DM do São Paulo: como conflitos internos travam modernização do setor

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Nove meses após promessa em reunião do Conselho, clube não consegue evolução esperada e encerra negociações iniciadas por Turíbio Leite de Barros para melhorias no CT da Barra Funda

Por Eduardo Rodrigues — GE


– O Dr. Turíbio acaba de nos premiar com equipamentos de última geração. Esse é o são-paulino que serve para o São Paulo. Nós vamos avançar não só no Reffis, mas no núcleo da ciência e alta performance. Em dezembro, o São Paulo implantará essa evolução. Vivemos uma grave crise financeira. Estamos fazendo tudo isso com parcerias, com aperfeiçoamento e evolução.

A frase acima foi dita pelo presidente do São Paulo, Julio Casares, no dia 25 de setembro de 2021. Em uma reunião do conselho deliberativo transmitida ao vivo na internet, o dirigente anunciou novidades em discurso que parecia significar o começo de uma nova era para o departamento médico e de performance do clube.

Nove meses se passaram, e os aparelhos médicos prometidos por Turíbio Leite de Barros, então fisiologista do clube, e referendados publicamente pelo presidente Julio Casares jamais chegaram ao CT da Barra Funda.

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O caso só veio a público após Turíbio responder a torcedores nas redes sociais na última semana sobre o encerramento das negociações pelos novos aparelhos médicos. A reportagem do ge explica abaixo o que aconteceu.

CT Barra Funda São Paulo adaptado para a Covid — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

CT Barra Funda São Paulo adaptado para a Covid — Foto: Rubens Chiri / saopaulofc.net

Os fatos

No dia 25 de setembro de 2021, o São Paulo anunciou a criação da Divisão de Excelência Médica (DEM), que tem como função reunir e coordenar os departamentos médicos do clube sobre prevenção, tratamento, condicionamento físico, saúde e bem-estar.

A formação inicial dessa comissão reunia três nomes da área da saúde (Turíbio Leite de Barros, Fernando Fernandes e Marcos Nobel), três conselheiros (Dorival Decoussau, Daurio Speranzini Junior e Jaime Franco) e três nomes do executivo (Marcio Carlomagno, Érika Podadera e Roberto Armelin).

A primeira ação anunciada por Turíbio foi que o DEM, por meio dele, havia conseguido quatro aparelhos (câmara hiperbárica, cadeira flexora, rota de calf e simulador de corrida) além de equipamentos de fisioterapia a custo zero. Em troca, o São Paulo anunciaria as marcas das empresas em ações.

Turíbio Leite de Barros em reunião do conselho do São Paulo — Foto: Reprodução

Turíbio Leite de Barros em reunião do conselho do São Paulo — Foto: Reprodução

As conversas aconteciam com quatro empresas do ramo de saúde e performance. Eram elas: BTL (aparelhos fisioterápicos), OXY (câmara hiperbárica), I-Motion (roupa de eletroestimulação) e Casa do Fitness (aparelhos de academia).

Os discursos recorrentes da diretoria do clube levavam a crer que até dezembro de 2021 boa parte da aparelhagem estaria instalada no CT da Barra Funda. No entanto, uma série de conflitos internos travou a chegada dos novos aparelhos ao centro de treinamento.

Os conflitos

Os problemas começaram com alguns atritos e desencontros de informações entre Turíbio Leite de Barros, membro da Divisão de Excelência Médica (DEM), e a diretoria.

As negociações para a aquisição da nova aparelhagem estavam sendo realizadas por Turíbio, com auxílio de sua esposa, Gerseli Angeli, fisiologista e membro do conselho de notáveis do São Paulo. O médico tinha prestígio no clube por ter sido um dos idealizadores do Reffis, o centro de reabilitação de atletas que se tornou referência no início deste século.

Com carta branca, Turíbio passou a levar os representantes das empresas ao CT da Barra Funda para a apresentação dos equipamentos. Algumas delas, inclusive, chegaram a levar seus aparelhos e fizeram testes em jogadores dentro do CT.

Os modelos de negócio, porém, desagradaram ao São Paulo. Segundo o clube, Turíbio havia prometido os aparelhos sem nenhum custo. No entanto, quando as conversas se intensificaram, valores e condições fora do orçamento começaram a aparecer. Aconteceu, então, o primeiro desconforto.

