Exclusivo: Calleri vê ida à Europa incerta e explica pacto rompido no SP

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UOL

Guilherme Palenzuela, Juliana Alencar e Luis Augusto Simon

Desde que Jonathan Calleri foi contratado por empréstimo, no fim de janeiro, o São Paulo e o são-paulino sabiam que teriam o atacante argentino de 22 anos só por cinco meses, até o meio do ano, quando ele se transferiria à Inter de Milão. Essa história mudou. Em entrevista exclusiva concedida ao UOL Esporte na última terça-feira, Calleri falou pela primeira vez com maior contundência que não há acordo com o clube italiano e que pode até voltar à Argentina depois de julho.

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Depois da primeira e menor parte da entrevista publicada na quarta-feira, agora Calleri fala sobre os três meses que já viveu no São Paulo. O atacante afirma que recebeu apoio de Diego Lugano para descumprir o pacto de silêncio firmado pelo elenco contra o atraso de pagamentos da diretoria, que resultou num ato de rebeldia e uma greve de entrevistas na noite em que o clube acabou derrotado pelo The Strongest, da Bolívia, no Pacaembu – só Calleri, Lugano e Denis falaram naquela noite, e o movimento gerou discordâncias internas. Hoje, Calleri diz que fez o certo.

O argentino ainda conta sobre frustrações antes de ser profissional em Buenos Aires e também do que traça para a carreira nos próximos anos, diz que aproveita a escassez de camisas 9 no Brasil e fala que esperava adaptação mais rápida a um futebol mais técnico e menos agressivo no país.

UOL Esporte: Há três anos você ainda não tinha jogado como profissional. Depois da estreia pelo All Boys, tudo aconteceu muito rápido na sua carreira. Você vê dessa forma também ou as coisas foram mais demoradas do que esperava?
Jonathan Calleri:
Tem acontecido tudo muito rápido depois que eu comecei a jogar no profissional. Nas categorias de base, porém, foi tudo muito lento. Tive que esperar muito para jogar no profissional. Eu estreei com quase 20 anos, foi em 14 de agosto de 2013, hoje estamos em 2016 e só faz três anos que eu estreei. Tive a sorte de ter jogado num clube grande como o Boca, fui campeão e hoje estou gostando de jogar no São Paulo. Um jogador, obviamente, desde criança, sonha em jogar na Europa, mas hoje estou num lugar onde eu gosto de estar. Estou competindo num torneio em que o São Paulo está entre as melhores oito equipes da Américas e temos a ambição de ser campeões.

Arquivo pessoal

Calleri, ainda adolescente: jogador era baixo e demorou para deslanchar na base

Por que você acha que demorou tanto para estrear como profissional? Tinha defeitos no seu futebol?
Fui o jogador da minha categoria, de 1993, em subir mais rápido para o profissional, mas o mais lento para estrear. Estive três anos no profissional, subindo e voltando para a base, e nunca me deram a possibilidade de estrear por questões técnicas. Talvez o técnico do momento não me via maduro para estrear. Talvez isso me fez mais forte e hoje, dos garotos que subiram comigo, eu sou o que, por enquanto, mais longe cheguei. Talvez tenha me feito bem ter de amadurecer um pouco mais.

Como é ser contratado para jogar só cinco meses por um clube, como você no São Paulo? É possível traçar projetos num prazo tão curto sem poder prometer amor eterno à torcida?
Sabia que o prazo seria curto e que tinha que dar tudo. Talvez não tenha chegado na melhor forma física, porque estive sem clube quase 15 dias, com família, treinando pouco, sozinho. Me propus tentar estar tranquilo e cumprir os objetivos. Passaram-se três meses e meio e quando faço um balanço penso que me custou um pouco a adaptação ao futebol brasileiro. É muito diferente do futebol argentino. No Paulista as equipes têm muito respeito ao São Paulo, coisa que na Argentina as equipes pequenas não têm respeito às equipes grandes. Vão à Bombonera jogar para ganhar do Boca. Sempre disse quando cheguei que, apesar de ter feito três gols nas duas primeiras partidas, eu sabia que a adaptação seria difícil. Os jornalistas me perguntavam se eu tinha me adaptado rapidamente, mas eu sempre disse que ainda não estava adaptado. Em seguida fiquei dois meses sem fazer um gol, e começaram a me perguntar quando ia me adaptar.

