Nem começou e já acabou. Quando se fala em futebol brasileiro não há planejamento e convicção no momento de escolher um treinador para dirigir um clube. Após perder uma simples semifinal de Taça Guanabara, torcedores flamenguistas enfurecidos pediam a saída de Abel Braga. Um escândalo! Como se o primeiro turno do Campeonato Carioca fosse parâmetro para alguma coisa. No São Paulo, os 10 anos sem título fulminaram a terceira passagem de André Jardine pelo time profissional no segundo mês de 2019, após a queda na pré-Libertadores. Agora, no Tricolor, são 30 treinadores em 10 anos.
A esperança de um futebol melhor residia na contratação do ídolo Raí para diretor de futebol, inicialmente. Entretanto, não há linearidade nas escolhas de treinador. Os trabalhos são completamente diversos. Diego Aguirre prefere um estilo de pressão, baseado em contra-ataque e defesa; André Jardine prefere posse de bola, dois toques e marcação alta; Cuca (novo treinador do São Paulo) estimula o futebol total, com cruzamentos e pressão ao adversário. Perceba que um treinador é completamente diferente do outro. A gestão de futebol tricolor está definitivamente perdida.
A pressão vem de todos os lados. Após a eliminação, os torcedores dispararam gritos de ordem em relação à direção de futebol e à presidência. Na época da informação instantânea e da manchete furiosa de Facebook, os profissionais da comunicação embarcam na onda e criticam treinadores com dois meses de trabalho em um ano cheio. A paciência destes tempos é zero, e a probabilidade de fazer um time vencedor é quase nula. Para o São Paulo isso pesa mais, pois a fila já é similar a de 1995-2005 (em que pese no período ter-se conquistado um Paulistão e um Rio-SP, ante a Sulamericana do atual lapso). A culpa da diretoria nesse processo será tratada a partir de agora.
Os desmandos do São Paulo
A crise administrativa do São Paulo começa a partir do terceiro mandato de Juvenal Juvêncio, o chamado “golpe no estatuto”, que lhe conduziu a um terceiro e quarto mandatos. Nesta terceira gestão, de abril de 2008 a abril de 2011 foi mais reconhecido por suas ironias e pelo folclore do que o cuidado com o futebol do clube, que teve anteriormente.
Durante o mandato de Juvenal o auge da crise ocorre em 2013, quando o clube ocupa a parte de baixo da tabela do Campeonato Brasileiro e o treinador Muricy Ramalho é chamado para evitar o pior. Perceba que o Tricolor recorreu ao ídolo como bombeiro. Nas eleições de 2014, um presidente do passado é chamado para retomar assento.
Carlos Miguel Aidar, defasado sobre o futebol da atualidade, é apontado em diversos indícios. Desde supostas comissões de jogadores a uma namorada até propostas indecentes ao ex-diretor de futebol Ataíde Gil Guerreiro, o que lhe rendera um soco na cara. Aquela gestão provou que um clube não se faz só com contratações milionárias (Luis Fabiano, Ganso, Pato, Kardec, Michel Bastos e Kaká), mas há necessidade de uma gestão de futebol qualificada e instrumentos do futuro, como o uso adequado do marketing e merchandising. Ficava o Tricolor muito pra trás.
Antes do falecimento, porém, Juvenal Juvêncio (traído) tentou apaziguar o momento conflituoso vivido pelo São Paulo. Indicou o velho (e também traído) parceiro, Carlos Augusto de Barros e Silva, o Leco. Num primeiro momento e esse ponto é preciso destacar, houve um árduo trabalho de equilíbrio financeiro do clube. Este trabalho, porém, deverá ser seriamente prejudicado com as pataquadas do futebol de 2019 e práticas arcaicas, que permanecem no São Paulo.
Durante o início da transmissão de São Paulo x Talleres, no Morumbi, o técnico Muricy Ramalho explicava como é complicado treinar uma equipe da grandeza do São Paulo. Disse, com todas as letras, como é complicado dizer não a dirigentes que pediam a integração de determinados jogadores. O que é isso? Que jogadores são esses? Quem é que atrapalha a formação do elenco do clube e prejudica o futebol? Isso é motivo suficiente para abertura de uma auditoria interna, é uma denúncia gravíssima.
Recentemente se houve notícia de que há uma boa quantidade de atletas gerenciadas pelo ex-jogador do São Paulo, Fábio Mello. Seriam eles: Edmar, Felipe Araruna, William Farías e Wágner Mancini. A informação do ex-treinador Muricy Ramalho abre precedente para o torcedor achar que realmente há uma influência deste ou daquele empresário no clube, como dizem já ter havido de Guilherme Bortolucci no passado. A formação de um elenco jamais poderia ser prejudicada por tais interesses escusos.
O que leva o São Paulo, por exemplo, contratar quatro centroavantes ao mesmo tempo? Tréllez, Gonzalo Carneiro, Diego Souza e Pablo? Se o primeiro não era bom, por que veio? Com todo respeito ao jogador uruguaio, está claro também que não tem condições de vestir a camisa do São Paulo. Pablo, por sua vez, ainda tenta justificar um investimento de 6 milhões de euros. Ao meu ver, completamente insano. E a pergunta que não quer calar: o menino Brenner (fenômeno da base com números maiores que Gabriel Jesus) é centroavante ou ponta direita? Por que não recebe chances?
Cada vez me parece mais adequada uma entrevista realizada pelo gestor de futebol Leonardo Araújo. Ele falava sobre a impossibilidade de se trabalhar no Brasil neste esporte, pelo calendário e pela ausência de olhar dos dirigentes da CBF em relação à divulgação internacional do mesmo, citando o nome pífio “Brasileirão”, que para um estrangeiro seria um brasileiro grande. É muito mais que isso. Deve ter sido mais uma vez elegante, ao não falar de pataquadas como comissões de jogadores, propinas, etc.
Outra esperança específica do São Paulo era o novo Estatuto Social. Atribuiu remunerações a executivos, houve uma tentativa de modernizar e profissionalizar a gestão. Alguns foram contra o pagamento de salários a esses gestores, mas essa movimentação é necessária. Por que? Primeiro que nenhum profissional trabalha de graça, e é inadequado que o clube seja tocado somente por torcedores… Segundo é que, em tese, não haveria mais espaço para realizar práticas de corrupção como comissões de jogadores e propinas. Se isso ainda ocorre no clube, mesmo após essa mudança, é totalmente inaceitável, e isso deveria ser alvo de uma auditoria.
Posto isto, atribuo a contratação equivocada de treinadores com estilos diferentes e formação inadequada do elenco ao diretor executivo de futebol Raí. Especialmente porque, em seu departamento, foi dito que se daria continuidade a André Jardine. Foi dito que Vágner Mancini, em hipótese alguma, assumiria o futebol. E foram ditas várias outras inverdades. Isso, em nenhum momento, tem a ver com a ridícula manifestação de torcedores, com a frase “Raí pede pra sair”. Raí é o principal ídolo da história do São Paulo. Pelo menos um Mundial e duas Libertadores desta camisa devem-se a ele. Nações mais avançadas culturalmente jamais se dirigiriam assim a um ídolo. Teve erros, mas também acertos no departamento de futebol. Como, por exemplo, recolocar o time na Copa Libertadores e montar um elenco num momento de dificuldade financeira, como em 2018.
Muito mais grave que isso, a ausência de transparência nas práticas do clube, resultando em notícias negativas nos meios de comunicação, como no caso do “AeroLeco”; entrevistas que indicam má gestão de recursos com compra indevidas de jogadores e ausência de auditoria para apurar recebimento de comissões e/ou propinas, implicam em responsabilidade do atual presidente Leco e de gestores anteriores nesses 10 anos de crise, como Carlos Miguel Aidar e o saudoso Juvenal Juvêncio. São esses os responsáveis pela ausência de títulos do clube, e ninguém mais.
A culpa de Jardine e o auge da coletiva
O momento de glória da coletiva do presidente Leco, pós eliminação contra o modesto Talleres, da província de Córdoba, foi admitir que esse momento é especial e deve ser visto como a maior tragédia da história do clube. De fato para um gigante sulamericano como o São Paulo, ser eliminado numa fase embrionária é uma tragédia. Ser eliminado, sequencialmente por equipes medianas (pra não dizer pequenas) da Argentina, como Talleres e Defensa y Justicia, mais ainda.
Algumas responsabilidades, porém, devem ser atribuídas ao treinador André Jardine. É um técnico competente, mas que estava em seu primeiro trabalho e não tem experiência no futebol profissional. Ainda assim o diretor de futebol Raí, corajosamente e acertadamente, apostou tudo em seu trabalho. Qual foi a resposta dada pelo técnico? Escolheu jogadores experientes, em detrimento de quem desempenha um futebol mais competente.
É claro que a máquina de triturar treinadores (mídias sociais e profissionais de comunicação) lhe exigia ancorar nos medalhões para evitar goleadas. Não poderia ter feito isso, precisava desempenhar o futebol alegre e coletivo que gosta desde o primeiro jogo. É notoria, por exemplo, a falta de desempenho de jogadores como Éverton e Pablo. Havia necessidade de dar titularidade a Helinho (na esquerda) e Antony (na direita) para deixar o time mais leve. Ainda que Nenê tivesse que perder o seu posto na equipe.
A coragem que Jardine teve para ganhar a Copa Libertadores Sub-20, Campeonato Brasileiro Sub-20, Copa do Brasil Sub-20, Copa RS, entre outros, etc. Não teve dessa vez no time profissional, isto é, teve o chamado “medo de ser feliz” e “jogou contra si mesmo”. Perdeu uma chance de ouro, mas pode tentar reconquistar o seu espaço permanecendo no clube.
Apontadas as responsabilidades, o que a torcida são-paulina deve suplicar é por mais austeridade, publicidade, qualidade na formação do elenco e estabilidade para que o técnico Cuca possa desempenhar suas funções, independente dos resultados, já que essa foi a trigésima aposta durante esses dez anos.
Confira a lista de treinadores do clube (desde 2009, pós Muricy Ramalho):
2009 – Milton Cruz – 1
2009/10 – Ricardo Gomes – 2
2010 – Milton Cruz (uma partida) – 3
2010 – Sérgio Baresi (14 partidas) – 4
2010/11 – Paulo César Carpeggiani – 5
2011 – Milton Cruz (duas partidas) – 6
2011 – Adilson Batista – 7
2011 – Milton Cruz (duas partidas) – 8
2011/12 – Émerson Leão – 9
2012 – Milton Cruz (duas partidas) – 10
2012/13 – Ney Franco – 11
2013 – Milton Cruz (duas partidas) – 12
2013 – Paulo Autuori – 13
2013/15 – Muricy Ramalho (foi substituído por Milton Cruz em 5 partidas após sofrer arritmia cardíaca e no torneio Super Séries) – 14
2015 – Milton Cruz (12 partidas) – 15
2015 – Juan Carlos Osório – 16
2015 – Doriva – 17
2015 – Milton Cruz (quatro partidas) – 18
2016 – Edgardo Bauza – 19
2016 – André Jardine – 20
2016 – Ricardo Gomes – 21
2016 – Pintado – 22
2017 – Rogério Ceni – 23
2017 – Pintado – 24
2017/18 – Dorival Júnior – 25
2018 – André Jardine – 26
2018 – Diego Aguirre – 27
2018/19 – André Jardine – 28
2019 – Vágner Mancini – 29
2019 – Cuca – 30
Contato:
@RealVelame (on Twitter) ou [email protected] (Endereço Eletrônico)
Alexandre Velame é Jornalista e Advogado, são-paulino desde que acompanha futebol, em 1991, e usuário da SPNet desde 1997. Escreve nesse espaço aos domingos.
ATENÇÃO: O conteúdo dessa coluna é de total responsabilidade de seu autor, sendo que as opiniões expressadas não representam necessariamente a posição dos proprietários da SPNet ou de sua equipe de colaboradores.
Não estou criticando sua coluna não, concordo com o que está escrito, principalmente a respeito dos treinadores.
Apenas não acho que aquela época se assemelha com essa
Realmente o time de 2000 era pior.
Goleiros
Rogério e Roger
Defensores
Pimentel, Jean, Juan, Edmilson, Gustavo Neri, Fábio Aurélio, Beleti, Alvaro.
Meias
Ricardinho, Carlos Miguel, Souza, Raí, Júlio Batista, Marcelinho Paraíba, Alexandra, Fábio Simplício, Axel, Wágner, Maldonado
Atacantes
Edu, França, Evair, Sandro Hiroshi, Marcelo Ramos.
Realmente o time era pior do que o de hoje, principalmente os dois goleiros, o meia Raí e o atacante França
Esses são os que eu lembro
98, 2000, 2002 e 2004 foram bons. Pega o de 95 a 97 por exemplo… épocas gloriosas do Paulo Amaral e Bastos Neto… daí você vai chorar. Nessa época de agora… o de 2014 era um esquadrão por exemplo.. o de 2016 era bom, isso não basta.
95, 96 e 97 são três anos de elencos pífios, mas são apenas 3 anos, agora o tempo é bem maior.
Estamos na pior crise da história, VC com certeza tem essa consciência, mesmo nessa época que VC citou não éramos eliminados por times de série C como acontece frequentemente.
Perdiamos sim dos rivais mais bem estruturados
O tal “supercampeonato” Paulista de 2002 foi um torneio de quatro equipes… quem decidiu pra gente foi o Adriano que veio do América de São José do Rio Preto. O jejum daquele período era semelhante, quem viveu e lembra desde 1995 sabe. Com a diferença que os times do São Paulo eram piores.
Vice só serve pra ganhar dinheiro sem fazer nada em órgão público.
Estou falando que nessa época citada o São Paulo foi campeão paulista, hoje em dia não ganha nem par ou ímpar.
Em nenhum momento disse que foram grandes conquistas, mas é pior não ganhar nada como hoje em dia
O São Paulo foi campeão paulista 98 e 2000, e super campeão paulista 2002, vice em 97 e em 2003
Nessa época havia alternância do título com as galinhas, sendo assim não procede a comparação com o jejum atual onde nem ao menos chegamos na final.
Ah é, teve o grande Paulistão de 2000 também né. Super título?
Se for contar vice, o São Paulo foi vice-campeão brasileiro de 2014, e terceiro colocado da Libertadores de 2016.
Vice-campeão da Sulamericana de 2014.