O 7 a 1 sofrido pelo Brasil diante da Alemanha, na Copa de 2014, em plena terra brasilis, foi encarado pelos veículos de comunicação como fruto da ausência de um planejamento, aproveitamento correto das categorias de base e opção por um futebol balizado na força de marcação do meio campo e prevalência defensiva. Era um grito de liberdade pelo novo, pelo diferente e por uma luz no fim do túnel que levasse a resgatar o nível que consagrou o selecionado pentacampeão. Em 2017 surge o treinador Rogério Ceni fazendo diferente, sendo trucidado pela quantidade de gols sofridos. Não sabemos o que queremos.
É rudimentar imaginar que 25 anos de futebol, defendendo a camisa do São Paulo, e dois anos intensos de estudos teóricos do esporte em centros extremamente especializados, não tenham feito com que o novo treinador tivesse uma ideia e um plano de execução. Rogério Ceni tem um modelo pré-definido, que está sendo executado na prática. O técnico não está fazendo pouco, está resgatando o futebol sãopaulino esquecido no início da década de 90. O São Paulo de Telê Santana, que tive o prazer de acompanhar, o São Paulo de Cilinho, dos anos 80, e até o da década de 70 (vice-campeão da Libertadores), comandado pelo meia Pedro Rocha, era de futebol ofensivo: como este praticado em 2017.
As críticas feitas ao trabalho de Ceni nos veículos de comunicação são sobre a quantidade de gols sofridos. Imaginam os repórteres e comentaristas, que antes pediam o novo, que pediram mudanças no futebol brasileiro, que há “falta de equilíbrio” no Tricolor. Mas o equilíbrio e a competitividade são unicamente medidos pelo vencedor. Não importa se você vai ganhar um jogo de 10×5 ou de 8×4, se você alcança os seus objetivos e conquista títulos: o seu modelo de futebol funcionou e será imposto aos demais. Nessa seara, imaginamos também que Rogério Ceni continuará sofrendo críticas até que prove ser campeão.
Por que continuará?
O que a imprensa não conseguiu captar ainda do plano de Rogério Ceni é justamente que ele quer o desequilíbrio. O treinador não tem nenhuma intenção de ter um time de pegada, destruidor ou povoar o meio campo. É proposital o encaixe de João Schmidt como primeiro homem de meio campo. Ceni quer qualidade na armação de jogadas, ainda que o jovem tenha reduzido poder de marcação. Igualmente, Cícero é um armador, jogando como volante, e tudo isso foi pensado pelo técnico durante a confecção do time.
Quem seria o homem de meio campo com maior poder de combate? Com certeza Thiago Mendes. O que o treinador fez? Colocou o jogador como um ponta direita, praticamente. Quer aproveitar a velocidade do atleta e infiltrações de surpresa na zaga do adversário. Com Mendes avançado, Cícero e Schmidt como armadores, Cueva de atacante, é óbvio que o sistema defensivo será sacrificado. De propósito! É isso que os comunicadores ainda não conseguiram entender.
A magia do time de Rogério Ceni é justamente medida pelo brilhantismo de Schmidt e Cícero na armação de jogadas e pela liberdade dada a Thiago Mendes. O objetivo é quebrar qualquer defesa, aproveitando-se ainda da qualidade dos homens de frente. Nesse sistema coletivo, o jogador mais limitado possível irá crescer. É muito fácil entrar numa equipe ajeitada e, a partir disso, com mentalidade vencedora. Se você colocar dois brucutus na equipe para parar de sofrer gols vai acabar com a magia do time!
Rodrigo Caio e Maicon não deixaram de ser dois dos melhores zagueiros do Brasil. Maicon não é um jogador lento, uma das besteiras que cheguei a ouvir durante a semana. Pelo contrário, é um atleta bem tranquilo e que passa segurança à defesa. Breno também é jogador de extrema qualidade, que, no momento, carece de maior tempo de bola. Ainda que sejam brilhantes, vão sofrer com o sistema adotado pelo técnico. Serão cada vez mais provados e obrigados a deixar o time tomar só dois gols, e esperar pelo ataque subir cada vez mais sua média.
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Alexandre Velame é Jornalista e Advogado, são-paulino há quase três décadas e usuário da SPNet desde 1997. Escreve nesse espaço aos domingos.
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