Veremos se vamos renovar, se existe possibilidade de ir à Europa, se volto para a Argentina. Não tenho nada fechado com a Inter”
Quando você foi contratado o São Paulo, o seu pai afirmou que você tinha um acerto e sairia em julho para a Inter de Milão. Desde então, esse discurso foi perdendo a força com o passar do tempo. Hoje, qual a sua situação? Como ficou a negociação com a Inter de Milão?
O que acontece é que estamos jogando coisas muito importantes aqui. O mercado da Europa abre, mas eu não sei se eu vou para lá. Estou aqui hoje e o contrato acaba no dia 30 de junho. Depois veremos se vamos renovar, se existe a possibilidade de ir para a Europa, se volto para a Argentina… não sei. Eu não tenho fechado nada como ninguém, não fechei as portas para nada, e não tenho nada fechado com a Inter de Milão. Tive muito perto de ir para lá em dezembro, não deu certo por um motivo que eu não sei, e vim ao São Paulo jogar. Creio que fiz uma boa escolha, estou contente de estar aqui. O que acontecer a partir de junho veremos depois.

Se não há mais nada encaminhado com a Inter de Milão e até possibilidade de voltar a jogar na Argentina, então hoje é mais fácil pensar que você poderia jogar no São Paulo até o fim do ano?
Nunca fechei as portas para renegociar o contrato e ficar aqui. Só quando me apresentei disse que vinha por seis meses e terminava aí. Hoje sigo mantendo o mesmo, se ganhar a Libertadores fico aqui para jogar o Mundial. Se não ganhar, a possibilidade existe, mas é muito difícil. Sei que vim só por cinco meses, jogar a Copa Libertadores e quero ganhá-la. Se não acontecer, veremos se continuo para o que resta do ano, para os próximos seis meses, se fico aqui ou volto para a Argentina, ou se tenho a possibilidade de ir para algum clube da Europa.

Mesmo com pouco tempo de São Paulo você preferiu descumprir o pacto de silêncio firmado pelo elenco e foi um dos poucos que deu entrevista quando o time perdeu do Strongest. Por que fez isso?
Nesse momento me pareceu o certo, e creio que fiz bem, dar a cara e falar com os jornalistas. Era um momento em que estávamos mal, que a equipe não encontrava sua forma, que pela primeira vez uma equipe boliviana ganhou de um brasileiro aqui em terras brasileiras. Foi difícil. Nesse momento quis falar e falei. Diego [Lugano], que para mim era o emblema do São Paulo, me disse que falasse e falei. Disse o que eu pensava, dei a cara, e tratei de dizer, responder o que me perguntavam. Disse que sim, tínhamos feito uma má partida, que não tínhamos vergonha, mas que havíamos perdido uma partida que no Brasil nunca um time havia vencido, e que tínhamos que consertar isso. O tempo nos deu a razão, nos recuperamos, classificamos e agora estamos nas quartas.

De março até aqui o São Paulo sofreu uma transformação mesmo sem mudar o elenco. Quais foram as mudanças que fizeram o time melhorar?
Creio que as críticas foram boas. Nem sempre as críticas são boas, mas nesse caso foram. Chegou num momento que eu e a equipe nos sentimos em dívida com o clube e com a torcida. Eu passei nove ou dez jogos sem marcar um gol. Foi um momento ruim da equipe. Tentamos ressurgir, conversamos entre nós, e creio que a partida importante, chave, foi contra Trujillanos [6 a 0 no Morumbi]. Estávamos quase fora da Libertadores, quase fora do Paulista, e a equipe ressurgiu em sua melhor forma.

E sobre as críticas a você nesse momento de dez jogos sem gols, o que pensou?
Me criticaram por um momento por não fazer gols, mas sei que muitos jogadores têm esse momento de altos e baixos. Hoje eu estou por cima, amanhã posso estar em baixa. Tem que tentar manter a calma. Aqui, talvez, uns criticam por ser argentino e por vir a um clube que o técnico é argentino, e talvez algum torcedor brasileiro pode falar algo disso. Às vezes entendem que os argentinos jogam quando estão bem, e se não estão bem tem que ficar fora. Aconteceu com Centurión, comigo, com outros jogadores e penso que eles entenderam que apesar de eu ser argentino e o técnico ser argentino, joga quem está melhor.

Você foi companheiro de ataque e campeão com Carlos Tévez no Boca, no ano passado. Vê alguma comparação entre a passagem dele pelo Corinthians e a sua pelo São Paulo?
Tévez ganhou o Paulista no Corinthians porque é o Tévez (risos). Não tem um ponto de comparação. Cada pessoa que eu encontro na rua, corintiano, e me dizem “e o Tévez?” É porque aqui o amam. Vim numa situação diferente. Ele era a figura do Boca, foi vendido por muito dinheiro, e veio como uma das grandes figuras ao Corinthians, sabendo que era um passe para a Europa. Eu também vim para cá tentar ganhar meu posto e, obviamente, ter uma continuidade. Não tem vaga comprada, por mais que o técnico seja argentino, aqui quem não rende sai. Ganso saiu, e é a figura do São Paulo, eu também saí por um momento, Diego [Lugano] hoje é reserva. Cada experiência te dá para o dia de amanhã um aprendizado.

