Welington revive Cotia e se despede com choro: “Tudo o que tenho hoje, eu devo ao São Paulo”

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Lateral-esquerdo viaja nesta sexta-feira para a Inglaterra, onde vai defender o Southampton. Antes, ele visitou o local onde morou por cinco anos

Uma última visita ao local que foi chamado de casa por cinco anos. Onde teve afeto, família, amigos e tudo o que nem imaginava que precisava para se tornar um jogador de futebol profissional – muito mais do que chuteiras, meiões e uniforme.

Antes de ir embora para a Inglaterra, Welington voltou a Cotia para reviver memórias, o passado e todos os passos até virar lateral-esquerdo do São Paulo, ganhar títulos, ser reconhecido na rua e chegar à Europa. Uma história sonhada por muito tempo.

“Made in Cotia”, como ele mesmo gosta de dizer, o jogador de 23 anos viaja para a Inglaterra nesta sexta-feira para, pela primeira vez, defender um clube que não é o São Paulo. Ele vai jogar no Southampton. Para trás, deixará saudade, lembranças, dificuldades e muito carinho pelo Tricolor. Agora, ele será apenas mais um entre tantos torcedores.

– Com certeza, onde estiver vou estar torcendo pelo São Paulo, porque me deu tudo. Tudo o que eu tenho hoje eu devo ao São Paulo. A palavra que eu tenho é gratidão. E sempre vou ser um Made in Cotia. Não sei com quantos anos vou estar, mas espero voltar para cá de novo. Aqui é minha casa – disse o lateral-esquerdo ao ge.

Com um sorriso de satisfação no rosto, Welington saía da nova academia do Centro de Formação de Atletas Presidente Laudo Natel, que ele ainda não conhecia, quando um carrinho de golfe interrompeu seu trajeto para que Salvador, massagista do sub-20, descesse e o abraçasse.

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Entre perguntas e respostas sobre o futuro, uma lembrança do passado:

– Ainda gosta de paçoca e sorvete? – brincou Salvador, levando Welington de volta à adolescência.

– A gente viajava, na época com 14, 15 anos… A gente recebia um salário, mas era para mandar tudo para a família e acabava ficando sem. A gente parava em posto para comprar sorvete, paçoca… Todo mundo ficava feliz (risos) – lembrou o lateral-esquerdo.

O começo de Welington no São Paulo não foi fácil. Hoje campeão paulista, da Copa do Brasil e da Supercopa, o lateral-esquerdo quase parou de jogar. Sete anos atrás, o ainda garoto de quase 17 anos contraiu uma bactéria chamada “Coxsackie B”. Até receber o diagnóstico, porém, foram semanas de sofrimento.

Welington, para evitar angústia em casa, tentou afastar da mãe o quanto pôde a notícia sobre seu estado de saúde. Até precisar ir ao hospital, ele ficou “escondido” em Cotia enquanto os médicos do São Paulo procuravam uma resposta para o sofrimento que fez com que o jogador ouvisse que não jogaria mais futebol.

– Essa lembrança acho que foi uma das piores que eu tive aqui, mas graças a Deus ele sempre esteve do meu lado e me ajudou. Foi um momento muito difícil, achei que não ia mais conseguir jogar futebol. Mas no fim deu tudo certo e hoje eu falo que foi um momento para me fortalecer mais ainda para estar aqui hoje – lembra, às lágrimas, o lateral-esquerdo.

Passado o susto, Welington é só boas lembranças de Cotia. No comando da bagunça do quarto 413 do alojamento inferior do centro de treinamento, fazia dupla com o zagueiro Morato, agora no Nottingham Forest, também da Inglaterra, nos duelos de taco e futevôlei. Até hoje, os vidros do banheiro usado por eles, virados para o “parque de diversões” da garotada, têm marcas.

A rotina era sempre a mesma: escola pela manhã, treino à tarde e dor de cabeça aos funcionários à noite. Por um muro baixo com uma caixa d’água ao lado, os garotos tentavam fugir das regras estabelecidas pelo São Paulo.

– A gente pedia os lanches e pegava por aqui (apontando para o muro), quando os seguranças não “embaçavam”. Depois, começaram a “embaçar” e aí pedíamos na caixa d’água, mas agora colocaram câmera (risos). A gente dava trabalho. Se o segurança pegava, recebíamos multa e ficávamos sem o lanche, ainda. Achamos um jeito na caixa d’água, mas pelo visto já fecharam também, né?

Numa sala onde já passou por boas (foi ali onde soube que havia sido aprovado no teste) e ruins (era ali para onde era levado quando precisava levar broncas), Welington vê sua marca na história do São Paulo. Ele está presente na foto do título da Copa São Paulo de Futebol Júnior de 2019 e ajudou o Tricolor a levantar alguns dos troféus que ali estão guardados.

– Esse aqui é o da Supercopa, que ganhamos em cima do Palmeiras na base. E no profissional também em cima do Palmeiras. Minha primeira Supercopa – brinca Welington.

A dupla com Morato seguiu. Depois de um período no alojamento inferior de Cotia, onde bolas de taco acertavam vidros e “Polícia e Ladrão” era uma brincadeira do dia a dia, ainda sem que a tecnologia dos celulares tomasse conta da rotina adolescente, Welington e seu parceiro foram para o principal hotel do gigantesco espaço tricolor.

“Seu Vava” admite: Welington dava trabalho. Estrategicamente posicionado numa recepção à frente de todos os quartos do hotel, o funcionário do São Paulo não esconde a satisfação de ver mais um garoto de Cotia brilhar.

– Era meio danado, mas é da idade, né? Não tem jeito. Até eu já dei trabalho, é que faz muito tempo – lembra o segurança, aos risos com o garoto.

Se Vava acha que Welington dava trabalho, imagina se ele soubesse o que o agora lateral-esquerdo do Southampton aprontava escondido…

– A gente pulava a sacada, de um quarto para o outro, abria os quartos e virava a cama dos moleques, revirava as camas, colocava os colchões dentro do banheiro, junto com a porta, aí não dava para abrir a porta do banheiro. Depois, colocaram câmera, aí não dava mais (risos). E é perigoso, né? Essas trilhas, aqui para trás, a gente brincava de esconde-esconde – conta Welington.

Welington estava no São Paulo desde 2016. Apesar de ainda ter contrato até o dia 31, já está acertado com o Southampton e viaja para a Inglaterra nesta sexta-feira. No Tricolor, foram 164 partidas como profissional, sem contar as dezenas pelas categorias de base.

Depois de anos em Cotia, títulos marcantes e histórias, Welington levará, na bagagem, muito mais do que troféus.

– Vou recordar de tudo. Título é muito importante, sem dúvidas, todos os títulos que ganhei aqui foram muito importantes, mas acho que a amizade que a gente faz durante esse processo acho que é o mais importante de tudo. E o que deixamos para as pessoas também. Títulos são consequências, mas amizades, funcionários, tudo isso vou guardar no meu coração. Tudo o que vivi aqui, a felicidade que eu passei – fala o lateral-esquerdo.

Agora, à distância, será mais um torcedor do São Paulo. Antes de ir embora, deixou um recado para todos que passaram por seu caminho nos últimos nove anos.

– Eu falaria obrigado. Obrigado a todos. De alguma forma, todos foram muito importantes na minha vida, independentemente de função, setor… Não tem diferença entre ninguém. Todos eles foram importantes na minha vida, para chegar onde estou hoje. É obrigado e gratidão, mesmo.

Fonte: Globo Esporte