O São Paulo de Diniz, entre a convicção e a teimosia

258

GloboEsporte

Mauricio Noriega 

Ideias do treinador criam debate sobre diversas maneiras de se jogar e apreciar o futebol.

No futebol e na vida a linha que separa a convicção da teimosia é tênue. Não há conceito perfeito, estratégia infalível ou sistema à prova de erros.

Publicidade

Discordo de quem pensa existir uma única forma de se praticar o jogo mais popular da Terra. Vejo beleza nas diferenças.

Infelizmente, vivi o suficiente para ver colegas batendo boca publicamente em rede social por causa de conceitos e ideias de futebol. Algo que deveria ser saudável e divertido está ficando virulento, chato.

Boa parte desse quebra-pau virtual se deve a Fernando Diniz, o treinador do São Paulo, e sua ideia de futebol.

Diniz tem dez anos de carreira e chamou a atenção há cinco, com um trabalho muito legal no Audax. Sua ideia de jogo propõe algo que de novo nada tem, mas que tenta tirar a poeira da mesmice em que o futebol brasileiro se meteu. Muita movimentação, jogadores que não guardam posição, saída de bola utilizando o goleiro e evitando ao máximo aquele chutão grotesco que estoura músculo de goleiros e beques.

Repito: cada um tem o direito de pensar como quiser sobre qualquer coisa, inclusive o futebol.

Luciano em ação pelo São Paulo contra o Coritiba — Foto: Heuler Andrey/Estadão Conteúdo

Luciano em ação pelo São Paulo contra o Coritiba — Foto: Heuler Andrey/Estadão Conteúdo

Mas vejo um debate caloroso centralizado na questão da saída de bola do São Paulo. A impressão que fica é que só é moderno quem joga desta forma ou defende este conceito. Todo o resto cheira a mofo.

Ouso pensar de outra forma.

O problema maior do São Paulo de Diniz não me parece a saída de bola. O que tem impedido a materialização em resultado das ideias bacanas de Diniz, na minha visão, são outras coisas.

A primeira delas é a tal da movimentação. Parece que o São Paulo roda, roda e não sai do lugar. Porque o time toca para todo canto e na maioria das vezes levanta a bola para a área da intermediária. Recurso antigo de times, digamos, menos modernos na teoria. Mas não vou bater boca com meus colegas, a quem respeito e com que aprendo muito cotidianamente, sejam eles adeptos de qualquer tese e tenham chupado laranja em vestiário ou não.

Outro problema que eu vejo no Tricolor paulista: a movimentação às vezes é tamanha que os jogadores parecem nunca estar no lugar que precisam estar de acordo com suas características individuais. Porque nisso reside o fundamento básico de qualquer sistema de jogo e esquema tático: potencializar capacidades individuais através do trabalho coletivo.

Contra o Coritiba, mesmo com mais de 60% de posse de bola diante de um adversário que não quis jogar, o São Paulo teve 18 finalizações. A título de comparação e me permitindo uma leve provocada, o Palmeiras de Luxemburgo, treinador que para muita gente virou sinônimo de atraso, finalizou 28 vezes contra o Ceará, que é muito mais time que o Coritiba. O Tricolor abusa da posse estéril, sem objetividade.

Fernando Diniz dirige o São Paulo contra o Coritiba — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Fernando Diniz dirige o São Paulo contra o Coritiba — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Outro aspecto: o São Paulo de Diniz vai com tanta sede ao pote que derruba muita água a cada gole. Por isso, na maioria dos gols sofridos zagueiros, laterais e volantes estão correndo de frente para o goleiro. Retrato clássico da falta de equilíbrio entre ações ofensiva e defensiva.

Tchê Tchê é bom jogador. Mas seus grandes momentos foram com jogo apoiado e tendência de deslocamento para a direita. Sempre havia um outro meio-campista para fazer a cobertura e a recomposição central. Isso desde o Audax e, principalmente, no Palmeiras.

No São Paulo ele joga a maior parte do tempo centralizado à frente dos zagueiros para dar fluência à saída de bola. Trata-se de um jogador técnico, leve, mas de pouca intensidade física. Seu posicionamento provoca que os laterais joguem mais “espetados” no campo adversário, porque é esta a boa tese de Diniz: ocupar espaço em território inimigo e fazer a imposição através da troca de bola em velocidade.

Mas e sem a bola? Parece ser este o grande problema do São Paulo atual. Muricy Ramalho sempre destaca isso: também se joga futebol sem a bola. Mas o jogador brasileiro não presta muita atenção nisso.

Acho a pressão em cima de Diniz exagerada. Gosto da cobrança de quem pode fazer com critério e observação, buscando objetivo comum. Raí e Lugano, por exemplo. Não cardeais tomando chá às 17h e evocando falta de padrão de jogo que eles não conseguiriam explicar.

Mas antes de tudo isso e sem que colegas me chamem de Matusalém da opinião, há algo que a gente precisa aprender na vida: convicção e teimosia caminham muito próximas.

LEIA TAMBÉM: