Polêmico e divertido, Juvenal deixa inimigos, legado vitorioso e problemas

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GloboEsporte.com – Alexandre Lozetti

Quando Juvenal Juvêncio atendia o telefone com seu inconfundível “alô!!!”, era uma alegria para os jornalistas. Primeiro porque era raro conseguir falar com ele. Havia alguns truques, como ligar bem cedo, antes que ele fosse para o Morumbi. O dia 31 de dezembro, então, era propício para longos papos. O mais comum, entretanto, era ser atendido por Maristela, a secretária, ou Cristiano, seu motorista. Eles fingiam que Juvenal retornaria, nós fingíamos acreditar.

As conversas costumavam reservar boas frases. Polêmico e complexo, o dono do “juvenalês”, seu vocabulário próprio, nos ensinou o que era diapasão, evocava oxalás aqui e acolá, adorava citar palafitas, mãos calosas e pés descalços de operários para falar sobre o valor do trabalho, e citava criadores de búfalos na Ilha de Marajó para exemplificar são-paulinos que moravam longe do Morumbi.

Morto nesta terça-feira em decorrência de um câncer na próstata contra o qual lutou por mais de quatro anos, Juvenal Juvêncio deixa o senso comum de ter sido empreendedor, inovador, ousado, de ter feito muito pelo São Paulo, e de ter pecado pelo excesso. O excesso, no caso, um mandato a mais, contestado, protestado, de 2011 a 2014.

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Juvenal colecionou histórias curiosas. Como, por exemplo, quando pediu ao motorista que parasse o carro no meio da estrada e caminhou até o meio do mato para tratar a contratação do zagueiro Miranda com o empresário.

O dirigente, carismático que só ele, não se importou em colecionar desafetos, tendência que aumentou simultaneamente à idade e à sensação de ser imbatível e mais poderoso do que, de fato, era. O último deles foi justamente quem o lançou no futebol. Nos anos 80, Carlos Miguel Aidar escolheu Juvenal Juvêncio para cuidar do time do São Paulo. Em 2014, Juvenal retribuiu a confiança e a ajuda jurídica que lhe havia garantido o terceiro mandato consecutivo e elegeu Aidar como seu sucessor.

Era muito, mas muito perceptível que eles não falariam a mesma língua depois da eleição. Só Juvenal demorou a notar. Foi nomeado diretor da base, demitido logo depois, e decretou guerra. Uma guerra nada fria. Quentíssima. Venceu, embora não tenha sido o protagonista do processo que derrubou o ex-amigo. Mas disse que poderia morrer e paz. Assim foi.

Antes de Aidar, Juvenal se digladiou com Ricardo Teixeira, Andrés Sanchez, Marco Polo Del Nero, José Serra… Mas, político nato, nem sequer ruborizou quando precisou aliar-se a algum deles, como na época em que o Morumbi ainda seria o estádio da cidade na Copa do Mundo. Não foi.

De origem humilde, nascido na roça, em Santa Rosa do Viterbo, interior paulista, Juvenal era eleitor do PT. A ponto de provocar parentes com totens de políticos vitoriosos do partido em churrascos de família, ou de alardear aos quatro cantos que era amigo de Lula. “O Lula me ligou”, “falei com o Lula”, “o Lula pediu minha ajuda”, etc, etc… O ex-presidente do São Paulo, inclusive, rejeita atribuir ao ex-presidente da República o tombo do Morumbi na Copa do Mundo, em detrimento da construção de um estádio para o Corinthians.

Juvenal Juvêncio  (Foto: Site Oficial SPFC)As entrevistas de Juvenal Juvêncio eram sempre divertidas (Foto: Site Oficial SPFC)

Juvenal era homem de resolver rapidamente as coisas e tentar sempre ter as rédeas da situação. Centralizador, restringiu as principais decisões do São Paulo a pouquíssimas pessoas, sobretudo nos últimos anos. Brigou com Marco Aurélio Cunha, seu ex-genro e pai de seu neto João Paulo – com quem nutriu sempre relação de profunda e recíproca cumplicidade, amor e confiança –, porque ele se atreveu a divergir publicamente de seus métodos e deixou a diretoria do clube. A relação melhorou quando ele percebeu o erro cometido com a sucessão de Aidar.

Um de seus grandes orgulhos era o de saber se relacionar com os boleiros. Um pouco pelo jeito franco, por saber falar o que os jogadores queriam ouvir, um pouco pela tradição de pagar bichos em dinheiro vivo, ainda no vestiário, logo depois de cada vitória. Muito por sua personalidade cheia de peculiaridades. Juvenal não revelava sua idade. No dia de sua morte, noticiaram 81 – confirmada pelo São Paulo – e 83. O dirigente, das últimas espécies ativas do tradicional cartola, era, de fato, queridíssimo por seus atletas e funcionários.

Fã de uísque e charutos, dono de centenas de camisas iguais, aquela com a gola vermelha com a qual ele ia a todos os jogos, o ex-presidente coleciona histórias divertidas. Como, por exemplo, quando pediu ao motorista que parasse o carro no meio da estrada e caminhou até o meio do mato para tratar a contratação do zagueiro Miranda com o empresário. Ou quando deixou seu assessor em situação constrangedora, no telefone com o agente do lateral Júnior César ameaçando fechar com o Palmeiras, enquanto dava orientações sobre o que fazer na fazenda.

Tricampeão brasileiro, diretor de títulos nacional, paulista, da Libertadores e Mundial, campeão da Sul-Americana e reverenciado por funcionários e jogadores, Juvenal Juvêncio deixa o São Paulo Futebol Clube tendo como aliado muito de seu vitorioso legado para tentar se recuperar de uma situação ruim, pela qual também é impossível retirar sua parcela de responsabilidade.

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