsporte

Edgar Alencar e Maurício Oliveira 

Estádio guarda lembranças gloriosas de alguns dos principais personagens do Tricolor.

O Estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi, já nasceu quebrando recordes. A festa de inauguração, há exatos 60 anos, aconteceu precisamente às 15h do dia 2 de outubro de 1960, um domingo. Em campo, São Paulo 1 x 0 Sporting, com gol de Arnaldo Garcia, o Peixinho. E o primeiro “borderaux” do Morumbi assim registrou a presença do público:

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“Um total de 64.748 pessoas”, destaque para os “6.500 torcedores que invadiram o estádio, sem pagamento de ingressos” estimados pela organização. E a renda recorde na época de Cr$ 7.868.400,00. Importante lembrar que o Morumbi foi inaugurado só com parte da sua arquibancada construída.

Inauguração do Morumbi: jornal da época destaca renda recorde no estado de São Paulo, na época — Foto: Reprodução

Inauguração do Morumbi: jornal da época destaca renda recorde no estado de São Paulo, na época — Foto: Reproduçãohttps://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Na época da construção, a diretoria do São Paulo recebeu três projetos de arquitetura e escolheu o de maior capacidade para receber público. Com as reformas ao longo do tempo, o Morumbi precisou encolher um pouco, mas 60 anos depois, continua um estádio impressionante.

A capacidade atual é para até 66.795 torcedores. Esse número já foi bem maior. O projeto original foi pensado para quase 150 mil pessoas. Na época, o maior estádio particular do mundo.

Estádio do Morumbi no dia da inauguração, em 2 de outubro de 1960 — Foto: Aeroclube de São Paulo/A Gazeta Esportiva

Estádio do Morumbi no dia da inauguração, em 2 de outubro de 1960 — Foto: Aeroclube de São Paulo/A Gazeta Esportiva

Já são seis décadas de marcas grandiosas. Futebol e outros tantos eventos históricos. E quem seriam os recordistas deste campo dos recordes?

Para surpresa de absolutamente ninguém, o posto absoluto é de Rogério Ceni. São 594 jogos disputados no Morumbi, 375 vitórias, 14 títulos conquistados.

– De setembro de 1990 até maio de 1994, foi literalmente o campo de jogo e a moradia. A maior emoção que eu tinha quando eu vinha jogar eram as noites de Libertadores, quando subia aquele túnel e encontrava 70 mil, 80 mil pessoas… Eu me sinto bastante feliz porque sei que dificilmente alguém subirá 594 vezes aquele túnel (para jogar pelo São Paulo) – disse Ceni, quando se despediu do São Paulo e encerrou a carreira.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

– Foi uma fase muito difícil, mas muito compensadora (quando morou no estádio). Eu aprendi a dar valor quando subi, era uma diferença muito grande, e isso fez com que eu desse muito valor. Foi uma lição de vida, morar aqui dos 17 aos 21 anos foi um aprendizado que carrego. As noites geladas… é para valorizar tudo que você ganha na vida.

A escada que dava acesso ao quarto em que Rogério Ceni morou no Morumbi — Foto: Flavio Henrique

A escada que dava acesso ao quarto em que Rogério Ceni morou no Morumbi — Foto: Flavio Henrique

Idolatria não tem prazo de validade, mas, em campo, a história de Rogério Ceni terminou em dezembro de 2015.

E ele não foi o único a se emocionar naquele dia de despedida. Muricy Ramalho, com 209 jogos à frente do São Paulo, é o recordista como técnico.

– Na despedida do Rogério, fui convidado para participar, Morumbi lotado. Eu acho que eles gritaram mais o meu nome do que o do Rogério Ceni, entendeu? Quando eu entrei, não esperava tudo aquilo não, eles gritando meu nome… Muito legal! Teve títulos, ganhei títulos, mas essa noite não dá para esquecer, não – diz Muricy.

– É praticamente a minha casa. Cheguei lá em 1964 e comecei minha caminhada com nove anos de idade. Jogava no mirim do São Paulo. Depois ia lá para o morro, o Morumbi não era fechado ainda, para ver os jogos profissionais. Eu conhecia todo o caminho. Conhecia desde o cara que mexia com as plantas, o jardineiro até o presidente do clube. Conhecia todo mundo, os porteiros. Era praticamente minha casa.

