Retrospectiva do São Paulo: ano do “quase” é marcado por doloridos vices e modo sincero de Ceni

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Time chega a duas finais, mas sofre duas derrotas doloridas; fora de campo, treinador faz cobranças públicas sem rodeios

Por Redação do ge — São Paulo


Um ano turbulento, marcado pelo “quase”. O São Paulo se reforçou para 2022 ser melhor do que 2021, mas a temporada termina com um gosto frustrante de derrotas em duas decisões. Ao mesmo tempo, o ídolo Rogério Ceni tornou-se uma blindagem ainda maior, usando o “modo sincerão” muitas vezes para questionar diretoria, torcida e crítica.

São Paulo de 2022 terá como principal registro a campanha nas Copas, que quase levaram o time a disputar todos os jogos possíveis de uma temporada. Foram 77 partidas no ano que se encerra, com 36 vitórias, 20 empates e 21 derrotas (algumas mais doídas).

A impressão positiva do avanço para duas finais e uma semi, entretanto, ficam pelo caminho diante dos frustrantes resultados das decisões. Derrotas para Palmeiras e Independiente del Valle marcaram o ano.

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Diante do rival, o São Paulo chegou a ter três gols de vantagem no primeiro jogo da decisão do Paulista, mas acabou com o vice-campeonato ao ser goleado pelo Palmeiras no Allianz Parque. Contra os equatorianos, um time dominado e passivo terminou com mais de 10 mil torcedores frustrados em Córdoba, na Argentina, pela Copa Sul-Americana.

Sob este contexto, Rogério Ceni se tornou mais do que um simples treinador e ídolo. Além do trabalho minucioso do dia a dia, o treinador utilizou os microfones para cobrar (e conseguir) melhorias estruturais, além de em dado momento levar a torcida de volta ao Morumbi.

É este Ceni, respaldado, que começa 2023.

Time do São Paulo antes de jogo contra o Atlético-GO, pela semifinal — Foto: Marcos Ribolli

Time do São Paulo antes de jogo contra o Atlético-GO, pela semifinal — Foto: Marcos Ribolli

Quase em São Paulo

São Paulo de 2022 começou a temporada carregando dois contextos opostos: a leveza do fim de jejum de quase nove anos, com a conquista do Paulistão de 2021, e o peso da campanha horrível no Brasileirão, que terminou com a permanência na Série A confirmada somente nas rodadas finais.

Com reforços importantes como Rafinha, Patrick e Nikão, o Tricolor começou o ano pressionado depois de passar as três primeiras rodadas do Paulistão sem vitórias. Quedas para Guarani e Red Bull Bragantino (fora de casa) e empate contra o Ituano, em pleno Morumbi, quase ameaçaram o cargo de Ceni.

Rogério Ceni, técnico do São Paulo, na final do Paulistão — Foto: Fernando Roberto

Rogério Ceni, técnico do São Paulo, na final do Paulistão — Foto: Fernando Roberto

Tudo mudou a partir de 9 de fevereiro, quando Marquinhos, posteriormente negociado para o Arsenal, deu a vitória contra o Santo André com um gol nos acréscimos. O ambiente de pressão instalado se reverteu e deu confiança a um grupo ainda em formação.

A partir deste resultado, o Tricolor conseguiu uma sequência de sete jogos de invencibilidade até encarar o Palmeiras, ainda pela fase de grupos. Em pleno Morumbi, o time de Abel Ferreira se apresentou como grande algoz do primeiro semestre, prevendo algo pior.

O revés para o Palmeiras abriu uma sequência de seis vitórias seguidas (inclui-se o resultado positivo contra o Manaus, pela Copa do Brasil). Neste período, o São Paulo crescia e se colocava como forte candidato ao título estadual, principalmente pela imposição no mata-mata.

As quartas, diante do São Bernardo, se mostraram protocolares: goleada por 4 a 1. Na semifinal, uma vitória de imposição contra o Corinthians por 2 a 1 colocou a equipe comandada por Rogério Ceni na decisão e na briga pelo bicampeonato.