Outro fator que causou desavença foi o desejo de Turíbio assumir o cargo de gestor de projetos de saúde. O seu pedido a Julio Casares foi prontamente negado por ferir o Código de Ética do clube, que não permite familiares trabalhando no mesmo departamento. Luis Fernando de Barros, filho de Turíbio, é funcionário do São Paulo.

Após essa recusa, o pediatra Fernando Fernandes, um dos membros do DEM, também passou a se envolver nas negociações e a fazer inúmeras contestações que desagradaram a Turíbio. No dia 16 de fevereiro deste ano, Fernandes foi nomeado pelo São Paulo como gestor de projetos de saúde. Dias depois, Turíbio pediu demissão do DEM por se sentir traído e isolado.

O conselheiro Daurio Speranzini Junior também pediu demissão e não faz mais parte da Divisão.

Fernando Fernandes, gestor de projetos de saúde do futebol do São Paulo — Foto: Divulgação

Fernando Fernandes, gestor de projetos de saúde do futebol do São Paulo — Foto: Divulgação

Uma das primeiras ações de Fernando Fernandes no cargo foi encerrar todas as negociações com as empresas I-Motion, OXY, Casa do Fitness e BTL. As justificativas foram os altos custos dos equipamentos e a análise de que nem todos os aparelhos tinham comprovação científica para serem utilizados, além de não serem tão mais modernos do que aqueles que o clube já tem.

A reportagem do ge apurou, porém, que conversas com algumas destas empresas continuam em andamento.

Por fim, a presença constante de Gerseli Angeli nas negociações e no CT da Barra Funda também pesou para o fim da relação do médico com o clube. A fisiologista fazia pedidos diretamente à diretoria, causando desconforto em algumas áreas.

Em contato com a reportagem, Turíbio rebateu as acusações sobre a presença constante de Gerseli no CT e ainda afirmou que ela participou das conversas com a BTL e não fez nenhum pedido extra à diretoria, assim como outros membros do conselho de notáveis.

Turibio Barros e Gerseli Angeli — Foto: Acervo pessoal

Turibio Barros e Gerseli Angeli — Foto: Acervo pessoal

Roupas de eletroestimulação

Três unidades da roupa de eletroestimulação da I-Motion foram deixadas no clube para testes. O custo de cada uma era de R$ 60 mil, que poderiam ser pagos em troca da exposição da marca em ações do clube.

Meses depois, porém, elas foram devolvidas ainda na embalagem e não houve qualquer justificativa para o declínio do negócio. O São Paulo alega que elas não têm “maior comprovação científica de eficácia”.

Recentemente, ge entrevistou Javier Atalaya, treinador pessoal do francês Karim Benzema e que utiliza o equipamento no jogador.

– É um jaleco de 18 eletrodos, que atua sobre nove zonas musculares. O eletrodo dá um impulso nas fibras mais profundas, o que permite trabalhar o músculo com mais intensidade. Uma sessão assim equivalente a quatro horas na academia. Também faço massagens para evitar rupturas e estiramentos. Benzema é como se fosse um jovem de 25 anos – afirmou Javier Atalaya.

Segundo Turíbio Leite de Barros, ele propôs dar palestras à empresa em troca dos aparelhos. Inclusive afirma que fez uma palestra em um simpósio para viabilizar o negócio.

– Uma das condições que acertamos era para ceder sem custo nenhum, mas eles (clube) inventaram que o São Paulo ia pagar R$ 60 mil. Eu dei uma palestra em um congresso de eletroestimulação. Fiz uma palestra de graça para eles entregarem a roupa lá – afirmou o médico ao ge.

Benzema com roupa de eletroestimulação — Foto: Reprodução Instagram

Benzema com roupa de eletroestimulação — Foto: Reprodução Instagram

Câmara hiperbárica

Representantes da empresa OXY, responsável pela câmara hiperbárica, foram ao CT da Barra Funda durante as conversas, a convite de Turíbio Leite de Barros, para ver o espaço em que ela seria colocada. Ficou definido que a área da piscina receberia o equipamento. Ninguém do São Paulo, além do médico, participou de qualquer negociação.

Após a visita da empresa, Turíbio sugeriu ao clube, de acordo com o próprio, a realização de vídeos em que ele divulgaria o produto, além de ações de marketing para adquirir a câmara com um custo mais baixo.

O Tricolor, porém, não quis adquirir a câmara sob a alegação de falta de comprovação científica, mesmo com diversos clubes ao redor do mundo utilizando o produto. Em 2020, o Corinthians adquiriu uma máquina idêntica para o CT Joaquim Grava. O Flamengo comprou duas no ano passado (veja foto abaixo). Palmeiras e Atlético-MG pretendem comprar em breve. Cada câmara está avaliada em R$ 494 mil.

A OXY afirma que não teve contato com ninguém do clube além de Turíbio e houve apenas essa visita ao CT, sem a presença de diretores.

Câmara hiperbárica no Flamengo — Foto: Alexandre Vidal / Flamengo

Câmara hiperbárica no Flamengo — Foto: Alexandre Vidal / Flamengo

Equipamentos fisioterápicos

Os equipamentos fisioterápicos dos mais diversos tipos da BTL foram entregues, instalados e testados no CT da Barra Funda. Mas a negociação melou depois de uma falha de comunicação entre o clube e o DEM.

Turíbio havia prometido que os aparelhos chegariam de graça, sendo que o São Paulo teria que ceder alguns patrimônios, como entradas em camarotes para clientes da BTL, espaços em ações de marketing, dentre outras coisas.

A empresa, porém, propôs um comodato: o São Paulo utilizaria os equipamentos por um período (6 meses a um ano) e só depois começaria a pagar por eles. O custo estimado era de R$ 1 milhão. Essa incoerência fez o Tricolor declinar e devolver todos os aparelhos que tinham sido entregues no CT.

A falta de comprovação científica também foi citada como justificativa para explicar o término das negociações.

A BTL, em contato com a reportagem, afirmou que todos os “equipamentos são de tecnologia europeia, alguns possuem FDA, todos possuem seus registros regulamentados e de forma legalizada no Inmetro e na Anvisa”.

Aparelhos de academia

São Paulo analisou que os aparelhos da Casa do Fitness não iriam modernizar ainda mais a academia do clube. A reportagem do ge, porém, apurou que as negociações continuam em andamento.

E o que o São Paulo modernizou, então?

Com o encerramento das negociações iniciadas com Turíbio, o São Paulo buscou outras empresas no mercado e, até o momento, adquiriu aparelhos de Terapia Combinada, botas pneumáticas e um Tecar (aparelho de radiofrequência).

O clube ainda está em fase final de negociação para adquirir um aparelho de ondas de choque radial, por R$ 85 mil. O pedido anterior, feito por Turíbio, era de um aparelho de ondas de Choque Focal, por um custo de R$ 250 mil.

A modernização do CT da Barra Funda é uma das principais metas que a atual gestão tem em pauta. O acúmulo de lesões, principalmente no ano passado, ligou um sinal de alerta no clube para a reforma do local.

Neste ano, o técnico Rogério Ceni já citou em algumas ocasiões a necessidade de mudança para conseguir um trabalho mais qualificado no dia a dia. Recentemente, ele elogiou a aquisição de um equipamento de ultrassom para prevenção de lesões e a contratação de um profissional para a área.

– Diego Costa não é lesão muscular. Contratamos um cara de ultrassom, o Alexandre, que é um cara que faz ultrassom para vários clubes. Melhor cara que já conheci na minha carreira de ultrassom. Ele verificou um edema, que quer dizer cansaço, não lesão. Pode ser que quinta-feira o Diego esteja em campo – afirmou o treinador.

Na última segunda-feira, a equipe enfrentou o Palmeiras, pelo Campeonato Brasileiro, com a ausência de oito jogadores por problemas médicos. Destes, apenas Andrés Colorado foi desfalque por lesão muscular.

O clube afirma que continua na busca de melhorias dentro da realidade orçamentária que se apresenta neste momento. O São Paulo tem uma dívida de quase R$ 700 milhões, segundo o último balanço financeiro divulgado.

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