Rogério Ceni, na despedida do São Paulo, em dezembro de 2015 — Foto: Marcos Ribolli

Rogério Ceni, na despedida do São Paulo, em dezembro de 2015 — Foto: Marcos Ribolli

Expulsões e gols históricos

Do banco de reservas para as redes do Morumbi. Os recordes de gols do estádio estão divididos curiosamente entre dois artilheiros de personalidade explosiva: Serginho Chulapa e Luis Fabiano.

Chulapa fez 135 gols no estádio, sendo 88 pelo Campeonato Paulista. Fabuloso detém o recorde de gols em Campeonatos Brasileiros, com 68, e em Libertadores, com dez (empatado com Ceni).

Curiosamente, Chulapa e Fabuloso estão empatados como recordistas também em número de cartões vermelhos: 16 expulsões no Morumbi cada um.

– Expulsão? – brinca Serginho.

– Foram tantas emoções… Poderia ser mais (gols) porque eu não viajava para o interior e as confusões que eu arrumava… Tomava só gancho. Então, podia ser mais gols ainda. Mas eu estou feliz de ser o maior artilheiro de um clube como São Paulo.

Uma tradição devidamente resgatada décadas depois por outro camisa nove. Principalmente na cara do gol.

– Atacantes fantásticos que teve o São Paulo, Serginho Chulapa, lá atrás, eu não vi, Gino Orlando, Careca, Muller, França, Dodô. Fazer parte de tudo isso, fazer recordes nesse estádio, pra mim, é muito gratificante – diz Luis Fabiano, autor de 125 gols no Morumbi.https://tpc.googlesyndication.com/safeframe/1-0-37/html/container.html

Maior número de jogos, maiores artilheiros, técnico com mais jogos, vários recordistas. Mas, claro, no coração de um gigante do tamanho do Morumbi, sempre há espaço para mais ídolos. Como Zetti, um dos representantes do período mais glorioso da história do clube e do estádio: Zetti. Por suas mãos, a palavra “Li-ber-ta-do-res” entrou para o dicionário sagrado do São Paulo Futebol Clube.

– Não tem como não lembrar da defesa do pênalti do Gamboa, 1992 (contra o Newells Old Boys). Essa cena vem na minha memória acompanhada da invasão ao campo – conta Zetti.

Foram 120 mil pessoas fazendo o imenso Morumbi parecer pequeno.

No mesmo gramado, 13 anos depois, e num outro contexto de organização, a mesma festa. Agora pelo tricampeonato das Américas.

Os cantinhos preferidos dos ídolos

O Morumbi de tanta gente. De tantas histórias coletivas ou bem particulares. O “cantinho preferido” de Zetti é a trave de entrada do Morumbi.

– Esse gol de entrada é diferente. Eu tinha sempre a sensação que esse gol ia me consagrar de alguma forma. Então eu escolhia sempre no primeiro tempo, quando tinha a oportunidade, ou pedia para o Raí, que era o capitão, escolher atacar primeiro o gol da entrada pra gente poder defender esse gol no final. Era uma superstição, na época a gente sentia um poder maior na equipe quando a gente atacava o gol do fundo.

O cantinho predileto de Muricy Ramalho remete a outro gênio da história do São Paulo e do Morumbi.

– A salinha que era do Telê (Santana, bicampeão da Libertadores e do Mundo pelo São Paulo)… Telê era dono da sala. Depois fiquei eu. Ficava lá depois dos jogos, vendo os comentários da imprensa, vendo os lances mais importantes. Já subia preparado pra (entrevista) coletiva. Mas já ia abaixando a adrenalina, ficava ali tomando uma água, vendo comentários até abaixar a adrenalina pra depois ir conversar.

E o espaço de Luis Fabiano?

– Eu ficaria com esse gol (também da entrada principal do Morumbi) porque eu acho que ali eu fiz a maior quantidade de gols. Porque o gol sempre me trouxe alegria. Então meu canto preferido é ali, a bola ali dentro.

Cada ídolo com o seu cantinho no Morumbi. Cada torcedor com a sua memória. Tudo cabe neste estádio que já foi projetado para comportar uma paixão sem tamanho.

Luis Fabiano no Morumbi, durante entrevista para o Esporte Espetacular — Foto: Flavio Henrique

Luis Fabiano no Morumbi, durante entrevista para o Esporte Espetacular — Foto: Flavio Henrique