Você recomendaria o futebol brasileiro para qualquer jogador argentino? Ou acha que só é bom em condições muito específicas, como no seu caso, com um técnico compatriota?
Para qualquer jogador é muito difícil jogar aqui, talvez eu tenha pensado que a adaptação seria mais rápida. Aqui há mais luta que jogo, pensei que teria mais jogo. Mas um jogador, a maioria que joga bem, pode jogar aqui. A verdade é que pensei que o futebol brasileiro fosse um pouco mais jogado e, ao final, é mais lutado. Nesse tempo que estive aprendi muitas coisas. Vivi fora do meu país durante quatro meses, pensei que ia me custar muito, e estou perto da minha casa. Por sorte estou bem, o idioma eu fui aprendendo, escutando, e hoje posso trocar algumas palavras com os meus companheiros, o que para mim era essencial.  Não há tempo perdido. Ainda que o São Paulo não passe, que fiquemos fora de tudo, levarei uma grande experiência e uma aprendizagem tanto dos companheiros como do corpo técnico e do clube que me abriu portas.

Você é centroavante e joga numa posição com escassez de opções no futebol brasileiro. Você se vê aproveitando essa escassez?
Não tem 9 aqui. Quando comecei, jogava de atacante por fora. Talvez um pouco mais recuado, como hoje joga Ganso, ou um pouquinho mais adiantado do que ele. Quando cheguei ao profissional do All Boys, fiz a pré-temporada com [Julio Cesar] Falcioni, o treinador, e eu era o oitavo atacante do elenco. Em 20 dias, ele viu que eu estava bem, fui subindo posições, e ele me escolheu como o 9 titular. Me perguntou se eu podia jogar como 9, eu disse que sim, mas sabia que não era minha melhor função. Mas ele me pôs na cabeça que eu tinha que ser 9, que ele me via como um 9. Havia visto muito jogadores em sua larga trajetória como técnico e disse que me via como um 9, pediu que eu treinasse. A verdade é que eu fui gostando, me adaptando e à medida que foi passando o tempo, me fiz um 9. Hoje não me vejo jogando em outra posição. Falcioni foi importantíssimo, creio que essencial. Passaram muitos técnicos na minha curta carreira, cada um me ensinou algo, mas acredito que se não tivesse sido por ele, não haveria tido os outros.

E vê a escassez de centroavante refletir na seleção brasileira?
Aqui no Brasil é uma posição que está escassa. Não vejo na seleção brasileira um 9 consolidado, como foi Ronaldo, que para mim foi um dos melhores de todos os tempos. As duas únicas equipes brasileiras que estão na Libertadores, uma tem Lucas Pratto, outra me tem. Na Argentina, é a posição que mais tem jogadores… Higuain, Aguero, Dybala, Vietto, Icardi.

Se a escassez de atacantes é boa para você no Brasil, pode ser ruim na seleção argentina, até para a seleção olímpica…
É a posição mais cheia, os melhores jogadores são 9. Você aspira jogar uma Copa do Mundo, jogar pela seleção argentina, ter a possibilidade. Eu penso que eu ainda tenho muito a aprender, ainda nem completei três anos que estreei como profissional. Há muitos jogadores, e muito bons, e terei que seguir jogando por muito tempo mais, porque eles jogam nas melhores ligas. Higuain pode ser o goleador histórico da Itália de todos os tempos, Aguero fez 100 gols no Manchester City, estão chegando jogadores como Dybala, que está jogando na Juventus na melhor forma, Icardi, capitão na Inter de Milão, Vietto, que jogou uma final da Champions League. São muitos jogadores que estão acima de mim na posição e penso em seguir melhorando e aprendendo para o dia de amanhã poder estar.  Meu objetivo principal, sempre disse quando cheguei aqui, era tentar jogar a Olimpíada e, bem, por enquanto estou na lista, mas que sinceramente acho muito difícil.

Por que acha tão difícil?
Não sei se vou aos Jogos Olímpicos. Estou numa lista de 55 jogadores que ainda será reduzida a 35, depois a 18, e é muito difícil. Estou competindo com centroavantes de grandes participações na Europa… Icardi, Vietto, Dybala. Vai ser muito difícil a competição. Espero seguir jogando, avançando na Libertadores, o que é muito importante para que o técnico escolha entre os centroavantes que existem.

Você não teve um grande rendimento no Paulista, mas é artilheiro da Libertadores e se marcou por gols decisivos no torneio, como os contra o River Plate. Gosta mais de jogar a Libertadores?
Há diferenças entre Paulista e a Libertadores. A Libertadores é um torneio mais quente, mais difícil, onde a maioria das equipes são as melhores da América. Talvez o Paulista seja de mais baixa qualidade, mas se joga em um ritmo de alta intensidade. Acho que hoje o São Paulo tem jogadores que gostam de jogar essas partidas mais quentes e talvez deixaram um pouco de lado o torneio paulista. Espero que estes jogadores, e falo também por mim, gostem de jogar essas partidas e possam mostrar sua melhor atuação na Copa Libertadores, que é o objetivo principal.

Reprodução/Instagram

Calleri com as irmãs e os pais num restaurante em São Paulo: família por perto na adaptação

Você demonstra um carinho muito grande pelo Boca, mas pode encontrar um confronto contra seu ex-clube na Libertadores. Pensa nisso?
Não gosto de falar de um futuro assim, pensarei em ganhar a Libertadores e contra o rival que tenha em frente. Sou profissional e tenho que jogar igual contra todos. Obviamente não gostaria de jogar contra o Boca, pelo sentimento que eu tenho, há pouco deixei, a maioria dos jogadores que estão lá são companheiros que eu tive. Ganhamos torneio, a Copa da Argentina, e não gostaria de enfrentar o Boca.

Então você vai torcer contra o Boca?
Não (risos)… Se chegar à final, vencer, desejo o melhor. Obviamente como jogador eu também quero ganhar e vai haver uma disputa aí. Esperamos o que vai acontecer daqui até lá e, se acontecer [o confronto com o São Paulo], terei de dar meu melhor.

O que se fala na Argentina sobre Edgardo Bauza e sobre o São Paulo?
A torcida do San Lorenzo fala muito bem de Bauza, ganhou a Copa Libertadores há pouco. Bauza é um técnico com muito história na Libertadores, ganhou duas, não sei quais outros técnicos ganharam tantas… Carlos Bianchi e não sei quem mais. É um técnico que eu gosto, de partidas quentes. Na Argentina se diz que São Paulo é um clube com história, que ganhou muitos torneios internacionais, e é uma equipe que ninguém quer enfrentar, nem ao técnico, nem aos jogadores. Se fala muito de Ganso, da importância que ele tem para a equipe, de como joga.

Você consegue aproveitar a cidade de São Paulo? Tem conhecido muitos lugares? Como é a relação com a torcida?
Por sorte com minha namorada saio muito. Gosto de conhecer a cidade, viajar à praia, ir ao shopping, parque. Gosto da cidade, é muito linda, grande. Os torcedores chegam com bom humor, pedem fotos. Talvez não sejam tão efusivos como na Argentina, são mais tranquilos, mais respeitosos. Na Argentina, quando jogava no Boca, nos últimos tempos, já não podia sair para comer, ir ao shopping, era muito complicado. As pessoas são mais efusivas, quando te pedem uma foto se aproxima muita gente. Aqui tenho mais tranquilidade, esperam que você termine de comer, é uma relação respeitosa.

Arquivo pessoal

Calleri e a namorada, a argentina Mica, que passa temporada em SP: jogador reatou namoro na cidade

Onde e como você se vê daqui a cinco anos?
Não sei nem o que eu vou fazer amanhã (risos). Espero que esteja em minha melhor forma. Estarei com 27 anos, espero ter uma família, jogar nas ligas mais importantes e tentar estar num lugar que eu me sinta cômodo, que é o mais importante. Lugar que me sinta bem, cômodo, com a cidade, com tudo. Espero que com muitos títulos mais e com vontade de seguir aprendendo e conhecendo gente.

E na parte pessoal?
Não sei.. Creio que ter a mesma namorada que eu tenho, os mesmos amigos, a mesma família, estar todo mundo junto. para o jogador é muito importante o carinho da família e dos amigos. Espero ter família, ter filhos.

Messi ou Maradona?
Os dois (risos). Um não tive a sorte de ver jogar, mas me encantava, parece ser o melhor da história. Messi, eu vejo todos os dias, me surpreendo de como joga e o que faz dentro do campo.

3 COMENTÁRIOS

  1. Só eu percebo a interesse de certos jornalistas em desestabilizar o SPFC nos momentos importantes para o clube? Esse Guilherme Palenzuela da ESPN parece fazer esse trabalho “sujo”. Insistir em tocar no tem “rompimento de acordo dos jogadores” ou “carinho pelo Boca Jrs”, ou “saída do SPFC no meio do ano”. Sei lá. Acho estranho isso.