Torcida do São Paulo lotou o Morumbi na primeira final do Paulistão — Foto: Marcos Ribolli

Torcida do São Paulo lotou o Morumbi na primeira final do Paulistão — Foto: Marcos Ribolli

A final começou com roteiro positivo, com uma abertura de 3 a 0 de vantagem. O título parecia próximo, mas o gol de Raphael Veiga aos 40 minutos da segunda etapa não só diminuiu a vantagem tricolor, mas mudou toda uma final de Paulistão.

O que se viu na volta foi frustração. Um São Paulo irreconhecível se apresentou diante de um Palmeiras letal. Goleada por 4 a 0 para o Verdão, e um dolorido vice-campeonato, ainda pouco assimilado no clube.

Quase na América do Sul

A dor do segundo lugar no Paulista ultrapassaria as fronteiras do estado e atingiria todo o continente. A Copa Sul-Americana começou como uma competição para rodar o elenco, gerando minutos importantes para nomes como o zagueiro Luizão, que depois ganharia espaço em partidas de maior peso.

A partir da classificação para o mata-mata, todavia, o foco são-paulino se direcionou para o torneio, que poderia recolocar o São Paulo na prateleira máxima de uma competição continental pela primeira vez depois de dez anos do título da própria Sul-Americana de 2012.

Nas oitavas de final, o Tricolor reencontrou a Universidad Católica, time que marcou uma das últimas grandes atuações de Ceni como goleiro. Um jogo movimentado e com expulsões no Chile (4 a 2) e uma goleada (4 a 1) no Morumbi colocaram a equipe entre os oito melhores.

Rodriguinho comemora o gol anotado contra a Universidad Católica — Foto: Marcello Zambrana/AGIF

Rodriguinho comemora o gol anotado contra a Universidad Católica — Foto: Marcello Zambrana/AGIF

Nas quartas, sofrimento. Após vencer o Ceará por 1 a 0 na ida, gol de Nikão, o Tricolor perdeu por 2 a 1 e precisou dos pênaltis para avançar à semifinal, fase na qual encarou outro brasileiro: o Atlético-GO.

O jogo de ida em Goiânia trouxe talvez o pior momento da temporada para o São Paulo. A derrota por 3 a 1 resultou em xingamentos, especialmente contra Igor Gomes, e em um clima ruim, que rumaria para um fim de trabalho da comissão técnica.

Veio a virada, com um triunfo por 2 a 0 e classificação nos pênaltis. Diante de um Morumbi lotado, em uma atmosfera clássica do “São Paulo de Libertadores”, o time avançou para a final e obtinha a chance de brigar pelo bicampeonato.

O sonho do título em Córdoba, entretanto, terminou pouco tempo depois do apito inicial. Nem a maioria absoluta do público fez a diferença. Se os são-paulinos “invadiram” a cidade argentina, o time mal apareceu. Dominado, o Tricolor perdeu por 2 a 0 para o Del Valle, que, sim, conquistou o bi do torneio.

Lautaro Diaz comemora o gol do Del Valle contra o São Paulo — Foto: Marcos Ribolli

Lautaro Diaz comemora o gol do Del Valle contra o São Paulo — Foto: Marcos Ribolli

No Brasil, Copa

São Paulo viveu contrastes nas duas competições nacionais de 2022. Como tendência da temporada, a Copa do Brasil se tornou prioridade em certo momento e terminou até com dignidade.

São Paulo acabou elminado pelo Flamengo na semifinal da Copa do Brasil — Foto: Rubens Chiri/saopaulofc

São Paulo acabou elminado pelo Flamengo na semifinal da Copa do Brasil — Foto: Rubens Chiri/saopaulofc

A campanha teve como auge a classificação às quartas de final, com vitória nos pênaltis sobre o Palmeiras, em pleno Allianz Parque. O Tricolor venceu por 1 a 0 o duelo de ida, no Morumbi, e perdeu por 2 a 1 o confronto da volta. Nos pênaltis, Jandrei apareceu, e Igor Gomes decidiu.

Melhores momentos: Palmeiras 2 (3) x (4) 1 São Paulo, pelas oitavas da Copa do Brasil 2022

A participação terminou somente na semifinal. No jogo de ida, em atuação considerada boa pela comissão técnica, o time perdeu por 3 a 1 para o Flamengo no Morumbi complicou a campanha.

No Maracanã, nova atuação consistente, mas outra derrota (1 a 0) e eliminação contra um rival claramente um patamar acima. O Flamengo terminaria com o título do torneio.

