Primeiramente, o caso foi levado, em novembro de 2018, para a CNRD, pela Elenko, dos empresários Fernando Garcia, ex-conselheiro do Corinthians, e Guilherme Miranda Gonçalves.
A agência exigia pagamentos de comissões e de multa rescisória do atleta, hoje emprestado pelo São Paulo ao Yverdon, da Suíça. O valor cobrado foi de R$ 975 mil, entre multa e comissões.
Em maio do ano passado, a CNRD indeferiu, ou seja, não atendeu, o pedido da empresa para condenar o volante ao pagamento de comissão sobre os contratos de trabalho e de imagem assinados por ele com o clube do Morumbi, com intermediação da agência.
A decisão foi baseada em contrato firmado entre a empresa e o São Paulo. Pelo documento, a agremiação se comprometia a pagar para a Elenko comissão de R$ 357 mil pelo serviço de intermediação nas negociações entre o clube e o jogador.
A quantia correspondia a 7% dos valores iniciais combinados no compromisso entre jogador e São Paulo.
Além disso, a empresa cobrava, de acordo com compromisso firmado entre as partes em abril de 2018, 10% dos valores auferidos por Liziero “em razão dos contratos de qualquer natureza relacionados à sua profissão”.Continua após a publicidade
A CNRD entendeu que a Elenko optou por receber a comissão diretamente do São Paulo, e não do atleta. Assim, definiu ser impossível concluir que Liziero deveria pagar comissão.
A mesma decisão indeferiu pedido do jogador para que a Elenko pagasse R$ 500 mil de multa por quebra de contrato. Em vez disso, o meio-campista acabou sendo condenado a pagar multa de R$ 909.354,60 (R$ 500 mil atualizados e com juros) por rescisão imotivada do contrato. Em dezembro do ano passado, a CNRD reduziu a multa para R$ 876.781,24.
A defesa de Liziero levou o caso ao CBMA (Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem), que funciona como uma instância superior, mas não é vinculado à CBF.
Em junho de 2023, o CBMA indeferiu pedido de absolvição do atleta em relação à condenação por romper o contrato com a Elenko. Porém, foi deferida a redução da multa para R$ 375 mil.
No dia 6 do mês passado, após novo pedido da defesa do jogador, o CBMA descontou do valor da multa R$ 20 mil, quantia que havia sido paga por Liziero como comissão, pois o montante já havia sido quitado pelo São Paulo.
Não há mais recurso possível em tribunal de arbitragem e as partes conversam para definir como o atleta efetuará o pagamento da multa.Continua após a publicidade
“A gente não concorda [com trecho da decisão que diz que a Elenko optou por receber a comissão do SPFC]. E sim que ele deveria ter sido condenado a pagar a multa e as comissões, mas já transitou em julgado”, afirmou Aldo Giovani Kurle, advogado da Elenko.
“Entendemos que a multa nem deveria ter sido reduzida e ele deveria ter sido condenado a pagar as comissões que devia. Atualizado, [o valor a ser pago pelo atleta] está em torno de R$ 500 mil, estamos em tratativas para ele pagar. Se não pagar, vai ficar sem jogar”, concluiu o advogado da Elenko.
Quebra de confiança
A defesa do jogador sustentou na disputa que, em 2018, depois de ser cobrado pela Elenko para pagar R$ 20 mil referentes à parte da comissão pela intermediação do contrato com o São Paulo, Liziero solicitou documentos ao clube. Então, ele notou que a empresa cobrou dele comissão que já era paga pela agremiação.
Assessorado juridicamente, o jogador entendeu que havia outros problemas no contrato dele com a empresa. Liziero considerou, abusiva, por exemplo, cláusula que o obrigava a pagar comissão por todos os contratos que assinasse, mesmo sem a participação da empresa.
Assim, em setembro de 2018, o atleta notificou a agência informando que houve quebra de confiança por causa, principalmente, do que considerou um ato ilícito: cobrança e recebimento de comissão indevida.Continua após a publicidade
Baseado nesse argumento, ele informou, por meio de notificação, que considerava o contrato rescindido por justa causa, além de cobrar a devolução dos R$ 20 mil.
A Elenko reagiu levando a questão para a CNRD. Na câmara de arbitragem, a empresa afirmou que o jogador rescindiu o contrato sem justa causa para não pagar as comissões que seriam devidas.
A Elenko alegou à câmara que os pagamentos feitos pelo São Paulo eram referentes às negociações que culminaram com as assinaturas dos contratos de trabalho e de imagem.
