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Brunno Carvalho
As arquibancadas esvaziadas do Morumbi por causa da pandemia da covid-19 foram cobertas com bandeirões em homenagem a Rogério Ceni em 13 de agosto do ano passado. À época treinador do Fortaleza, ele voltava ao estádio em que foi ídolo pela primeira vez como adversário. Para a torcida são-paulina, contudo, quem voltava não era um rival, mas um ídolo que estava longe de casa. Antes de a bola rolar, o telão do Morumbi exibiu uma imagem de Ceni na época de jogador com a frase “obrigado, M1to”. No gramado, os jogadores do São Paulo fizeram questão de abraçar, um a um, um dos nomes mais importantes da história são-paulina.
Pouco mais de um ano depois daquela noite, Ceni voltou para ficar no Morumbi. Pela segunda vez, ele assumiu a função de treinador do São Paulo. Agora, no entanto, precisará lidar com uma pesada sombra: Hernán Crespo.
Responsável por tirar o São Paulo da fila de oito anos sem título, o argentino foi demitido horas antes de Ceni ser anunciado como treinador. Antes de a bola rolar contra o Ceará, ontem (14), a torcida fez questão de relembrá-lo. Gritos de “Crespo” ecoaram pelo Morumbi, enquanto uma faixa com os dizeres “onde a perna não chegar, o coração alcançará” foi estendida pela Independente, principal torcida organizada do São Paulo, no setor que fica em frente às câmeras da televisão.
A frase dita por Crespo embalou a campanha vitoriosa do Paulistão. Ela foi lembrada no documentário feito pelo clube sobre a conquista e estampada na parede do vestiário são-paulino. Assim que o treinador foi demitido, no entanto, o clube decidiu pintar o local de branco e apagar os dizeres. Se o sentimento da torcida com Crespo era de puro carinho, com Ceni foi misto diante do Ceará. Assim que o nome dele foi anunciado no alto-falante do estádio, os torcedores se dividiram entre vaias e tímidos aplausos.
A razão da crise é uma polêmica declaração dele na época em que comandou o Flamengo. Na tentativa de exaltar os flamenguistas, Ceni acabou se indispondo com os são-paulinos. “Eu trabalhei no São Paulo por tantos anos e é um clube de massa, de presença do torcedor. Mas aqui, assim, é uma atmosfera diferente. Ser Flamengo”, disse, no início do ano. A questão foi lembrada pela Independente assim que Crespo foi demitido. Naquele momento, Ceni já aparecia como favorito para assumir o cargo. Em publicação nas redes sociais, a torcida organizada disse que esperava um pedido de desculpas do ídolo e uma reunião com ele.
Pouco antes do jogo, em mais uma publicação nas redes sociais, a organizada anunciou que não cantaria o nome de Ceni nem de nenhum jogador. “Ele [Rogério Ceni] sabe o que falou sobre outra torcida e sabe o que precisa fazer para se redimir”, escreveu.
Na entrevista coletiva depois do empate por 1 a 1 com o Ceará, Ceni tentou amenizar a situação explicando o que queria dizer com a polêmica frase. “A declaração que eu dei no Flamengo, que é uma grande instituição, um ótimo lugar para trabalhar, um clube que me propiciou ser campeão brasileiro, foi que no Rio de Janeiro é diferente de São Paulo. São Paulo a torcida é muito dividida entre os três grandes [Corinthians, Palmeiras e São Paulo]. No Rio de Janeiro, existem mais de 700 favelas e é praticamente uma ação social você vestir a camisa do Flamengo, isso faz parte daquela comunidade, você faz parte daquele grupo. Essa é a grande diferença”.
O próximo encontro de Ceni com a torcida do São Paulo acontecerá na segunda-feira (18), contra o Corinthians, pela 27ª rodada do Brasileirão. “Se durante 25 anos deixei a minha vida aqui dentro e ainda pode haver pessoas descontentes, eu lamento. Se o torcedor gritar ou não, eu vou estar sempre próximo, sempre respeitando, porque foi o torcedor que me colocou aqui, que me sustentou esse tempo todo. Para mim é um prazer estar no clube que praticamente é a minha casa”, prosseguiu o treinador.
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