O foco nas campanhas pesou no Brasileirão. Embora sem o mesmo drama de 2021, quando o time se assegurou na Série A somente com uma vitória na penúltima rodada, o São Paulo se arrastou durante boa parte das 38 rodadas da competição.

São Paulo goleou o Goiás na última rodada e chegou a sonhar com vaga na Libertadores — Foto: Isabela Azine/AGIF

São Paulo goleou o Goiás na última rodada e chegou a sonhar com vaga na Libertadores — Foto: Isabela Azine/AGIF

Mesmo assim, por pouco, o time não abocanhou uma vaga na Libertadores de 2023 via Brasileirão. Rogério Ceni e companhia ficaram pouco mais de 15 minutos classificados na última rodada, enquanto venciam o Goiás fora de casa.

A combinação final de resultados, porém, não foi favorável, e o Tricolor terminou em nono lugar. Os 54 pontos conquistados foram apenas um a menos do que o Fortaleza, dono da última vaga para o principal torneio continental. Um tropeço ali, outro acolá, custaram o retorno do clube à elite sul-americana.

Os reforços

O fim de temporada frustrante em 2021 fez o São Paulo se movimentar. A diretoria trouxe 12 novos nomes durante o ano, e alguns já inclusive deixaram o clube para 2023.

No início do ano, Jandrei chegou para brigar com Tiago Volpi por um lugar no gol. A vaga de titular veio, mas atuações irregulares resultaram em uma contratação urgente nos últimos dias de janela. Felipe Alves chegou para ocupar a lacuna e terminou jogando.

Em campo, nomes importantes como Rafinha, Nikão e Alisson oscilaram entre bons e maus momentos. Nikão, inclusive, deixou o clube para defender o Cruzeiro no ano que vem.

Patrick, por outro lado, termina o ano como grande reforço ao fazer nove gols e distribuir oito assistências. Entretanto, o meio-campista protagonizou um atrito com Rogério Ceni no intervalo do jogo contra o Fluminense e pode até deixar o CT da Barra Funda na virada do ano.

Galoppo quer embalar em 2023 — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF

Galoppo quer embalar em 2023 — Foto: Thiago Ribeiro/AGIF

São Paulo ainda trouxe Andrés Colorado, André Anderson, Marcos Guilherme e Nahuel Bustos, que pouco influenciaram no time durante a temporada. Já Ferraresi, último a chegar, termina o ano em alta e possivelmente começa 2023 como titular.

O argentino Giuliano Galoppo é um capítulo a parte. Investimento mais pesado da diretoria, que construiu a contratação em criptomoedas, o meia argentino ainda não embalou com a camisa do Tricolor, mas segue como uma aposta inclusive de revenda e valorização para os próximos anos.

Ceni “sincerão”

Rogério Ceni adotou uma postura extremamente sincera diante dos microfones em 2022. Com respaldo, ratificado pela renovação de contrato ainda no mês de julho, o treinador não hesitou em fazer cobranças e exibir a dura realidade financeira são-paulina.

Ceni não evitou assuntos, nem mesmo fora da alçada do trabalho de dia a dia. O treinador era claro: queria reforços, um time competitivo, para permanecer no cargo em 2023, confirmando o que já havia sido assinado ainda no meio da temporada.

Rogério Ceni explica discussão com Patrick no São Paulo: “Reação que não condiz com profissional”

A derrota na decisão da Sul-Americana deixou Ceni abatido, com o treinador colocando o próprio futuro em xeque. As semanas posteriores de trabalho amenizaram a dor pelo revés, e o treinador, sempre respaldado, começa 2023 ainda mais influente dentro do clube em que foi ídolo

Sobre o caso Patrick, Ceni detalhou o ocorrido e fugiu do lugar-comum do discurso “boleiro”, costumeiramente receoso e blindando toda a estrutura de trabalho. As palavras sinceras do treinador, embora sem efeitos no restante do ano, com ambas as partes declarando “assunto encerrado”, podem terminar com a saída do meio-campista, que tem interesse do Atlético-MG.

Rogério Ceni em treino do São Paulo neste fim de ano — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc

Rogério Ceni em treino do São Paulo neste fim de ano — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc