Viagem gera polêmica no SPFC. Conselho questiona prestação e city tour

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UOL

José Eduardo Martins

Os bastidores do Morumbi vivem dias turbulentos. Desta vez, dois dirigentes do São Paulo são alvos de polêmicas. Elias Barquete Albarello, diretor executivo financeiro, e Rodrigo Gaspar, que era o diretor administrativo até fevereiro, apresentaram um relatório de despesas de viagem que chamou a atenção quando chegou ao Conselho Fiscal. O UOL Esporte teve acesso à prestação de contas e verificou notas com gastos como ônibus de turismo (city tour), entrada para museus e até 1 euro para o pagamento de elevador de shopping center (sendo que no local há escada rolante gratuita).

Com o São Paulo convidado pela La Liga, a dupla foi para a Europa para acompanhar o congresso World Football Summit, realizado entre os dias 24 e 25 de setembro, em Madri, na Espanha. Os dois desembarcaram no continente no dia 20 e permaneceram até o dia 28. Além de Madri, também estiveram em Lisboa (POR), e Barcelona. A viagem de Barcelona a Madri, do dia 22, por exemplo, custou 160,90 euros. A dupla alega que esteve em outros locais para resolver outras questões também ligadas ao clube.

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No dia 21, em Barcelona, além de gastos com táxi, foram apresentadas notas, no valor de 30 euros cada, de city tour — sendo que Gaspar mostrou um bilhete pelo reembolso e a prestação de Elias tinha três passagens (total de 120 euros). Já em Madri (sem contar novamente o táxi), também foram apresentadas notas de city tour, no dia 23, no valor de 26 euros cada. Entre os gastos de alimentação, estão diversas notas com pastéis de Belém em Lisboa, e uma jarra de sangria em Barcelona — em média não ultrapassaram 100 euros.

Chamou também a atenção o fato de a dupla, que estaria resolvendo questões ligadas ao Tricolor, não ter sido convidada para visitar os museus do Barcelona e do Real Madrid. Ambos apresentaram tickets de entrada dos locais (35 euros cada no Barcelona e 25 euros no tour do Santiago Bernabeu).

City tour seria mais barato e “eficaz” Em contato com a reportagem, Elias Barquete Albarello alegou ter devolvido ao São Paulo o dinheiro utilizado na viagem. A reportagem teve acesso a uma planilha do departamento financeiro com a contagem do depósito do dirigente no dia 3 de julho — quase nove meses depois da viagem com a devolução de 959,84 euros (havia a assinatura de um funcionário do departamento financeiro alegando que a devolução de tal quantia).

Ontem (5), Elias mandou uma mensagem para a reportagem dizendo que foram devolvidos “540,16 euros, quase 40% da quantia total”. O diretor, que está no cargo desde o início deste mandato do presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, também justificou o uso dos ônibus de turismo por ser, segundo ele, uma maneira mais “econômica e eficaz”. Já as visitas aos museus serviriam como laboratório para o Memorial do São Paulo.

“Em uma análise mais minuciosa, poderá ser verificado que um ou outro valor dobrado na prestação de contas, como o city tour, por exemplo, não significa erro ou mesmo algum tipo de pretensão de ganho financeiro, até mesmo pelo valor, mas por simples lançamento da despesa referente aos dois. Diretores em uma única prestação de contas pelo fato de ter sido paga pelo mesmo. Ainda em relação ao city tour mencionado, este se refere a um ônibus circular que passa por toda a cidade, inclusive nos pontos dos compromissos previamente agendados e que, de acordo com a agenda a ser cumprida, se mostrou o meio de transporte, naquele momento, mais econômico e eficaz. Importante ressaltar que do total de adiantamento para a viagem de 1.500,00 euros, foram devolvidos 540,16 euros, quase 40% da quantia total [segundo a retificação enviada ontem], no momento da prestação de contas”, respondeu Albarello por meio de mensagem enviada à reportagem.

Gaspar, que ficou famoso por ter chamado o zagueiro Rodrigo Caio, hoje no Flamengo, de jogador de condomínio, alegou também que os gastos com o ônibus de city tour “estavam dentro da opção de transporte mais em conta pela recorrência de visitas dentro do itinerário, assim como a entrada em museus dos clubes faziam parte do objetivo da viagem. Na prestação de contas, não há nada que não esteja no contexto da viagem, inclusive, as despesas com alimentação estão abaixo dos valores médios de mercado para executivos que preveem por volta de 120 euros diários para esse fim.”

Rodrigo Gaspar foi demitido do cargo de diretor administrativo em fevereiro. Na época, o clube não justificou oficialmente a saída do dirigente, que recebeu o pagamento de todos benefícios de acordo com as normas trabalhistas. Porém, pessoas dentro do São Paulo especularam que a demissão dele estaria ligada à viagem para a Europa. Hoje, ele é pré-candidato para se reeleger ao Conselho Deliberativo e tenta se juntar ao grupo de José Roberto Canassa, diretor da base.

Integrante do grupo Legenda, Elias era conselheiro vitalício e, em abril, abriu mão de sua vaga no Conselho, para de acordo com o estatuto, permanecer como dirigente remunerado.

A reportagem, porém, teve acesso a uma carta assinada pelo presidente Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco, no dia 28 de maio deste ano, sobre Rodrigo Gaspar. Nela, o dirigente declara “para os devidos fins e a quem possa interessar, que Rodrigo Roquette Gaspar exerceu a função de Diretor Executivo Administrativo desta entidade de 9 de maio de 2017 a 13 de fevereiro de 2020, desempenhando a contento seu trabalho durante todo o período, nada havendo que desabone sua conduta pessoal e profissional. Informamos ainda, que todos os gastos realizados nas viagens em que representou o São Paulo, foram devidamente comprovados conforme documentos contidos nas prestações de contas apresentadas, não havendo qualquer irregularidade.”

Segundo pessoas próximas, Leco não teria ciência do relatório de despesas dessa viagem quando assinou tal carta. Vale destacar também que o presidente não tem a função de averiguar os relatórios de despesas. O Conselho Fiscal, que questiona o caso, ainda não pôde apresentar em reunião do Deliberativo um relatório, pois a agenda do clube foi alterada em função da pandemia do novo coronavírus. Houve, no início do ano, segundo o órgão, “uma solicitação de documentos referentes a viagens da diretoria e desde então o Conselho Fiscal apura a questão internamente. Até o momento, o Conselho Fiscal não apresentou à presidência e à diretoria nenhum relatório, e seguirá com a examinação dos fatos, conforme compete ao órgão segundo disposto no estatuto social do clube.”

Quando as notas foram apresentadas neste ano, chamaram a atenção ainda alguns fatos. Justamente no ano em que o clube fechou o seu balanço com déficit recorde em sua história, R$ 156 milhões, os dois dirigentes teriam apresentado uma postura não condizente com um clube que vive dias turbulentos com suas finanças. A dupla que viajou também não costumava fazer parte das decisões e negociações do futebol, que são geralmente conduzidas por Raí, executivo de futebol, e Alexandre Pássaro, gerente de futebol.

O Conselho Fiscal deve apresentar o relatório desta viagem assim que uma nova reunião do Conselho Deliberativo for agendada. Há de se destacar também que o Conselho Fiscal do São Paulo tem solicitado a entrega de documentos e relatórios, fatos que não têm ocorrido com tanta eficácia.

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