A defesa da empresa também sustentou que o jogador deveria pagar comissões pelos serviços prestados e por todos os trabalhos desenvolvidos pela agência em prol de sua carreira. Dessa forma, não teria havido cobrança da mesma comissão de Liziero e do SPFC.
Influência?
A Elenko também negou a existência de cláusulas abusivas. Em sua petição inicial no CNRD, a agência afirmou ter a informação de que Liziero teria sido influenciado a romper o contrato pela empresa do agente André Cury, a Link Assessoria Esportiva e Propaganda.Continua após a publicidade
A defesa da Elenko citou que a notificação enviada pelo jogador foi assinada pela advogada Adriana Cury, irmã de André.
Nas duas instâncias da disputa, ela negou a participação da Link no episódio. Hoje, Liziero é representado pela empresa de Cury.
O que dizem os agentes
Procurado pela reportagem, Fernando Garcia afirmou: “pode publicar o que você achar”.
Por sua vez, Guilherme negou que tenha havido cobrança da mesma comissão do jogador e do São Paulo apesar das decisões contrárias a esse argumento.
“Não se trata da mesma comissão. Trata-se da mesma operação, do jeito que você coloca parece que foi feito algo ilegal ou questionável”, afirmou o empresário.Continua após a publicidade
“E digo que a maior condenação ao Liziero foi o trabalho de gestão feito após ele ter quebrado o contrato com a Elenko. Prometeram Barcelona e entregaram o banco de reservas do Coritiba”, completou Guilherme. Ele se referiu à passagem do jogador pelo Coxa.
Sobre a rescisão de Liziero com a Elenko, o agente afirmou: [Não foi] imotivada, não! Induziram ele ao erro prometendo transferência ao Barcelona. E acabaram entregando o movimento de insucesso no Brasil”, declarou.
Indagado sobre por qual motivo a empresa não recorreu no CMBA contra a decisão que entendeu ter sido paga pelo São Paulo a comissão cobrada do jogador, o agente declarou: “sempre seguimos o direcionamento dos nossos advogados. Decisão de estratégia jurídica. E creio que a dupla condenação já estava de bom tamanho [pela quebra contratual]. No final, o que pesa não é o financeiro, e sim o moral”.
O que diz Liziero
A reportagem procurou Liziero por meio de sua assessoria de imprensa, mas não obteve resposta até a conclusão da reportagem. Por sua vez, o São Paulo disse que não vai se manifestar sobre o assunto.
A coluna a pediu a avaliação da advogada de Liziero sobre a decisão final da CBMA. Adriana Cury respondeu o seguinte:Continua após a publicidade
“A decisão foi contraditória. Reconheceu que a agente [Elenko] cobrou do atleta a mesma comissão que havia recebido [do São Paulo] e, embora tenha condenado a agente a ressarcir o atleta pelo pagamento do valor cobrado indevidamente, não reconheceu a justa causa na ruptura do contrato de representação pela quebra de confiança e condenou o atleta ao pagamento da multa contratual a favor da agente e, em valor acima daquele permitido por lei.”
A respeito de o fato de ela assinar notificação enviada por Liziero ter sido usado pela defesa da Elenko para levantar a hipótese de a Link ter influenciado o jogador, Adriana disse:
“A Alegação foi desrespeitosa e tratou-se de manobra vil do defensor ao imputar responsabilidade à Link e o fez como estratégia de defesa para desviar o foco dos desacertos das condutas da agente, os quais foram reconhecidos nas decisões.”
“O fato de ser irmã de um dos maiores agentes de futebol, condição esta que tenho muito orgulho, e por ele tenho muito respeito e admiração, não retira o mérito da minha trajetória profissional. No decorrer de 34 anos de muito trabalho, foco, ética e disciplina, possibilitaram o escritório Adriana Cury conquistar renomados clientes, entre eles atletas e agentes de futebol, entre eles, a Link. E por todos eles tenho muita gratidão pela confiança depositada no meu trabalho”, finalizou.
Cury
Procurado, André Cury enviou a seguinte nota à reportagem:Continua após a publicidade
“Pelo que eu sei, o jogador foi embora, pois descobriu que os fenômenos da Elenko cobravam comissões dele dobradas, uma dele e outra em nome dele do clube. Ou seja não eram éticos com o cliente, cobrando duas comissões e prejudicando o atleta. E usando as engenhocas contratuais que já são conhecidas em todo mercado e na imprensa para prejudicar os jogadores financeiramente”.
Reportagem
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