Raí decisivo e Morumbi “vazio”: como SPFC virou último 2×0 na Libertadores

2008

UOL

Diego Salgado e Patrick Mesquita

São Paulo em ação na temporada 1993: equipe conseguiu virada histórica na Libertadores
  • Sérgio Tomisaki/Folhapress São Paulo em ação na temporada 1993: equipe conseguiu virada histórica na Libertadores

Nem mesmo a condição de campeão da Libertadores impediu o São Paulo de ficar numa situação idêntica à atual em 1993. Na campanha do bicampeonato continental do clube, a equipe de Telê Santana também se viu diante do desafio de reverter um placar de 2 a 0 em casa diante de argentinos. E conseguiu.

Sob o comando de Raí e Cafu, a tarefa foi cumprida com uma vitória por 4 a 0 sobre o Newell’s Old Boys, no Morumbi. Depois da classificação, o São Paulo arrancou para mais um título da Libertadores. Na próxima quarta-feira, a equipe tenta repetir a façanha diante do Talleres, que venceu o jogo de ida do duelo válido pela pré-Libertadores por 2 a 0.

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O enredo do jogo de 1993, válido pelas oitavas de final da Libertadores, traz elementos que tornam o feito são-paulino ainda maior. Raí, por exemplo, entrou em campo no sacrifício, com a mão direita enfaixada por causa de uma fratura em um dos dedos ocorrida dez dias antes. O terceiro gol, que bastou para garantir a passagem às quartas, foi marcado pelo camisa 10 aos 30 minutos do segundo tempo – ele já havia feito um na etapa inicial, de falta. São Paulo e Newell’s Old Boys ainda reeditavam a final da edição anterior, vencida pelo time brasileiro nos pênaltis.

A goleada por 4 a 0 no Morumbi também foi marcada pela baixa presença de público no Morumbi, num cenário distinto em relação ao histórico do clube na Libertadores. Ao longo dos anos, o São Paulo se acostumou a atuar com o estádio cheio. Não foi o caso daquela partida decisiva, que foi vista por quase 32 mil torcedores – na final de 1992, 105 mil assistiram à vitória e ao título tricolor contra o Newell’s.

Quem foi ao Morumbi naquele 14 de abril de 1993 viu um São Paulo pilhado desde os primeiros minutos de jogo. Ao contrário do que aconteceu no primeiro duelo, em Rosario, a equipe entrou com dois meio-campistas em campo em vez do trio de volantes. Raí, àquela altura se recuperava da fratura sofrida no clássico com o Corinthians, disputado três dias antes da partida. No jogo decisivo, o camisa 10 voltou ao time na vaga de Adílson, com Pintado e Dinho na contenção e ao lado de Cafu na criação.

Ormuzd Alves/Folhapress

Dupla Muller e Palhinha compunha o ataque do São Paulo contra o Newell’s em 1993

“Começamos a construir a virada no primeiro jogo, quando perdemos. Saímos dali determinados de que faríamos um jogo diferente, dentro da nossa casa. Era jogo para grandes homens e bons jogadores. Foi ali que começou”, relembrou Pintado em entrevista ao UOL Esporte.

O ex-zagueiro Ronaldão, por sua vez, ressaltou que o time de Telê Santana entrou em campo completamente concentrado. A confiança na virada, segundo ele, também fez parte do ambiente do vestiário são-paulino.

“A gente olhava um para o outro no aquecimento e sabia que estava todo mundo focado. A gente conhecia nosso potencial e sabíamos que ia reverter. Confiávamos um no outro. Cada um fez o seu melhor e revertemos um resultado que muita gente considerou que seria impossível. A confiança no companheiro faz com você consiga reverter um resultado assim”, disse.

O São Paulo conseguiu abrir 2 a 0 antes do intervalo. Dinho, aos 29 minutos do primeiro tempo, abriu o placar no Morumbi. A bola chutada de longe ainda desviou antes de entrar. Aos 37 minutos, Raí sofreu falta na entrada da área. Na queda, temeu-se pela lesão na mão. O meia se levantou, ajeitou a bola e bateu colocado para ampliar o marcador.

Na etapa final, após gols pedidos por Raí, que mandou uma bola na trave, e Muller, que mesmo sozinho na área chutou para fora, o São Paulo conseguiu marcar o terceiro. No lance, Raí pegou a sobra na entrada da área e bateu cruzado. A bola desviou na zaga e morreu no fundo do gol. Aos 38 minutos, Cafu marcou o quarto gol no Morumbi ao tocar na saída do goleiro.

A vitória encheu o São Paulo de moral. Na fase seguinte, o time venceu o Flamengo após um empate por 1 a 1 no Maracanã e um triunfo por 2 a 0 no Morumbi, que recebeu 97 mil pessoas. “Depois [da classificação contra o Newell’s] a lotação foi maior. A confiança voltou”, frisou Ronaldão, que admitiu que a torcida podia estar desacreditada depois da derrota em Rosario – na semifinal e na final, a equipe tricolor passou pelo Cerro Porteño, do Paraguai, e pela Universidad Católica, do Chile, respectivamente.

Lição para o time atual

A dupla Ronaldão e Pintado também afirmou que a virada sobre o Newell’s pode servir de lição para o atual do São Paulo. “Qualidade esse time tem, condições ele tem, mas é preciso construir e não dá para fazer 2 a 0 de cara. Tem que fazer o primeiro e buscar o segundo. É determinação, insistência, responsabilidade e comprometimento de todo mundo”, afirmou Pintado.

“A Libertadores é dura, tem que respeitar todo mundo e jogar o melhor. Não jogou bem lá e agora tem a oportunidade. Não podemos falar em vexame antes do jogo”, ressaltou Ronaldão, que citou a confiança como algo fundamental.

“Primeira coisa que tem é acredita no potencial e melhorar de um jogo para o outro. Se não tiver convicção que pode e tem a qualidade técnica fica difícil. A confiança fica de cada um. Perder da maneira que jogou fica difícil”, disse.

Para Pintado, a própria história do São Paulo na Libertadores pode ajudar a equipe na próxima quarta-feira. “O time [de 1993] era vencedor. Isso engloba muita coisa. Uma equipe vencedora não constrói da noite para o dia. Tem que passar por dificuldades. O sabor de ser vencedor faz diferença. No jogo como esse a diferença é ser vencedor. É uma camisa vencedora que tem peso em jogos assim”, destacou o ex-volante.